Correio Braziliense, n. 21373, 21/09/2021. Política, p. 2

Sequencia de constrangimentos



O fato de Jair Bolsonaro não ter se vacinado contra a covid-19 tem lhe causado constrangimentos. Se o episódio da pizza na calçada pode lhe render a imagem, junto ao eleitorado, do homem simples e despreocupado com a liturgia do poder, do encontro de ontem com o premier britânico Boris Johnson emergiu a imagem do presidente negacionista, que briga com a vacina e ainda defende medicamentos sem eficácia contra o novo coronavírus. Isso porque depois que ter lhe contado que tomou as duas aplicações do imunizante de Oxford contra a covid-19, o primeiro-ministro cobrou do presidente a vacinação — que constrangidamente afirmou não ter tomado as doses.

O constrangimento aumentou quando Johnson recomendou o fármaco desenvolvido pela AstraZeneca e pela Universidade de Oxford, que é produzida também no Brasil em parceria com a Fundação Oswaldo Cruz. "É uma ótima vacina. Obrigado, pessoal. Tomem vacinas da AstraZeneca! Já tomei duas vezes", disse o premier, fazendo propaganda do imunizante desenvolvido na Inglaterra. Em seguida, aponta para Bolsonaro e pergunta se ele tinha tomado também — o brasileiro responde que "ainda não".

Na sequência do encontro com o primeiro-minsitro, outro episódio que pegou mal para a comitiva brasileira foi na hora do almoço. Bolsonaro escolheu uma churrascaria brasileira em Nova York, mas, como não está vacinado — o que o impede de entrar na área interna dos locais —, foi obrigado a ficar nas mesas de fora. A comitiva não pôde ser vista da rua porque o restaurante ergueu um pano preto para protegê-la dos olhares curiosos dos pedestres.

A imagem da pizza devorada no meio da calçada ao lado dos ministros, sem nem mesmo aproveitar as mesas externas destinadas também àqueles que não se vacinaram, não impediu que ele fosse criticado pelo prefeito da cidade, Bill de Blasio. "Precisamos enviar uma mensagem a todos os líderes mundiais, incluindo, principalmente, o Bolsonaro, do Brasil. Se você pretende vir aqui, você precisa ser vacinado. Se não quiser ser vacinado, não se incomode em vir, porque todos deveriam estar seguros juntos. Isso significa que todos precisam ser vacinados", alfinetou, deixando claro que o presidente brasileiro não é bem-vindo.

A cidade de Nova York instalou um ônibus na porta do prédio das Nações Unidas com agentes que fazem a aplicação de vacina contra covid-19 em diplomatas e jornalistas que participam do evento. "A grande maioria do pessoal das Nações Unidas, a grande maioria dos Estados-membros está fazendo a coisa certa", disse De Blasio.

Não é a primeira vez que o prefeito critica publicamente Bolsonaro. Ele já havia feito isso em 2019, quando o presidente alterou o destino de uma viagem que faria e deixou de ir a Nova York para visitar Dallas, no Texas.