O Globo, n. 31524, 28/11/2019. Mundo, p. 31

Bolívia: investigação externa de violações dos direitos humanos


A Bolívia pode precisar de ajuda externa para investigar o “maciço” número de violações de direitos humanos e episódios de violência após a eleição de 20 de outubro para garantir que o resultado seja aceito num país polarizado. A conclusão é do brasileiro Paulo Abrão, secretário executivo da Comissão Interamericana de Direitos Humanos (CIDH), da Organização dos Estados Americanos (OEA), que fiscaliza o respeito aos direitos humanos no continente.

Após visita de três dias à Bolívia,Abrão recomendou que La Paz trabalhe em conjunto com um grupo internacional de especialistas similar ao que investigou o desaparecimento de 43 estudantes no México.

— Normalmente, nessas situações, instituições nacionais não estão preparadas para resolver um número tão acachapante de violações [dos direitos humanos] — disse Abrão em Cochabamba, berço político do ex-presidente Evo Morales e uma das regiões mais afetadas pela violência.

Abrão contou ainda que, ao conversar com representantes do governo e com civis, recebeu relatos contraditórios sobre quantas pessoas morreram nos confrontos do último mês. As informações atuais dão conta de que seriam ao menos 33 as vítimas fatais. A CIDH deve divulgar relatório com suas conclusões nas próximas semanas.

Em visita à cidade de Sacaba, onde nove pessoas foram mortas a tiros durante os protestos contra o governo da presidente interina Jeanine Áñez, Abrão foi recebido por milhares de pessoas aos gritos de “justiça!’. Ele ouviu relatos de que as forças de segurança usaram armas de fogo para reprimir oq ue os moradores diziam ser um protesto pacífico. O governo de Áñez nega que as forças de segurança sejam responsáveis pelas mortes.

A crise começou após as eleições de 20 de outubro, quando Morales, então há quase 14 anos no poder, foi proclamado vencedor em primeiro turno para um quarto mandato de cinco anos. A oposição, no entanto, alegou que houve fraude e foi para as ruas contra o líder de origem indígena. Pressionado pelos protestos, pelas Forças Armadas e pela polícia, Morales renunciou e se exilou no México, denunciando um golpe de Estado.