O Globo, n. 31524, 28/11/2019. Economia, p. 25

Banco Central limita taxa de juros do cheque especial a 8% ao mês
Renata Vieira



O Conselho Monetário Nacional (CMN) determinou ontem que os juros do cheque especial não poderão ultrapassar 8% ao mês — atualmente, estão em torno de 12% — e estabeleceu novas regras para esse produto financeiro. Com a medida, que passa a valer a partir de 6 de janeiro de 2020, o Banco Central (BC) espera que a taxa do cheque especial caia pela metade, dos atuais 306% ao ano para cerca de 150% ao ano.

O diretor de Organização do Sistema Financeiro e Resolução do BC, João Manoel Pinho de Mello, explicou que a decisão ajudará a tornar o cheque especial, hoje a mais cara modalidade de crédito do país, menos regressiva, isto é, que apresenta maior impacto sobre clientes que ganham até dois salários mínimos e têm um nível mais baixo de educação financeira.

— Nós documentamos volumes altos de limites concedidos aos clientes e não utilizados. E a maior parte desse volume de limite não utilizado é concedido a clientes de alta renda. A consequência é que clientes de baixa renda pagam por esse desenho atual do cheque especial. É um subsídio implícito — afirmou Mello.

MEDIDA VIGORARÁ EM 2020

Segundo o diretor, o volume total de recursos disponibilizados pelo limite do cheque especial no país chega a R$ 350 bilhões. Desse montante, apenas R$ 26 bilhões são efetivamente usados pelos clientes. Os cerca de R$ 325 bilhões parados representam um custo para o sistema financeiro, que o repassa em juros a quem ganha até dois salários mínimo — a parcela que mais recorre ao cheque especial.

A resolução permite que os bancos cobrem tarifa mensal pela disponibilização do cheque especial, com exceção de quem tiver um limite de crédito inferior a R$ 500. Atualmente não há esse custo. Será possível onerar o cliente em até 0,25% do valor que exceder R$ 500.

A tarifa será deduzida dos juros aplicados ao cheque especial no respectivo mês, ou seja, ela será ressarcida ao cliente que usou o limite. Para quem não usou o limite, no entanto, a tarifa não volta.

O BC calcula que 19 milhões de clientes que têm limite de até R$ 500 no cheque especial serão beneficiados pela isenção de tarifa. No total, cerca de 80 milhões de pessoas usam o cheque especial hoje no país.

A nova regra para a tarifa entra em vigor em 6 de janeiro de 2020, somente para novos contratos. No caso daqueles já existentes, os bancos só poderão cobrar tarifas a partir de 1º de junho de 2020 — e deverão comunicar a mudança aos clientes com 30 dias de antecedência.

O BC também determinou que os clientes podem pedir, a qualquer momento, a revisão do limite do cheque especial para baixo. Além disso, os bancos não poderão aumentar o valor sem a anuência do cliente, como ocorre hoje.

MAIOR PORTABILIDADE

Em outra resolução, o BC amplia, a partir de abril de 2020, a chamada portabilidade do crédito — quando um cliente pode transferir uma dívida ou financiamento para outra instituição financeira. A autoridade monetária espera que essa medida aumente a concorrência, o que resultaria em taxas mais vantajosas para os clientes.

Agora será possível que operações de crédito imobiliário contratadas fora do Sistema Financeiro de Habitação (SFH) sejam enquadradas nele no momento da portabilidade, desde que sejam consideradas as atuais regras do SFH, que limita o valor do imóvel a ser financiado. O SFH tem como principal intermediário a Caixa Econômica e abarca programas como o Minha Casa Minha Vida.

Na prática, esse tipo de migração permitirá que o consumidor use os recursos do FGTS para amortizar empréstimos imobiliários. Hoje, isso só é autorizado nos financiamentos de imóveis feitos pelo SFH.

A mudança também permite que uma dívida no cheque especial seja transferida para qualquer outro tipo de linha de crédito, em qualquer instituição diferente daquela onde a dívida se originou. O objetivo é que o consumidor consiga migrar seu débito para uma linha mais barata, sem ficar preso ao banco de origem.

Também via resolução do CMN, as cooperativas de crédito ficarão autorizadas a captar recursos de poupança, direcionando-os ao crédito imobiliário a partir de março de 2020.

Saiba o que vai mudar com a nova medida do CMN

> A taxa de juros não poderá superar 8% ao mês. Atualmente, está em torno de 12% ao mês.

> Os bancos poderão cobrar tarifa de quem quiser ter cheque especial, mas apenas se o limite superar R$500. A tarifa mensal poderá ser de até 0,25% sobre o valor que exceder R$ 500.

> A tarifa será deduzida dos juros que incidirem sobre o cheque especial usado naquele mês. Mas ela será cobrada de quem tiver limite disponível, mesmo que não o utilize.

> A medida entra em vigor em 6 de janeiro de 2020. No caso de contratos já existentes, a tarifa só poderá ser cobrada a partir de 1º de junho.