Correio Braziliense, n. 21364, 12/09/2021. Cidades, p. 15

Pdot propõe espaços mais democratizados

Ana Isabel Mansur


Em discussão desde 2019, a revisão do Plano Diretor de Ordenamento Territorial (Pdot) entra na fase final de formatação a partir de outubro. Entre os principais desafios levantados por especialistas e pelo Governo do Distrito Federal estão sanar o deficit habitacional, descentralizar as oportunidades de emprego e renda e promover a mobilidade urbana sustentável e acessível. O Correio teve acesso, com exclusividade, ao estudo técnico da Secretaria de Desenvolvimento Urbano e Habitação (Seduh) que traz o diagnóstico inicial com as demandas territoriais do DF.

De acordo com o documento, dispersar a atividade econômica para além do eixo Plano Piloto é um dos caminhos possíveis para garantir mais pessoas no mercado de trabalho e diminuir a pressão por moradia na região. Com a geração de novas áreas de trabalho, a procura por habitação acompanhará os novos núcleos. Conhecer esse cenário permite orientar a política habitacional do DF, cujo deficit é composto por quatro componentes: precariedade, adensamento, ônus e coabitação (veja quadro).

"A criação de áreas de emprego e renda e de novos espaços de trabalho precisa ser um dos focos do Pdot. Com isso, há possibilidade de abrir novos locais de habitação. Não se pode criar áreas de emprego e renda longe de onde as pessoas moram. Muitas pessoas acabam optando por morar em um lugar não tão bom e com aluguel mais caro, mas central e próximo a serviços e oportunidades", reflete a secretária executiva de Planejamento e Preservação da Seduh, Giselle Moll.

O professor de urbanismo da Universidade de Brasília (UnB) Benny Schvarsberg destaca que, apesar da descentralização ter sido proposta na última revisão do Pdot, em 2009, o projeto ficou no papel. "O plano vigente propôs um conjunto de novas centralidades, mas não foram implementados, porque não houve políticas que priorizassem a implantação dessa estratégia. O DF é extremamente desigual e com segregação socioespacial, basta ver a distribuição de renda e de emprego nas áreas centrais, além de melhores comércios e serviços", aponta o doutor em sociologia urbana.

Edilza Fernandes, 41 anos, mora em Santa Maria e se desloca diariamente para o Plano Piloto, onde trabalha como técnica em secretariado, na Esplanada dos Ministérios. Ela gasta, em média, 2h40 no trajeto feito de transporte coletivo. "Pego o circular todos os dias em direção ao BRT, depois o ônibus BRT—linha expresso Rodoviária —, onde pego circular 108 para Esplanada dos Ministérios", descreve.

Oferta habitacional

O urbanista Benny Schvarsberg também defende melhorias na oferta habitacional como forma de diminuir a especulação imobiliária. "É preciso haver política de oferta de áreas para habitação, mas não segregadas entre pobres e ricos e sim com bairros onde haja lugar para todas as faixas de renda, com combinação de usos que possam garantir direito ao centro da cidade. É preciso democratizar o centro de Brasília e desconcentrar as qualidades e os serviços de infraestrutura", sugere o pesquisador.

Para o professor da pós-graduação em transportes da UnB Paulo César Marques da Silva, não é possível pensar o ordenamento territorial sem considerar o planejamento locomotivo da população. "São questões interligadas. A mobilidade urbana não pode ser planejada depois ,para atender certa demanda urbanística, nem as questões urbanas podem ser feitas posteriormente. Precisam andar juntas. O sistema de transportes demanda e induz à ocupação de territórios. É um risco pensar no planejamento da mobilidade depois da tomada de espaços", analisa o especialista.

"Há uma grande preocupação dos gestores com a integração dos meios de transporte, mas, no nível da tomada de decisões, nem sempre ela é colocada em prática. O Pdot deveria caminhar junto com a revisão do Plano Diretor de Transporte Urbano e Mobilidade (PDTU)", destaca. A última revisão do PDTU foi feita em 2011.

A secretária Giselle Moll confirma que o cenário ideal seria o da integração das políticas de habitação e de mobilidade. "Para que as áreas de desenvolvimento econômico gerem emprego e renda; é necessário que os locais residenciais fiquem próximos aos eixos de transporte coletivo", afirma. Ela explica que a revisão vai balizar as políticas públicas para os próximos dez anos. "Precisamos ter políticas que continuem refletindo as necessidades da população, por isso a participação popular é tão importante, para que possamos criar diretrizes de acordo com as necessidades das pessoas", convida a secretária.
Adensamento

Embora defenda a descentralização do Plano Piloto, o professor Benny Schvarsberg esclarece que não se trata de criar núcleos de adensamento populacional, mas o desenvolvimento das áreas já existentes. Ele defende que Brasília é suficientemente esparramada e que não há necessidade de mais crescimento urbano horizontal. "Precisamos preservar córregos, mananciais e fundos de vale para uma capacidade hídrica maior. O novo Pdot deve encarar um adensamento responsável e sustentável. As áreas centrais do DF precisam ser melhor adensadas, com arquitetura de qualidade, incluindo paisagismo e sustentabilidade", defende o urbanista.

Por meio da realização de sete oficinas temáticas, com a participação da população em modelo híbrido devido à pandemia da covid-19, a Seduh vai concluir a etapa de diagnóstico do plano. A fase antecede a formatação do Pdot em si, por meio de propostas, e será intercalada por debates e audiências públicas com gestores governamentais, legisladores, sociedade civil e pesquisadores.

» Participe

Oficinas temáticas de discussão do Pdot

» 2 de outubro (manhã):

Gama, Santa Maria, Recanto das Emas e Riacho Fundo 2

» 9 de outubro (manhã):

Taguatinga, Brazlândia, Ceilândia, Samambaia e Sol Nascente/

Pôr do Sol

» 9 de outubro (tarde):

Núcleo Bandeirante, Guará, Riacho Fundo 1, Águas Claras, SCIA/

Estrutural, SIA, Vicente Pires e Arniqueira

» 16 de outubro (manhã):

Paranoá, São Sebastião, Jardim Botânico e Itapoã

» 16 de outubro (tarde):

Planaltina, Sobradinho, Sobradinho 2 e Fercal

» 23 de outubro (manhã):

Lago Sul, Lago Norte, Varjão, Park Way e Plano Piloto

» 23 de outubro (tarde):

Plano Piloto, Cruzeiro, Candangolândia e Sudoeste/Octogonal

Participação presencial (limitada) e remota. Acesse: https://www.pdot.seduh.df.gov.br/ 

» Pdot

» O plano diretor tem como objetivo orientar o desenvolvimento territorial do DF para a próxima década, considerando a totalidade do território e de cada região administrativa. O Pdot vigente foi aprovado em 2009 e sofreu pequenas revisões jurídicas em 2012. De acordo com a legislação do DF, o plano precisa ser revisado a cada 10 anos. A revisão atual começou a ser debatida publicamente em abril de 2019.

Viagens por transportes no DF

Automóvel: 50%

Ônibus, van, micro-ônibus, vizinhança: 40%

Transporte escolar: 4%

Moto: 2%

Metrô: 2%

Transporte fretado: 2%

Fonte: Plano Diretor de Transporte Urbano e Mobilidade, 2011