O Estado de S. Paulo, n. 46890, 05/03/2022. Política, p. A8

Justiça intima Telegram a explicar estratégia de combate à desinformação

Rayssa Motta


 

A Justiça Federal em São Paulo decidiu intimar o Telegram a explicar sua política de combate à desinformação no Brasil depois que a plataforma ignorou questionamentos feitos pelo Ministério Público Federal. Desde dezembro do ano passado, o MPF tenta notificar o aplicativo em busca de informações. O órgão mobilizou, inclusive, o setor de cooperação internacional. Como não houve resposta, a plataforma foi acionada judicialmente.

Os dados são cobrados em uma investigação sobre a conduta das principais plataformas de redes sociais e aplicativos de mensagens para conter o compartilhamento de conteúdos falsos e radicais. Só o Telegram não respondeu.

A intimação autorizada pela Justiça pode ser usada como prova de que os responsáveis pelo aplicativo tomaram conhecimento do pedido, o que, na prática, significa que não poderão se eximir nas etapas seguintes do inquérito.

Em seu pedido, o Ministério Público indica que se trata de uma “tentativa de obtenção de provas documentais”. A decisão de intimar a plataforma foi tomada pelo juiz Victorio Giuzio Neto, da 24.ª Vara Cível Federal de São Paulo, que autorizou o envio de notificações à sede do Telegram em Dubai, nos Emirados Árabes, e a um escritório em Londres, Inglaterra.

“O fato de o destinatário Telegram FZ LLC não possuir representação estabelecida no Brasil, a despeito de oferecer seus serviços ao público brasileiro, demanda esta utilização da cooperação judicial internacional para formalização da notificação, sob pena de infração à jurisdição e à soberania do Estado em que sediado o destinatário”, diz a decisão judicial.

Pressão. O Ministério Público Federal não é o único órgão brasileiro ignorado pelo Telegram. O aplicativo de origem russa também não assinou o acordo de cooperação proposto pelo Tribunal Superior Eleitoral (TSE) para minimizar a circulação de fake news nas eleições deste ano. Por causa da postura da empresa, o então presidente do TSE, ministro Luís Roberto Barroso, chegou a discutir a possibilidade de suspensão do funcionamento do aplicativo no Brasil.

A mesma ameaça foi feita em fevereiro pelo ministro Alexandre de Moraes, do Supremo Tribunal federal (STF), relator dos inquéritos que apuram a disseminação de fake news e a atuação das chamadas “milícias digitais”, quando o aplicativo resistiu a excluir o perfil do blogueiro bolsonarista Allan dos Santos. A conta foi suspensa no dia seguinte.

O comportamento da plataforma acende os debates do chamado Projeto de Lei das Fake News, relatado pelo deputado Orlando Silva (PCdoBSP). Um dos pontos previstos no projeto é que as redes sociais tenham representação no Brasil para poder funcionar no País, impedindo, assim, que operem à margem da legislação nacional.

“O fato de o destinatário Telegram FZ LLC não possuir representação estabelecida no Brasil, a despeito de oferecer seus serviços ao público brasileiro, demanda esta utilização da cooperação judicial internacional para formalização da notificação, sob pena de infração à jurisdição e à soberania do Estado em que sediado.”

Trecho da decisão