Correio Braziliense, n. 20647, 03/12/2019. Política, p. 3

Sessão tensa sobre militares
Jorge Vasconcellos


Está prevista para hoje, na Comissão de Relações Exteriores e Defesa Nacional do Senado, a votação do Projeto de Lei (PL) nº 1645/2019, que reestrutura as carreiras e reforma o sistema previdenciário dos militares. Extraordinária, a sessão ocorre em meio a um clima de insatisfação entre os praças—soldados, cabos, sargentos e suboficiais — com o presidente Jair Bolsonaro.  Militares desse grupo dizem que recebem tratamento desigual em relação aos oficiais.

Os praças representam 82% dos 770 mil membros das três Forças Armadas. Vários prometem estar na sessão para pressionar os senadores a corrigir  “distorções” do projeto e, para isso, têm contado com o apoio de parlamentares de partidos de centro, como o PSDB; e de esquerda, como o PT. O relator do projeto no Senado, Arolde de Oliveira (PSD-RJ), que apresentou seu parecer na quarta-feira da semana passada, não alterou o texto que veio da Câmara.

Entre outras mudanças, o PL 1645/2019 cria o Adicional de Compensação de Disponibilidade Militar, ao qual os militares farão jus devido à dedicação exclusiva à carreira. Trata-se de acréscimo sobre o salário que varia entre 5% e 32% de acordo com a patente.

O projeto também reajusta o Adicional de Habilitação, a ser incorporado ao soldo, com percentuais que vão de 12% a 73%, e beneficia militares que mais fizeram cursos de formação. Segundo representantes dos praças, 78% desse adicional vão para os oficiais, com acesso a mais cursos na carreira. Com o projeto, o Ministério da Economia pretende economizar R$ 2,29 bilhões até 2022.

“É como a perda de um pai, alguém que sempre defendemos e que agora vira as costas para nós. É pior do que traição. Bolsonaro levou uma facada no abdome, mas nos deu uma nas costas”, protestou Cibele Lima, relações públicas da Associação Brasileira de Militares Especialistas da Aeronáutica (ABRAMEAR). Ela anunciou que, nas eleições municipais do que vem, praças de todo o país não votarão em candidatos aliados do presidente da República. “Juntando nossos familiares, amigos e ex-militares, nós somos mais de quinze milhões de eleitores”, afirmou Cibele.

No Senado, os praças contam com o apoio do líder do MDB, Eduardo Braga (AM), do líder do PT, Humberto Costa (PE), e do senador Izalci Lucas (PSDB-DF). Quando o projeto foi analisado em comissão especial da Câmara, eles foram apoiados por vários deputados de esquerda, entre eles Marcelo Freixo (PSOL-RJ) e Gláuber Braga (PSOL-RJ).

“Estou na luta por melhores salários para os militares, junto com Bolsonaro, desde 2004. Trabalhei arduamente para elegê-lo presidente, mas não posso me calar diante de tanta injustiça aos graduados em final de carreira. Reservistas e pensionistas estão sendo bitributados no projeto”, disse Ivone Luzardo, presidente da União Nacional das Esposas de Militares das Forças Armadas Brasileiras (UNEMFA), referindo-se à parte do projeto que prevê a contribuição de pensionistas.

O senador Izalci Lucas (PSDB-DF), membro da Comissão de Relações Exteriores e Defesa Nacional do Senado, apresentou emenda para alterar os dispositivos do projeto relativos ao Adicional de Compensação de Disponibilidade Militar e ao Adicional de Habilitação. Ele disse que discutiu o assunto na quinta-feira da semana passada com o presidente Bolsonaro e com o ministro-chefe da Secretaria de Governo, general Luiz Eduardo Ramos. “Estamos em negociação”, disse Izalci, que, ontem, voltou a se reunir com o general Ramos e tem mantido conversas com o secretário especial de Previdência do Ministério da Economia, Rogério Marinho.