O Globo, n. 31715, 06/06/2020, p. 8

'Acho que o governo finalmente terá uma base'

Naira Trindade

 

BRASÍLIA — Líder do governo no Senado, Fernando Bezerra (MDB-PE) defende a aliança do presidente Jair Bolsonaro com partidos do centrão como a única forma de aprovar medidas que retomem a economia do país e afastem qualquer possibilidade de impeachment. Ele prevê que a relação com os outros Poderes vai melhorar.

O senhor trabalhou para aprovar medidas importantes no passado, sem base aliada no Congresso, mas agora o governo se aproxima do centrão para montar uma base. Como o senhor vê esse movimento?

No primeiro ano, a relação do governo com o Congresso teve altos e baixos. O que ajudou muito foi que o perfil médio dos parlamentares eleitos, tanto na Câmara quanto no Senado, tem uma afinidade grande com a agenda de reformas da área da economia. Posso traduzir essa boa vontade com a aprovação da reforma da Previdência. No início desse ano, o que está mudando com o cenário de pandemia é que o presidente da República, ali por volta do fim de março e início abril, quando se consolidou o cenário de recessão econômica severa, começou a fazer gestos de aproximação para finalmente formar uma base política. Por quê? Porque essa base vai ser necessária para a aprovação das medidas que possam estimular a retomada da economia. E o alicerce do governo dele será medido pela velocidade que a economia brasileira possa voltar a crescer. Acho que o governo finalmente terá uma base que estimo ser maior que 260 votos na Câmara e 50 no Senado.

E por que o governo decide mudar o discurso e se aproximar ao centrão?

Para enfrentar a crise. O que vai marcar a chance de reeleição do presidente Bolsonaro é a retomada da economia. Se a economia estiver crescendo e gerando emprego, as chances de reeleição do presidente são muito amplas. Neste momento, em que o presidente está enfrentando uma crise na saúde, em função da pandemia, na economia, em relação aos empregos, e está enfrentando também essas questões políticas de relações com o STF e com o Congresso, o que julgo ser o momento mais crítico, o governo tem um forte apoio popular, com quase um terço. A leitura disso é que qualquer tipo de iniciativa de impedimento do presidente estará completamente afastada, e as atenções voltadas para medidas de retomada da economia que deverão ser anunciadas por Paulo Guedes em 15 dias.

Há um temor do presidente de vir a sofrer impeachment?

Não acho. Na verdade, repito, é uma aproximação no sentido de conseguir o apoio congressual para as medidas que possam gerar a retomada da economia. Foi aí que o presidente tomou a decisão (de se aproximar do Centrão) porque ele sabe que será possível o sucesso no governo com a força da retomada da economia no ano que vem. No ano que vem, se a gente tiver, 3%,4%, 5% de crescimento, ele vai estar com a perspectiva de reeleição grande. A sorte do governo dele se define na aprovação de medidas econômicas que serão votadas agora em julho, agosto e setembro. Agora, quando ele consegue formar a base, ele enterra qualquer iniciativa de impeachment. Então, o cenário é ter uma base popular sólida, porque as pessoas estão vendo que as medidas emergenciais que ele tomou estão dando a ele muito apoio popular.

Filho do presidente, Eduardo Bolsonaro fez declarações recentes sobre ruptura que criaram instabilidade para o próprio governo. Como o senhor vê essas situações?

Essas declarações não ajudam. Eu prefiro ficar com as declarações do presidente, que tem reiterado seu compromisso com o estado de direito, com a democracia brasileira e com o respeito aos membros do Supremo e do Congresso.

Mas o presidente, ao participar de manifestações que criticam o STF, não acirra os ânimos entre os Poderes?

Esta semana foi muito positiva para o desarmamento dos espíritos, tanto no Supremo, quanto dentro do governo, como no Congresso. Quero destacar o trabalho do presidente do Senado, Davi Alcolumbre, que atuou firmemente para que essas relações possam ser harmoniosas e independentes. E acredito a gente possa estar inaugurando agora um novo momento de distensionamento nas relações com Supremo e com o Congresso e as razões são simples. Primeiro que o presidente continua com forte apoio popular e segundo que o presidente vai ter base política. Então, esse clima estará distensionado nos próximos 15, 30 dias.

Em relação a ataques ao STF, o senhor chegou a defender publicamente a saída do ministro da Educação, Abraham Weintraub, por causa de declarações dele. Há um movimento para a permanência dele?

Eu prefiro não me manifestar sobre esse assunto. O que eu tinha de dizer sobre esse assunto eu já comentei com o presidente e vamos aguardar porque o cargo de ministro seja ele qual for é uma prerrogativa do presidente da República.

Recentemente o presidente também falou sobre recriar o Ministério da Segurança Pública. Essas mudanças devem ocorrer?

Acho que sim. A proposta do Ministério da Segurança Pública foi adotada na época do presidente Michel Temer e funcionou bem. E acho que agora talvez seja o momento de retomar essa ideia, que tem forte aceitação no Congresso. Mas cabe ao presidente fazer as consultas sobre nomes e quem ele decidir, será uma boa escolha.