Correio Braziliense, n. 20654, 10/12/2019. Política, p. 4

Governo quer manter Camargo
Cláudia Dianni


A Advocacia-Geral da União (AGU) confirmou, ontem, que apresentou recurso ao Tribunal Regional Federal da 5ª região (TRF-5) contra a decisão, da semana passada, que suspendeu a nomeação do jornalista Sérgio Camargo para o cargo de presidente da Fundação Cultural Palmares. Ele foi nomeado em 27 de novembro pela Casa Civil.

A nomeação de Camargo foi suspensa, na quarta-feira passada, pelo juiz federal substituto Emanuel José Matias Guerra, da 18ª Vara Federal de Sobral (CE), depois do repúdio, por parte da sociedade, sobretudo lideranças negras, causado por declarações de Camargo, que também é negro, sobre o movimento no Brasil. Entre as falas que acumularam críticas, estava a afirmação de que a escravidão foi “benéfica” para os descendentes de africanos escravizados.

A nomeação de Camargo é parte das mudanças promovidas pelo novo secretário especial da Cultura, Roberto Alvim, a quem o presidente Jair Bolsonaro deu carta branca para promover mudanças na área.

O magistrado que suspendeu a nomeação atendeu pedido, em ação civil pública, contra a União, que questionava os critérios de nomeação de Camargo para o cargo. Na decisão, o juiz afirmou que a nomeação “contraria frontalmente os motivos determinantes para a criação” da Fundação Palmares e põe a instituição “em sério risco”, visto que a gestão pode entrar em  “rota de colisão com os princípios constitucionais da equidade, da valorização do negro e da proteção da cultura afro-brasileira”.

O objetivo da Fundação Cultural Palmares, definido pelo Decreto nº 6.853, de 15 de maio de 2009, é promover a preservação dos valores culturais, sociais e econômicos decorrentes da influência negra na formação da sociedade brasileira. A Fundação, segue o decreto, “deve apoiar e desenvolver políticas de inclusão dos afrodescendentes no processo de desenvolvimento político, social e econômico por intermédio da valorização da dimensão cultural”.

A Fundação Palmares faz parte da Secretaria Especial da Cultura, que assumiu as funções do Ministério da Cultura, extinto quando o presidente Jair Bolsonaro assumiu o posto. Atualmente, a Secretaria de Cultura está subordinada ao Ministério do Turismo.

O juiz da 18ª Vara Federal viu, nas publicações de Camargo em redes sociais, o “condão de ofender justamente o público que deve ser protegido pela Fundação Palmares”. Logo depois de sua nomeação, Camargo fez a seguinte publicação em redes sociais: “Racismo real existe nos Estados Unidos. A negrada daqui reclama porque é imbecil e desinformada pela esquerda”.

Ele também defendeu o fim do Dia da Consciência Negra que, sustenta, “precisa ser abolido nacionalmente por decreto presidencial”, por causar perdas à economia do país em nome de “um falso herói dos negros”, referindo-se a Zumbi dos Palmares, que dá nome à instituição que ia presidir. Para ele, a agenda brasileira com relação à comunidade negra promove o “vitimismo”.