Correio Braziliense, n. 20660, 16/12/2019. Mundo, p. 12

Conferência termina e frustra expectativas


A comunidade internacional alcançou, ontem, em Madri, um acordo mínimo na COP25, mas sem responder firmemente às mudanças climáticas, contrariando reivindicações da ciência e da sociedade civil. Após duas semanas de negociações, a conferência da ONU concordou em pedir aos países que aumentem suas metas para reduzir as emissões de gases de efeito estufa no próximo ano, o que é essencial para tentar conter o aquecimento a menos de +2°C. Entretanto, a busca por um acordo para regular os mercados globais de carbono, uma das questões mais urgentes, ficou para a próxima cúpula, marcada para o ano que vem.

"Parece que a COP25 está desmoronando. A ciência é clara, mas a ciência é ignorada", tuitou a jovem ativista climática Greta Thunberg, estrela da conferência que inspira milhões de jovens a exigirem medidas radicais e imediatas para limitar o aquecimento global. "Aconteça o que acontecer, não vamos desistir. Estamos apenas começando", acrescentou a adolescente sueca.

Os delegados de quase 200 países, reunidos na cúpula, aprovaram também uma ajuda a países pobres que sofrem as consequências das mudanças climáticas. Eles concordaram em designar fundos para compensar essas nações pelos efeitos de eventos climáticos extremos, uma das questões mais prementes para os pequenos estados insulares.

As negociações em Madri foram acompanhadas diversas vezes por protestos de grupos indígenas e ambientalistas. Foi um sinal da crescente frustração com o ritmo lento dos esforços dos governos para conter as mudanças climáticas.

Grupos e ativistas ambientais acusaram os países mais ricos do mundo de mostrarem pouco comprometimento em enfrentar seriamente as mudanças climáticas. "O Acordo de Paris pode ter sido vítima de atropelamento por um punhado de economias poderosas de carbono, mas elas estão do lado errado dessa luta, do lado errado da história", disse a diretora executiva do Greenpeace International, Jennifer Morgan. "Bloqueadores climáticos como o Brasil e a Arábia Saudita, possibilitados por uma liderança chilena irresponsável e fraca, venderam acordos de carbono e passaram por cima de cientistas e sociedade civil", acrescentou.

O Chile presidiu as negociações, embora a cúpula tenha sido transferida para Madri, em razão dos violentos protestos antigoverno no país sul-americano. Apesar de o governo do presidente chileno Sebastián Piñera pressionar por um resultado positivo, os ativistas o criticaram por manter em operação as usinas a carvão até 2040.

Helen Mountford, do World Resources Institute, um grupo de especialistas em meio ambiente, disse que as conversas "refletem como os líderes de países estão desconectados da urgência da ciência e das demandas de seus cidadãos nas ruas". "Eles precisam acordar em 2020", acrescentou.

"Não podemos dizer ao mundo que estamos diminuindo nossas ambições na luta contra as mudanças climáticas", afirmou o vice-presidente da Comissão Europeia, Frans Timmermans.

 

Decepção brasileira

O ministro brasileiro do Meio Ambiente, Ricardo Salles, disse, ontem, que "a COP 25 não deu em nada", em uma referência ao desfecho que não incluiu um acordo para regular os mercados globais de carbono.

 "Países ricos não querem abrir seus mercados de créditos de carbono. Exigem medidas e apontam o dedo para o resto do mundo, sem cerimônia, mas na hora de colocar a mão no bolso, eles não querem", afirmou Salles, em sua conta no Twitter.

 A atuação do Brasil na COP 25 se concentrou em pedir recursos dos países ricos para preservação no Brasil. Mas, nos últimos dias da conferência da ONU, o país também protagonizou um impasse sobre artigos que tratavam da participação dos oceanos e o uso da terra nas mudanças climáticas.

No Brasil, o desmatamento é a principal fonte de emissões de gases causadores do efeito estufa, enquanto, no mundo, é a queima de combustíveis fósseis, como gás e derivados de petróleo.

Por causa da falta de acordo sobre o mercado de carbono, cuja regulamentação ficou adiada para a próxima edição da COP, em 2020, na Escócia, "o Brasil e outros países que poderiam fornecer créditos de carbono em razão de suas boas práticas ambientais saíram perdendo", disse Ricardo Sales, na rede social. Para o ministro brasileiro, prevaleceu, na conferência climática, uma visão protecionista de fechamento de mercado.

 Em entrevista à GloboNews, Salles disse que o objetivo do Brasil é "não desviar o foco" das emissões provocadas pela queima de combustíveis fósseis das maiores economias do mundo.