Correio Braziliense, n. 20663, 19/12/2019. Economia, p. 6

CPMF volta ao discurso, agora com Guedes
Rosana Hessel


A criação de um imposto sobre transações digitais, parecido com a antiga CPMF (Contribuição Provisória sobre Movimentação Financeira) não está descartada pelo governo e seu estudo está pronto, disse o ministro da Economia, Paulo Guedes ontem. Ele evitou comparar o provável novo imposto à CPMF, mas defendeu a modalidade de tributo como forma de compensar a desoneração da folha de pagamentos, uma das principais bandeiras do ministro na proposta de reforma tributária que está sendo elaborada pelo Executivo.

“A CPMF virou um imposto maldito, desde a campanha. O presidente falou: eu não quero esse troço. E todo mundo. Então, acabou-se. Nós (da equipe econômica), por outro lado, sempre examinaremos bases amplas de incidência. O Brasil pega bases estreitas e coloca alíquotas muito altas. Sempre consideramos que, para desonerar a folha de pagamentos só tem um jeito”, afirmou Guedes, ontem, em entrevista a jornalistas, quando fez um balanço do primeiro ano do governo. “Consideramos, desde o início, um tributo sobre transações”, emendou.

De acordo com Guedes, cada vez mais, são feitas transações eletrônicas por meio de celulares, e, nesse sentido, é preciso algum imposto para tributar essas operações, que, antigamente, não existiam. “Só tem um jeito. É preciso uma base alternativa de tributação”, justificou. Ao reforçar a proposta de desoneração da folha como um dos itens da reforma tributária em elaboração, o ministro reforçou que a tributação sobre o salário do trabalhador é “o mais perverso dos impostos” e “uma arma de destruição em massa de emprego”.  Ele destacou, ainda, que entre 30 e 40 milhões de pessoas estão fora do mercado de trabalho formal e não contribuem para a Previdência, mas vão requerer aposentadoria por idade em algum momento. “Ou vamos recolocar esse pessoal (no mercado de trabalho) ou vamos ter que buscar outro imposto”, afirmou.

Reação do mercado

 Na segunda-feira, o  presidente Jair Bolsonaro causou polêmica e gerou nervosismo no mercado ao dizer que “todas as alternativas estavam na mesa”, quando foi questionado sobre uma possível recriação da CPMF. Mais tarde, o porta-voz da Presidência, Otávio Rêgo Barros, disse que o presidente não comentaria mais o assunto. No Ministério da Economia, houve silêncio uma vez, que, em setembro, o último secretário especial que defendeu a ideia desde o início do governo, Marcos Cintra, da Receita Federal, acabou demitido. Em seguida, o substituto de Cintra, José Barroso Tostes Neto, disse que o governo “não pretende tratar desse imposto sobre transações financeiras no momento”.

O ministro destacou que o Executivo não vai enviar uma PEC própria para a comissão especial e reforçou que a ideia não é aumentar a carga tributária, mas mudar a forma de cobrar impostos. Além da desoneração da folha, um dos pilares da proposta, segundo Tostes, inclui o projeto de lei de unificação das alíquotas de PIS-Cofins, com o objetivo de criar uma espécie de IVA federal para bens e consumo. “Nossa proposta é simplificar, e pode ser harmonizada com as que tramitam no Congresso, podendo incorporar incidências e até ser criado um IVA dual”, afirmou.

Tostes também informou que pode haver uma proposta de mudança do Imposto sobre Produtos Industrializados (IPI), que seria transformado em um tributo mais regulatório, em linha com o tipo de política pública que o governo pretende utilizar.

Imposto de Renda

Outro pilar seria a mudança na tributação do Imposto de Renda para pessoa física e jurídica.  “Vamos fazer uma revisão de faixas e alíquotas mais baixas e uma readequação sobre as faixas de renda mais altas”, prometeu. “Esse conjunto de alterações atende a um princípio de simplificação tributária, cujo alto custo (dos impostos) acaba interferindo na competitividade do país”, afirmou o secretário da Receita.

Além da reforma tributária e da administrativa, que ainda não foi enviada ao Congresso, o ministro lembrou que, em novembro, o governo enviou três PECs ao Congresso, para complementar o ajuste fiscal em curso: o Pacto Federativo; a PEC Emergencial, que permite corte de salários de servidores e redução de jornada quando houver problemas de fluxo orçamentário; e a PEC dos Fundos, que prevê a extinção de 280 fundos federais. “O Pacto Federativo vai permitir jogar mais recursos para a saúde, educação e segurança nos estados e nos municípios. A proposta vai redistribuir R$ 450 bilhões nos próximos 10 anos. São R$ 45 bilhões por ano”, disse o ministro. “Esse vai o ser o maior programa de dimensão social”, garantiu.

Em comissão

Será instalada hoje no Congresso Nacional uma comissão especial que terá 90 dias para definir o texto da reforma tributária. A decisão foi anunciada ontem pelos presidentes do Senado,Davi Alcolumbre, e da Câmara, Rodrigo Maia, após reunião com o ministro da Economia, Paulo Guedes, em Brasília. O objetivo da comissão é conciliar os textos em tramitação no Senado e na Câmara com as sugestões do governo. A comissão será formada por 15 deputados e 15 senadores e terá como presidente o senador Roberto Rocha (PSDB-MA) e como relator, o deputado Aguinaldo Ribeiro (PP-PB).