O Estado de S. Paulo, n. 46139, 13/02/2020, Política, p. A4

Braga Netto na Casa Civil fortalece núcleo militar
Vera Rosa
Tânia Monteiro
Julia Lindner
Jussara Soares


O presidente Jair Bolsonaro decidiu promover a troca de maior impacto no núcleo duro do governo e deslocar o ministro da Casa Civil, Onyx Lorenzoni, para outra função. O substituto de Onyx será o general Walter Braga Netto, chefe do Estado-Maior do Exército, que comandou a intervenção na segurança do Rio, em 2018. Considerado o “capitão do time” na montagem da equipe, Onyx teve suas tarefas esvaziadas por Bolsonaro e vai ser transferido para o Ministério da Cidadania, pasta que cuida do Bolsa Família e hoje é comandada por Osmar Terra. Com a mudança, todos os ministros com assento no Palácio do Planalto terão origem militar .

Ao completar 13 meses de governo e dizendo estar “sobrecarregado”, Bolsonaro tem se cercado cada vez mais de integrantes das Forças Armadas e até se reaproximou do vice, general Hamilton Mourão. Na dança das cadeiras, Terra poderá retornar à Câmara, já que é deputado licenciado como Onyx, do DEM, ou até assumir uma embaixada. As trocas não foram oficializadas ainda porque, além de ter ficado irritado com o “vazamento” da informação, Bolsonaro procura acomodar Terra para não desagradar ao MDB. Terra é o único ministro do MDB e o presidente avalia a possibilidade de oferecer a ele uma representação diplomática na Argentina ou na Espanha.

O Estado revelou, nos últimos dias, que o Ministério da Cidadania contratou uma empresa suspeita de ter sido usada como laranja para desviar R$ 50 milhões dos cofres públicos, apesar dos alertas de fraude. Ontem, Bolsonaro cobrou explicações de Terra .

A transferência de Onyx para a Cidadania já vinha sendo estudada pelo presidente, que mostrava descontentamento com o ministro, mas ele só bateu o martelo ontem. A nova mexida no primeiro escalão foi praticamente sacramentada seis dias depois de Bolsonaro entregar o Ministério do Desenvolvimento Regional, responsável pelo Minha Casa Minha Vida, para Rogério Marinho, até então secretário especial da Previdência, e desalojar Gustavo Canuto.

O convite a Braga Netto para a Casa Civil foi feito há dias e reiterado ontem. A informação “vazou”, porém, antes mesmo das conversas reservadas que Bolsonaro teve com Onyx e com Terra, separadamente. O ministro da Cidadania chegou a almoçar com Bolsonaro, atletas e artistas. Depois disso, cumpriu agenda com a primeira-dama, Michelle, na Embaixada de Israel, em Brasília. No fim da tarde, Onyx apareceu sorridente ao lado de Bolsonaro, em cerimônia no Planalto, mas manteve o silêncio. À noite, ao chegar ao Alvorada, Bolsonaro não parou para falar com os jornalistas, mas cumprimentou eleitores. Questionado sobre as mudanças na Casa Civil, foi lacônico: “Está tudo bem no governo”.

Desgaste. Nos bastidores, interlocutores do presidente atribuem o agravamento do desgaste de Onyx ao embate entre ele e o ministro-chefe da Secretaria de Governo, Luiz Eduardo Ramos, que, desde meados do ano passado, assumiu a articulação com o Congresso. Onyx nunca se conformou em ter perdido essa função para um militar. Tudo

piorou no mês passado, quando o ministro estava de férias nos Estados Unidos e o então secretário executivo da Casa Civil, Vicente Santini, usou um avião da Força Aérea Brasileira (FAB) para viajar à Suíça e à Índia. Santini foi demitido por Bolsonaro. Além disso, por ordem do presidente, Onyx teve de entregar o comando do Programa de Parcerias de Investimentos (PPI) para o Ministério da Economia.

Bolsonaro já dava sinais de que queria um “perfil militar” para conduzir a coordenação do governo. Antes de Braga Netto ser oficializado na Casa Civil, no entanto, ele precisará se licenciar das Forças Armadas.

No Congresso, a escolha foi vista com ceticismo. Deputados e senadores não escondem a desconfiança com mais um militar no governo. Com fama de “durão”, Braga Netto é visto como um general sem ambições políticas e acostumado a assumir missões difíceis. Nos dez meses em que atuou como interventor militar na segurança do Rio, em 2018, ainda no governo de Michel Temer, ele reorganizou as forças policiais do Estado, quando estava no Comando Militar do Leste. Braga Netto é amigo de Ramos e do general Augusto Heleno, ministro do Gabinete de Segurança Institucional. / Vera Rosa, Tânia Monteiro, Julia Lindner E Jussara Soares