Correio Braziliense, n. 20707, 01/02/2020. Política, p. 3

Secretário é a nova baixa no MEC

Luiz Calcagno


 

A saída do secretário de Educação Superior do Ministério da Educação, Arnaldo Lima Júnior, demonstra que a pasta vive dias turbulentos. Nos corredores, fala-se que o ministro Abraham Weintraub estaria acenando ao setor privado, insatisfeito com a falta de agilidade do MEC para temas que os contemplam — como dificuldades relacionadas ao Fies e ao ProUni, que nos últimos anos foram importantes fontes de recursos para as faculdades particulares.

Lima, que está há nove meses na secretaria, permanece até a próxima semana, quando entregará ao Congresso o projeto de lei do programa Future-se — que pretende fortalecer a autonomia administrativa, financeira e de gestão de universidades e institutos federais. Por carta, Arnaldo alegou que sai “por motivos pessoais”.

O presidente da Comissão de Educação da Câmara, deputado Pedro Cunha Lima (PSDB-PB), destacou que, terminado o recesso parlamentar, será necessário chamar Weintraub para explicar a sequência de problemas enfrentada pelo MEC — o mais grave deles relacionado às notas do Enem, que causou vários transtornos aos candidatos, como o atraso do cronograma de inscrição no Sisu e nos programas para financiamento de curso, além das matrículas nos cursos. Tanto que considera que a saída de Lima “não se trata de uma troca isolada”.

“Desde o início desta gestão, vêm ocorrendo várias trocas. Para quem acredita que o único caminho de crescimento sustentável do país, e de combate à desigualdade, é a educação, isso é muito preocupante. Não é uma pasta qualquer. Tem que ser acertada, e bem acertada. Eu vejo que existe uma cobrança legítima do parlamento para que o MEC entregue as suas principais demandas”, salientou.

Já o presidente do Sindicato Nacional dos Docentes das Instituições de Ensino Superior, Antônio Gonçalves, observou que a saída de Lima é parte de um problema maior. “A gente entende que há tensões com o Congresso nacional. Tiveram os problemas do Enem que desgastaram o secretário. Mas trata-se de um problema de todo o MEC. Ele (Lima) é importante para governo, pois concebeu o Future-se, que combatemos. O que nos interessa é a política educacional para além das pessoas. E isso vai se manter. Não temos nenhuma expectativa de que a saída vá mudar alguma coisa”.

O presidente da Associação dos Docentes da Universidade de Brasília (AdUnB), Luís Antonio Pasquetti, classificou a saída de Lima como “tardia”. O motivo principal, novamente, é o Future-se.

“Eu vejo como uma medida tardia do MEC, em função de todos os problemas que ocorreram no Enem e no Sisu. Ele deveria ser uma pessoa que defendesse a educação pública brasileira e as universidades, e não vimos isso na gestão do secretário. Ele é formulador do Future-se, que, na nossa avaliação, não resolve as dificuldades das universidades públicas brasileiras. Entendemos que deveria estar saindo junto o ministro da educação, que está matando o futuro da educação”, criticou.

Na carta de demissão, Lima afirmou que deixa o cargo “para abraçar um novo propósito profissional”. “Quando assumi a Secretaria, estava ciente da responsabilidade que resultaria desse ato, mas nunca deixei de ousar e nunca fiz nada sozinho”, afirmou o ainda secretário, que retorna ao Ministério da Economia, de onde é servidor.

O ex-secretário defendeu o Future-se, que chamou de “o que há de mais inovador na educação brasileira”, mas também definiu o projeto como seu ponto final. “O envio do projeto de lei para o Congresso Nacional encerrará minha missão no glorioso Ministério da Educação”, escreveu. Lima passou nove meses no cargo. Por meio de nota, o MEC informou que o ex-secretário “pediu desligamento”.

A maioria das universidades públicas repudia o Future-se, pois afirmam que é uma forma de reduzir o investimento público nas instituições e desvalorizá-las. A Associação Nacional dos Dirigentes das Instituições Federais de Ensino Superior (Andifes) reuniu 45 notas de federais contrárias ao programa.

Frases

“Eu vejo como uma medida tardia (...). Deveria ser uma pessoa que defendesse a educação pública brasileira e as universidades, e não vimos isso na gestão do secretário”

Luís Antonio Pasquetti, presidente da Associação dos Docentes da Universidade de Brasília (AdUnB)

“Desde o início desta gestão, vêm ocorrendo várias trocas (...).  Não é uma pasta qualquer. Tem que ser acertada, e bem acertada.

Deputado Pedro Cunha Lima, presidente da Comissão de Educação da Câmara

“Tiveram os problemas do Enem que desgastaram o secretário. Mas trata-se de um problema de todo o MEC. ”

Antônio Gonçalves, presidente do Sindicato Nacional dos Docentes das Instituições de Ensino Superior