Correio Braziliense, n. 20669, 25/12/2019. Economia, p. 9

Emprego é o presente de natal mais desejado
Rodolfo Costa
André Phelipe
Gabriel Pinheiro
Catarina Loiola


Desempregada há dois anos e morando em um barraco de madeira em Luziânia (GO), a 60km de Brasília, Luísa Soares da Silva, 38 anos, deseja neste Natal um trabalho formal para ter a chance de mudar de vida. “Minhas dificuldades são muitas, mas a questão financeira é a maior. Eu tenho seis crianças pequenas e preciso de um emprego para poder dar uma alimentação de qualidade para eles. É ruim demais ver o seu filho pedindo um pedaço de pão e não ter como dar”, desabafa. O sonho dela — em condições semelhantes ou não — é partilhado por 12,4 milhões de desocupados que sonham com a inserção no mercado de trabalho. Seria a melhor forma de ter, de fato, um Natal feliz e um próspero ano-novo.

Com 2019 chegando ao fim, muitos nutrem expectativas e esperanças para o ano que se avizinha. Sobretudo em um cenário em que a economia, pouco a pouco, começa voltar aos trilhos. Brasileiros sem ocupação que começam a ouvir histórias ou a observar o familiar, amigo ou o vizinho conseguindo emprego passam a, naturalmente, vislumbrar o mesmo para si. Um cenário que, em 2020, traz uma probabilidade maior de pessoas, como Luísa, de se reinserir no mercado.

A atividade econômica ensaia um crescimento entre 2% e 2,5% para o próximo ano, com possibilidades de chegar a 3%, na opinião de analistas que contam com mais investimentos. O Produto Interno Bruto (PIB) neste patamar amplia as chances de os brasileiros conseguirem um posto formal, afirma Tony Volpon, ex-diretor do Banco Central e economista-chefe do UBS Brasil. “O mercado de trabalho está dando sinal de maior formalização do emprego. E isso é um sinal positivo”, destaca.

Na ponta do lápis

As sinalizações de formalização do emprego sugerem a criação de postos com maior potencial de renda e consumo. A carteira de trabalho possibilita ao brasileiro demandar mais produtos não duráveis, semiduráveis e, também, duráveis, como móveis e eletrodomésticos. “É mais fácil para a pessoa conseguir crédito no sistema bancário mediante a comprovação do emprego com carteira”, explica Volpon. Ou seja, para Luísa, que vive de reciclagem e de faxinas para complementar os R$ 212 que recebe do Bolsa Família, essa é uma boa notícia.

O país deve encerrar 2019 com 600 mil empregos gerados, calcula a Confederação Nacional do Comércio de Bens, Serviços e Turismo (CNC). Para 2020, projeta um saldo positivo entre demissões e admissões de 1,1 milhão. Os brasileiros podem vislumbrar o dobro da criação de postos de trabalho, em um processo de retroalimentação com o avanço da economia. Ou seja, quanto mais cargos formais são criados, mais consumo há e maiores são as chances de crescimento do PIB,  consequentemente, de ampliação da necessidade de mão de obra.

Quem também está na esperança de que as previsões para a economia se concretizem em 2020 é a artesã Mari Ferreira de Alencar, 51, moradora do P Sul, na Ceilândia. Depois que parou de vender seus produtos, por falta de demanda, sente no bolso as dificuldades. “Estou fora do mercado formal de trabalho há 16 anos e, nesse tempo, me faltou o dinheiro do aluguel. Fiquei atrasada em três meses e cheguei a ser ameaçada de despejo. Foi muito complicado para mim”, lamenta.

O 2020 dos sonhos da vendedora Abda Sara, 25, não é muito diferente. Embora inserida no mercado de trabalho, ela explica que sofre para fechar as contas no azul e honrar os compromissos. Mensalmente, estima que mais de 60% do salário são voltados para o aluguel e contas essenciais, como água, luz e internet. Para o ano que vem, sonha em não precisar abrir mão de outros itens para ter onde morar. “Saí de casa porque eu quis. Queria me sentir mais independente. Mas é tudo muito caro, né? Fica difícil pagar tudo sozinha e ainda fazer as coisas que realmente quero”, justifica.

A expectativa de Mari em ampliar a venda de seus produtos artesanais e a de Abda em conseguir um emprego que pague mais, também pode se concretizar em 2020. O economista-sênior da CNC, Fábio Bentes, projeta um crescimento do consumo das famílias de 2,5%. “A economia vai continuar sendo puxada mais pelos investimentos do que pela demanda, mas, em termos de contribuição, as famílias representam por quase 2/3 do PIB. Sinceramente, não vejo nenhuma possibilidade de esse cenário ser abalado no curto prazo, a não ser que surja algum fator político para perturbar todo esse cenário. Este ano, o dólar subiu e a inflação não disparou”, justifica.

O aumento do consumo é um desejo da empresária Nívea Marques, 34. Mas não é tudo. O ano próspero que ela almeja é um ambiente com menos impostos, mais segurança pública e educação de melhor qualidade. Com mais de 5 mil seguidores nas redes sociais, sua loja de maquiagens, NK Make, vende para todo o Brasil e, também, em feiras no Distrito Federal. Ao colocar as contas na ponta do lápis, sente o peso dos tributos em envios para fora do DF. “Vendo produtos muito baratos, mas, mesmo assim, precisa pagar imposto. E para a cliente, sempre está muito caro. Por causa daquele famoso ‘quem chora não mama’, a gente sempre precisa dar um desconto, nem que seja de 5% à vista ou formas de parcelar. O comércio exige isso. Quem não tem jogo de cintura não paga as contas no final do mês”, comenta.

Para Nívea, as expectativas de um feliz ano novo podem ser mais frustrantes. A educação — um dos pilares da produtividade — e a segurança pública tendem a esbarrar no ajuste fiscal, prevê o economista-chefe do Banco Votorantim, Roberto Padovani. “Vai demorar mais alguns anos para as políticas públicas se recuperarem, porque dependem da saúde financeira do Estado”, pondera. Quanto ao melhor ambiente para negócios, com menos oneração tributária, é um cenário que depende da aprovação de uma reforma. “Acho que não tem como sair nada de muito fantástico de reforma tributária neste governo. Todos são a favor, mas não tem acordo com relação à calibragem das alíquotas”, explica.