O Estado de S. Paulo, n.46140, 14/02/2020, Política, p. A4
 

Bolsonaro se afasta de vez de primeiros aliados
Jussara Soares
Julia Lindne
Tânia Monteiro / Brasília



Ao confirmar ontem as mudanças no primeiro escalão, o presidente Jair Bolsonaro fez um movimento para rearrumar o governo em ano eleitoral, se distanciou mais de aliados civis de primeira hora e afastou o perfil político do Palácio do Planalto. Sob o argumento de que é preciso virar a página de crises e mostrar resultados em áreas críticas, como a social, Bolsonaro recorreu, mais uma vez, aos militares. De uma só vez, tirou Onyx Lorenzoni da Casa Civil e o transferiu para o Ministério da Cidadania, no lugar de Osmar Terra. O general Walter Braga Netto, chefe do Estado-Maior do Exército, assumirá a Casa Civil e Terra retomará o mandato de deputado na Câmara.

O anúncio foi feito por Bolsonaro pelas redes sociais, um dia depois de ele ter batido o martelo sobre as substituições. A cerimônia de transmissão dos cargos será realizada na próxima terça-feira, no Planalto. Onyx ocupava o ministério mais importante do governo, mas teve suas funções esvaziadas após sofrer seguidos desgastes. Nas últimas semanas, Bolsonaro já dava sinais de que procurava um perfil militar para conduzir a coordenação da equipe.

Na sua avaliação, os partidos vão “nacionalizar” as disputas municipais de outubro e esse embate será um termômetro para as eleições de 2022, quando ele planeja concorrer a um segundo mandato. Em conversas reservadas, o presidente tem dito que precisa apresentar um portfólio de ações em todas as áreas, e não apenas na economia, mas não pretende fazer mais mudanças no Ministério, ao menos por enquanto.

No fim da tarde, ao receber estudantes no Palácio da Alvorada, Bolsonaro exaltou a militarização do governo. “Trocamos hoje (ontem) dois ministros. Ficou completamente militarizado o meu terceiro andar”, disse ele, em transmissão ao vivo na internet, em referência ao local onde fica seu gabinete, no Planalto. “São quatro generais ministros agora. Nada contra os civis. Tem civis excepcionais trabalhando, como o Sérgio Moro (ministro da Justiça), por exemplo. Cada área a gente coloca um ministro que entende do assunto sem aquela jogada que vocês sabiam que existia.”

Ex-interventor federal na segurança do Rio, Braga Netto será o terceiro general com assento no Planalto. Os outros são Augusto Heleno (Gabinete de Segurança Institucional) e Luiz Eduardo Ramos (Secretaria de Governo). Ministro-chefe da Secretaria-Geral da Presidência, Jorge Oliveira é major da Polícia Militar do Distrito Federal. Bolsonaro fala em “quatro generais ministros” porque é muito próximo de Fernando Azevedo e Silva, titular da Defesa.

Com a saída de Onyx do Planalto, Bolsonaro sacramenta o afastamento do time civil que esteve na linha de frente de sua campanha. No primeiro ano de governo, ele demitiu o então ministro Gustavo Bebianno, coordenador da campanha. Também foram expurgados do círculo presidencial deputados como Luciano Bivar, presidente do PSL, Julian Lemos (PSL-PB), Joice Hasselmann (PSL-SP) e o senador Major Olímpio (PSL-SP).

Queixas. Interlocutores de Bolsonaro disseram que, ao mexer na equipe, ele também quis se afastar de possíveis acusações de uso político da máquina. O Estado revelou que o Ministério da Cidadania, na gestão de Terra, contratou empresa suspeita de ser usada como laranja para desviar R$ 50 milhões dos cofres públicos. Bolsonaro cobrou explicações de Terra. Nas redes, o presidente agradeceu ao agora ex-ministro “pelo trabalho e dedicação ao Brasil”.

Bolsonaro ainda se queixava da atenção “exacerbada” que Onyx dava ao Rio Grande do Sul. Filiado ao DEM, Onyx é précandidato ao governo gaúcho. Agora, terá a missão de comandar o Bolsa Família e acabar com as filas do programa.

“O time Bolsonaro é humilde, é unido e é forte e aqui não importa o número da camiseta. O presidente me entrega hoje uma nova missão que eu vou cumprir com o mesmo zelo, com a mesma dedicação e com o mesmo empenho para melhorar a vidas dos brasileiras e das brasileiras”, disse Onyx, em vídeo no Twitter. Deputado licenciado do MDB, Terra afirmou, por sua vez, que continuará ajudando o governo. “Eu estarei onde for mais importante para o governo e para o presidente.”