Correio Braziliense, n. 20734, 28/02/2020. Política, p. 5

Regra de ouro por um fio

Rosana Hessel



A equipe econômica tentou um malabarismo contábil para evitar o descumprimento da regra de ouro, pelo segundo ano consecutivo, mas não teve sucesso e vai ter que pedir ajuda ao Congresso. O rombo previsto no Orçamento deste ano está em R$ 341 bilhões e, mesmo com toda a ginástica nos números, ainda existe um buraco grande a ser coberto, de quase R$ 80 bilhões. Mas, se o Legislativo não der a autorização para o Executivo emitir crédito suplementar desse montante até junho, o presidente Jair Bolsonaro poderá incorrer em crime de responsabilidade fiscal.

A equipe econômica conseguiu fazer aparecer R$ 262,2 bilhões para reduzir a margem de cumprimento da regra de ouro para R$ 78,8 bilhões. Entraram na conta para abater o buraco nada menos do que R$ 162,6 bilhões do lucro do Banco Central obtido com a alta do dólar, entre 2018 e 2019, mas que não representam a venda efetiva de dólares — e que, a partir deste ano, não poderá mais ser contabilizado, conforme prevê a Lei 13.820/2019, que estabeleceu novas regras sobre o destino dos resultados do BC. Com esse novo normativo, os resultados cambiais positivos constituirão reserva contábil no balanço do BC quando este registrar resultado positivo com as operações cambiais e não mais serão enviados para o caixa do Tesouro Nacional.

No clima tenso entre Bolsonaro e o Congresso, por conta do apoio que sinalizou a manifestação contra os demais poderes, no próximo dia 15, a equipe econômica precisará de bons argumentos para pedir crédito extra e salvar o presidente de um processo de impeachment por um crime semelhante às pedaladas fiscais que derrubaram Dilma Rousseff. O governo não pode gastar mais do que arrecadada e emitir dívida para cobrir o pagamento de despesa corrente, como salários e aposentadorias —como previsto na Constituição.

Negociação

No ano passado, o Executivo precisou de autorização do Congresso para emitir um crédito extra de quase R$ 250 bilhões para tapar o buraco das contas públicas. Foi preciso muita negociação com parlamentares, durante a tramitação da reforma da Previdência, para evitar que Bolsonaro cometesse crime de responsabilidade fiscal.

“A nossa melhor estimativa é que encaminharemos solicitação de credito extra de R$ 78,8 bilhões para o Congresso autorizar operações de crédito a mais do que as despesas de capital”, afirmou o secretário adjunto do Tesouro Nacional, Otavio Ladeira, durante a entrevista coletiva de apresentação dos resultados das contas do governo federal. Segundo ele, nessa autorização, ainda será possível utilizar os recursos de anos anteriores que não foram utilizados.