Correio Braziliense, n. 20587, 04/10/2019. Cidades, p. 17

Defesa quer anular júri de Adriana

Mariana Machado


Um dia após a condenação de Adriana Villela como mandante do assassinato dos pais, os advogados dela deram os primeiros passos na tentativa de reverter a decisão. O julgamento da arquiteta terminou na quarta-feira, depois de 10 dias e 103 horas de julgamento — o júri é o maior da história do Judiciário brasiliense. No entendimento dos jurados, Adriana mandou matar o pai, o ex-ministro do TSE José Guilherme Villela, e a mãe, a advogada Maria Villela. A empregada da família, Francisca Nascimento Silva, também foi morta no apartamento da 113 Sul. No total, as vítimas levaram 73 facadas.

O juiz titular Paulo Rogério Santos Giordano fixou a pena em 67 anos e seis meses de prisão, a serem cumpridos, inicialmente, em regime fechado, mas, por ter respondido ao processo em liberdade, além de ser ré primária, ela terá a mesma prerrogativa para recorrer. Ontem, a defesa entrou com uma petição no Tribunal de Justiça do Distrito Federal e dos Territórios (TJDFT) separada ao termo de apelação pedindo a anulação do julgamento.

O advogado Antônio Carlos de Almeida Castro, o Kakay, destacou que não concorda com o resultado. “No termo de apelação, vamos levar o nosso inconformismo ao tribunal. Porém, na petição, estamos requerendo a nulidade do júri”, detalhou. Ele reforçou a competência do magistrado, mas classificou a condenação como “colossal erro judiciário”.

O professor de direito penal do Centro Universitário de Brasília (UniCeub) Marlon Barreto explica que a defesa precisa, primeiro, esperar a manifestação do Ministério Público do DF e Territórios (MPDFT). Depois, os advogados entram com uma apelação e, só então, com o recurso de fato. “Agora que acabou a sessão, o ministério vai ser intimado para informar se vai recorrer ou não (pedindo, por exemplo, progressão da pena). Só depois o juiz intima a defesa, que não pode entrar se o outro não se manifestar”, explicou.

Contudo, segundo o professor, o prazo do MPDFT pode levar 10 dias, mas é possível para os defensores agirem antes, caso haja argumento forte. “O direito penal tem consequências muito graves; então, às vezes, a gente admite que a defesa apresente petições que nem sempre estão previstas no código de processo”, ressaltou. “Há a possibilidade de habeas corpus, que pode ser feita de qualquer forma e a qualquer momento. É como uma arma para sanar qualquer ilegalidade no instante em que acontece”, acrescentou.

De acordo com Marlon, uma das alegações que podem ser apresentadas é má condução do julgamento. “Se o advogado acredita que, no procedimento da sessão do júri, o juiz não deu oportunidade necessária para ele exercer a defesa adequada, vai pedir ao tribunal para analisar”, disse. A petição será analisada por uma câmara do TJDFT composta por três desembargadores, sendo um deles o relator. Caso a maioria vote a favor da nulidade, o processo volta para a 1ª instância, e um novo júri, com outro conselho de sentença, deve ser formado.

Professor há 15 anos, Marlon afirma que viu diversos casos em que tribunais do júri acabaram anulados no país. Se o recurso da defesa não for atendido, o processo segue para as próximas instâncias. Primeiro, ainda no TJDFT. E, em seguida, para o Superior Tribunal de Justiça (STJ), como recurso especial, e para o Supremo Tribunal Federal (STF), como recurso extraordinário. Nos dois últimos casos, no entanto, a ré deixa de responder ao processo em liberdade, uma vez que, por entendimento do STF, a condenação deve ser aplicada a partir da 2ª instância.

 

Nas redes

Poucas horas depois da sentença, Adriana deu início a manifestações nas redes sociais. Em uma publicação na página dela no Facebook, disse ter saudades da mãe. “O amor entre mãe e filha nem sempre foi bem compreendido pelos olhos dos outros — olhos estranhos com que nos olham agora. Mas sempre fomos mãe e filha queridas, sempre seremos e ainda agora, mãe, sinto que é você me consolando as perdas e me segurando pela mão”, declarou, com a uma ilustração representando-a com Maria Villela.

Em outro momento, ela agradeceu o apoio dos amigos. “Eu amo vocês. Amo a vida. Amo meus pais. Amo minha família. E sei que mais cedo ou mais tarde tudo vai ficar bem de novo. Apesar desse atropelamento que ora sofremos, fruto da ignorância e da violência... Isso também passará.”

Em vídeo, Adriana criticou a decisão do Tribunal do Júri de Brasília. “Ao longo desses 10 dias de julgamento, ficou muito claro para todos nós a farsa da polícia. Ficou claro que eu nunca deveria ter sido indiciada. Não existe nenhuma prova contra mim e, inclusive, eu não teria nenhum interesse mesmo em matar meus pais, nem a Francisca”, comentou nas imagens divulgadas ontem. Ela ainda pediu aos amigos que continuem a apoiá-la na luta por justiça.

 

Condenados

Além de Adriana, estão condenados pelo triplo homicídio cometido na 113 Sul Leonardo Campos Alves, Paulo Cardoso Santana e Francisco Mairlon Aguiar. Leonardo era porteiro do Bloco C e teria recebido dinheiro e joias de Adriana para matar o casal Villela. O Ministério Público do DF e Territórios mostrou um vídeo no Tribunal do Júri em que Leonardo detalha inclusive o local onde encontrou a arquiteta duas vezes, nas proximidades do Conjunto Nacional.

 

Frase

“Ao longo desses 10 dias de julgamento, ficou muito claro para todos nós a farsa da polícia. Ficou claro que eu nunca deveria ter sido indiciada. Não existe nenhuma prova contra mim e, inclusive, eu não teria nenhum interesse mesmo em matar meus pais, nem a Francisca”

Adriana Villela, condenada pela morte dos pais