O Estado de São Paulo, n. 46546, 26/03/2021. Política. p.A8

Bolsonaro recebe Lira e afirma ter 'zero problema'

 

 


Encontro ocorre após presidente da Câmara falar em 'remédios fatais' e 'sinal amarelo' em relação a erros no combate à pandemia

Um dia após o presidente da Câmara, Arthur Lira (Progressistas-AL), falar em "sinal amarelo" em relação a erros no enfrentamento da pandemia e dizer que o Parlamento tem "remédios fatais", o presidente Jair Bolsonaro recebeu o deputado, ontem, no Palácio do Planalto, e negou qualquer atrito com o aliado. "Conversei com o Lira e não tem problema nenhum entre nós. Zero problema", disse o chefe do Executivo.

Bolsonaro minimizou a manifestação do líder do Centrão. "Nunca teve nada errado entre nós. Sou velho amigo do Parlamento. Torci por ele (Lira) e o governo continua tudo normal", disse o presidente, que apoiou a candidatura de Lira ao comando da Câmara.

A declaração de Lira ocorreu no dia em que o Brasil ultrapassou a marca de 300 mil mortes provocadas pela covid-19 e depois que Bolsonaro voltou a insistir em práticas contrárias ao que recomenda a ciência. "Os remédios políticos no Parlamento são conhecidos e são todos amargos; alguns, fatais", disse o presidente da Câmara no plenário da Casa, no fim da tarde de anteontem. Ele não citou a palavra impeachment.

Ao fim da reunião de ontem no Planalto, Bolsonaro desceu para acompanhar Lira até o carro e falou rapidamente com jornalistas. Segundo ele, o combate à pandemia foi um dos assuntos tratados na conversa. "O que nós queremos, juntos, é buscar maneiras de contratar mais vacinas. É, na ponta da linha, fazer com que cheguem informações de que vacinas estão sendo aplicadas. É isso que queremos", disse Bolsonaro. O presidente da Câmara deixou o palácio sem dar declarações.

Alemanha. Mais cedo, ao conversar com apoiadores no Palácio da Alvorada, Bolsonaro distorceu uma declaração da chanceler da Alemanha, Angela Merkel, para critica medidas de isolamento social adotadas nos Estados como forma de conter a propagação do coronavírus. O presidente disse que Merkel "cancelou" um lockdown que haveria no país por entender que as restrições são muito mais graves para a economia.

"Ia ter o lockdown rigoroso lá (na Alemanha) e ela (Merkel) cancelou e pediu desculpas. Ela falou lá, segundo a imprensa, que os efeitos de fechar tudo é muito mais grave que os efeitos do vírus. Palavras dela", afirmou o presidente.

No entanto, conforme informações da emissora alemã Deutsche Welle, a suspensão das medidas restritivas aconteceu por não terem sido planejadas com antecedência e em razão do curto período para adotá-las. "A ideia (do lockdown) foi um erro. Havia boas razões para optar por ela, mas ela não pode ser implementada suficientemente bem nesse curto período de tempo", disse Merkel, segundo a emissora. "Esse erro é somente meu", ressaltou a chanceler alemã. "Lamento profundamente e peço desculpas a todos os cidadãos."

Diferentemente do que disse Bolsonaro, a Alemanha também foi um dos primeiros países na Europa a adotar restrições de circulação, no ano passado, mas flexibilizou as medidas após os registros da doença desacelerarem. Ainda assim, no fim do ano, chegou a adotar ações mais rígidas para evitar aglomerações durante as férias de verão e o período de festas.

Bolsonaro é crítico a medidas de isolamento adotadas por prefeitos e governadores. O presidente chegou a acionar o Supremo Tribunal Federal para derrubar o toque de recolher determinado na Bahia, no Rio Grande do Sul e no Distrito Federal, mas teve o pedido negado. Anteontem, Bolsonaro anunciou a criação de um comitê de crise para centralizar as ações contra o vírus, mas manteve a retórica negacionista.

Vice. Na mesma linha de Bolsonaro, o vice-presidente Hamilton Mourão afirmou ontem não ver condições para um lockdown nacional. Segundo ele, a medida seria "impossível" de ser implementada em um país desigual como o Brasil. "Vai ficar só no papel. Julgo que medidas restritivas têm que ficar a cargo de governadores e prefeitos; cada um sabe como está a situação na sua área. E o governo federal tem de dar o apoio necessário, não no caso dessas medidas, mas em termos de recursos financeiros", declarou o vice, que não participou do encontro com Lira. / PEDRO CARAMURU, EMILLY BEHNKE e MATHEUS DE SOUZA

'Velho amigo'

"Conversei com o Lira e não tem problema nenhum entre nós. Zero problema. Sou velho amigo do Parlamento."

Jair Bolsonaro

PRESIDENTE DA REPÚBLICA

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Presidente será o coordenador de comitê.

 

Secom diz que órgão de enfrentamento da covid-19 no País terá Lira e Pacheco como integrantes e duração inicial de 90 dias

BRASÍLIA 

A Secretaria Especial de Comunicação Social da Presidência da República (Secom) informou que o presidente Jair Bolsonaro assinou ontem o Decreto 10.659, que formaliza a criação do Comitê de Coordenação Nacional para Enfrentamento da Pandemia da Covid-19 no País. O órgão será coordenado pelo próprio Bolsonaro e terá como integrantes os presidentes do Senado, Rodrigo Pacheco (DEM-MG), e da Câmara, Arthur Lira (Progressistas-AL), além de um membro a ser indicado pelo Conselho Nacional de Justiça (CNJ). O Ministério da Saúde atuará como a secretaria executiva do novo comitê.

"A medida estabelece que compete ao comitê a discussão das medidas a serem tomadas e o auxílio na articulação interpoderes e interfederativa", afirmou a Secom sobre as funções do órgão. Não há datas previstas para as reuniões do grupo, mas o decreto prevê encontros "em caráter ordinário, conforme cronograma definido na primeira reunião", e também "em caráter extraordinário, sempre que solicitado por qualquer um de seus membros".

O presidente Jair Bolsonaro, como coordenador do comitê, poderá convidar para participar das reuniões autoridades e especialistas de "notório conhecimento" nas questões a serem debatidas, segundo a Secom. As reuniões poderão ser presenciais ou por videoconferência.

Ainda de acordo com a Secom, o comitê poderá criar grupos de trabalho com o objetivo de estudar e articular soluções para assuntos específicos relacionados à pandemia. O órgão extraordinário terá duração de 90 dias, prazo que poderá ser prorrogado.

Comitê de Crise. A Secretaria de Comunicação disse que o Comitê de Crise, para supervisão e monitoramento dos impactos da covid-19, instituído por outro decreto, de março de 2020 e coordenado pela Casa Civil da Presidência, "continua em pleno funcionamento com a coordenação de ações interministeriais de enfrentamento à pandemia". / E.B. e GUSTAVO PORTO