Correio Brazilense, n. 20683, 08/01/2020. Política. p. 3

 

 

 

 

Moro ganha aliados para eleição de 2022

 

 

 

PODER » Parte da ala militar do governo já trabalha pela candidatura do ex-juiz à Presidência, mesmo que Bolsonaro concorra a um segundo mandato

Renato Souza

Vicente Nunes

Ingrid Soares

 

Sem alarde, mas com muito empenho, uma parte da ala militar que continua no governo já trabalha pela candidatura do ministro da Justiça, Sérgio Moro, à Presidência da República em 2022. Esses militares têm certeza de que o ex-juiz vai entrar na disputa pelo Planalto, mesmo que o presidente Jair Bolsonaro concorra à reeleição. Nada, porém, relacionado ao ex-magistrado será definido de forma precipitada. Moro sabe de seu potencial nas urnas, já conversou sobre isso com amigos muito próximos, mas se convenceu de que ainda é muito cedo para falar do assunto. Mais: não quer ser visto como traidor. O tempo, acredita ele, será seu aliado.

Militares que veem Moro como opção para a Presidência da República acreditam que Bolsonaro vai se desgastar muito até o início da campanha, porque não consegue domar sua tendência a gerar polêmicas. Num país com tantos problemas, o ocupante do Planalto deve optar pela sensatez. Moro está mais adequado a esse perfil, acreditam. Outro ponto importante, segundo os militares: o ex-juiz, se candidato e eleito, tenderá a manter Paulo Guedes no comando do Ministério da Economia. Os dois são muito próximos, jantam frequentemente em Brasília. Foi Guedes quem intermediou a aproximação entre Moro e Bolsonaro.

Com a promessa de Guedes no comando da Economia, ressaltam os militares que defendem Moro na Presidência, o ministro terá todo o apoio do mercado financeiro. Há, inclusive, banqueiros trabalhando na mesma direção desses militares para que o titular da pasta da Justiça se jogue de vez na política.

Todas as pesquisas de popularidade apontam Moro como o líder mais confiável do país na atualidade. O único a ter índices mais próximos aos dele é o ex-presidente Lula, que os militares querem ver pelas costas. O ex-magistrado sabe que, com esses indicadores, sai na dianteira de qualquer disputa para o cargo mais importante do país.

Quem transita pelo Palácio do Planalto admite que Bolsonaro está consciente da possibilidade de Moro sair candidato à Presidência da República. Não por acaso, sempre que possível, o chefe do Executivo faz questão de dar umas estocadas no subordinado. A mais recente, e mais pesada, foi a manutenção dos juízes das garantias no pacote anticrime aprovado pelo Congresso.

Ali, Moro sentiu o baque, tanto que explicitou publicamente seu descontentamento. O ministro da Justiça também se conscientizou de que seu sonho de integrar o Supremo Tribunal Federal (STF) está cada vez mais longe de ser realizado. Bolsonaro resiste em indicá-lo. A próxima vaga será aberta em novembro, com a aposentadoria do ministro Celso de Mello.

O titular do Planalto acredita, porém, que pode dobrar Moro e tentar convencê-lo a ser vice em sua chapa à reeleição. O presidente já disse, diversas vezes, que os dois numa chapa única são imbatíveis. Essa tentativa de tirar proveito da popularidade do ministro, que é maior do que a do presidente, não sai da cabeça dos aliados de Bolsonaro que estão se regozijando no poder. O presidente conta ainda com a popularidade do ministro para tirar do papel seu novo partido, o Aliança pelo Brasil, que corre o risco de ficar fora das eleições municipais deste ano. Sem candidatos eleitos nesse pleito, a sigla perde força para emplacar nomes de expressão nas disputas majoritárias em 2022.

 

Confiança

Procurado pela reportagem, o porta-voz da Presidência, Otávio Rêgo Barros, afirma que o governo não difere entre civis e militares entre seus integrantes. Sobre o fato de uma ala da caserna apoiar uma eventual candidatura de Moro ao Planalto, diz que o pleito de 2022 não é assunto de maior importância no momento.

“O presidente Bolsonaro vem acompanhando essas questões da montagem de equipe, e é com confiança que ele administra junto a seus ministros. Quanto a ilações de que militares poderiam participar, em suporte a qualquer outra autoridade em um eventual pleito eleitoral, não tem a menor consideração factual no momento que nós vivemos”, garante.

 

 

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Mais de 20 MPs na fila de espera

 

BERNARDO BITTAR

 

O fim do recesso legislativo, em 4 de fevereiro, dará início a mais um teste de popularidade do governo perante o Congresso. Tão logo voltarem ao trabalho, deputados e senadores terão de analisar mais de 20 medidas provisórias assinadas pelo presidente Jair Bolsonaro. Os textos precisam ir à votação até maio. Antes da folga, parlamentares rejeitaram 11 de 20 proposições semelhantes editadas pelo Planalto. Deputado por quase 30 anos, Bolsonaro terá de usar toda sua experiência e capital político para evitar a queda de braço entre os poderes.

Apenas uma medida provisória enviada até agora começou a ser discutida em comissão especial — primeira etapa de tramitação no Congresso. Trata-se da matéria que institui o Contrato de Trabalho Verde Amarelo. A iniciativa foi questionada, ontem, pela Confederação Nacional dos Trabalhadores na Indústria (CNTI), que recorreu ao Supremo Tribunal Federal (STF) alegando inconstitucionalidade do projeto, criado para abrir postos de trabalho a jovens de 18 a 29 anos, mas cortando direitos.

Também está na lista de espera, o texto que assegura pensão especial e vitalícia de um salário mínimo para crianças vítimas de microcefalia decorrente do zika vírus. A Casa tem até 12 de fevereiro para votar a MP, cuja validade é de quatro meses. “São temas delicados, com certeza, mas não era tão comum enviar MPs ao Congresso em gestões passadas. Ao menos não com tanta frequência”, disse o analista político da HC7 Investimentos Carlos Alberto Moura.

Questões envolvendo dispensa de licitação pública, pagamento de 13º aos usuários do Bolsa Família, fim da exclusividade da Casa da Moeda do Brasil na impressão de cédulas e dispensa de pagamento do Seguro Obrigatório de Danos Pessoais causados por Veículos Automotores de Vias Terrestres (DPVAT) (leia matéria ao lado) e do Seguro Obrigatório de Danos Pessoais Causados por Embarcações ou por suas Cargas (Dpem) estão entre os 22 documentos prontos para serem analisados pelos congressistas.

 

Só urgência

Usadas frequentemente pelo presidente, as MPs são dispositivos constitucionais utilizados em situação de “urgência” ou “relevância”. Precisam ser votadas em até quatro meses, senão, perdem a força de lei. No recesso parlamentar, a contagem é suspensa. Para ser aprovada, uma MP precisa do apoio de 257 dos 513 deputados e de 41 dos 81 senadores.

 

 

 

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Fim do DPVAT não emplaca

LUIZ CALCAGNO

 

O cenário não é nada positivo para a Medida Provisória 904/2019, que extingue o Seguro Obrigatório de Danos Pessoais Causados por Veículos Automotores de Vias Terrestres (DPVAT). A reportagem do Correio conversou com parlamentares, e o principal argumento é que o seguro financia o Sistema Único de Saúde em R$ 400 milhões, ou seja, na prática, a MP reduziria a verba da saúde. A expectativa é de que o texto caduque, mas o governo ainda tem esperança de fazer ajustes para aprová-lo no Senado.

Líder do PSL na Casa, Major Olímpio (SP) não vê saída para a MP. Segundo ele, sem uma indicação clara de como garantir uma nova fonte de renda para a Saúde, não há ambiente para a medida prosperar. “A tendência do Senado é de deixar caducar. Exatamente porque só o DPVAT gera R$ 400 milhões para a saúde pública, que não tinha de onde buscar esse recurso”, argumentou. “O espírito que norteou o governo foi o de defesa do consumidor, mas o sistema gera recurso para saúde pública.”

Mesmo quem é favorável ao fim do imposto, caso do líder da Rede no Senado, Randolfe Rodrigues (AP), não admite o texto do governo. “Eu sou favorável que acabe com a fraude do DPVAT, mas temos que criar uma outra forma de financiar a saúde”, afirmou. O líder do governo no Congresso, senador Eduardo Gomes (MDB-TO), afirma que o Executivo está buscando um equilíbrio para “promover mudanças em relação ao DPVAT”. “O seguro não ficará como está. Isso é certo. Faz parte fazer substituição, proposta de novas fontes de renda para a Saúde e medidas de gestão e controle”, frisou.