Correio Braziliense, n. 21251, 31/07/2021. Política, p. 3

Lira, agora, é contra voto impresso
Jorge Vasconcellos
31/07/2021



Presidente da Câmara, antes defensor da PEC para mudar o sistema eleitoral, afirma que discussão sobre o tema é "perda de tempo" e destaca a segurança das urnas eletrônicas. Já o ministro Gilmar Mendes, do STF, classifica o assunto como "conversa fiada"

O presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL), disse que a discussão em torno da proposta de emenda à Constituição (PEC) do voto impresso é uma "perda de tempo" e que, dificilmente, a proposta chegará ao plenário da Casa. O deputado, que mudou de postura em relação ao tema, também voltou a afirmar que tem confiança no sistema eleitoral brasileiro.

"Já existe uma PEC aprovada no Senado desde 2015 com relação a voto impresso, e o Senado nunca se debruçou a analisar. Portanto, eu venho dizendo que o foco está errado. Se alguém quer trazer esse assunto para discussão, teria que ser tratado no Senado", afirmou o parlamentar, durante evento on-line promovido, ontem, pelo Consultor Jurídico. "Votar uma segunda PEC na Câmara para que depois ela vá ao Senado ter o mesmo destino é perda de tempo, no meu ponto de vista, do processo legislativo."

A PEC do voto impresso é de autoria da deputada bolsonarista Bia Kicis (PSL-DF). O texto deve ser derrubado na comissão especial da Câmara, em votação marcada para 5 de agosto. Dos 34 deputados do colegiado, pelo menos 20 são contra a matéria.
Lira, em posição oposta à do presidente Jair Bolsonaro, que tem feito pressões pela adoção do voto impresso, reafirmou que confia na segurança da urna eletrônica. "Já disputei oito eleições, sendo seis em urna eletrônica. Não temos nenhum fato que diga respeito a fragilidade no sistema ou fraudes", frisou.

O parlamentar disse não ser contra propostas que buscam dar mais transparência aos processos de auditoria, mas observou que qualquer dúvida sobre os resultados das eleições "é ruim para o país, ruim para as instituições e ruim para todos nós".

As declarações mostram uma aparente mudança de postura de Lira. Em 13 de maio, ao lado de Bolsonaro, numa cerimônia em Alagoas, ele defendeu o voto impresso. "É importante para que não paire dúvida na cabeça de nenhum brasileiro. Temos de respeitar o sistema eleitoral, mas ele também tem que ser possível de auditagem", enfatizou, na ocasião. "Ontem, nós, ao final da sessão, assinamos um ato criando a comissão especial que vai analisar o texto do voto auditável no Brasil", acrescentou.

Também participante do evento do Consultor Jurídico, o ministro Gilmar Mendes, do Supremo Tribunal Federal (STF), não usou meias-palavras: classificou a discussão sobre voto impresso de "conversa fiada". "Essa ideia de que, sem voto impresso, nós não podemos ter eleição ou não vamos ter eleições confiáveis, na verdade, esconde, talvez, algum tipo de intenção subjacente, uma intenção que não é boa", ressaltou. "Vamos parar um pouco de conversa fiada. É claro que todos nós somos favoráveis à auditabilidade da urna. E ela é auditável", acrescentou.

O magistrado disse, ainda, que, se o problema é a urna eletrônica, então, a defesa teria de ser a volta ao sistema anterior, com votos no papel. Ele destacou não haver nenhuma prova de fraudes nas urnas eletrônicas, ao passo que, no sistema anterior, as irregularidades eram gerais, tanto na votação manual quanto na contagem.