Valor Econômico, n. 5238, 29/04/2021. Brasil, p. A5

 

Marco Aurélio determina Censo em 2021, mas realização é difícil

Luísa Martins 

Isadora Perons

29/04/2021

 

 

O decano do Supremo Tribunal Federal (STF), ministro Marco Aurélio Mello, concedeu ontem liminar para obrigar o governo federal a realizar o Censo Demográfico ainda neste ano. A decisão irá a julgamento do plenário virtual entre os dias 7 e 14 de maio, segundo o tribunal.

Na semana passada, o Ministério da Economia divulgou não haver previsão orçamentária para que o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) realizasse a pesquisa em 2021, motivando o Estado do Maranhão a acionar o Supremo.

No pedido, o governador Flávio Dino (PCdoB) apontou omissão da União em formalizar atos administrativos e alocar verbas para a realização do Censo. Segundo ele, o conflito tem o potencial de abalar o pacto federativo, visto que poderia resultar na diminuição de transferências de verbas aos Estados e no desequilíbrio na viabilização de ações governamentais.

Ao acolher esses argumentos, Marco Aurélio observou que é por meio de dados e estudos que os governantes podem analisar a realidade do país e, com base nisso, formular e implementar as políticas públicas adequadas. “Como combater desigualdades, instituir programas de transferência de renda, construir escolas e hospitais sem prévio conhecimento das necessidades locais?”

De acordo com ele, o governo, ao deixar de realizar o estudo em 2021 em razão de corte de recursos, descumpriu um princípio constitucional. Isso porque a Constituição prevê que é dever da União “organizar e manter os serviços oficiais de estatística e geografia de alcance nacional”.

“Surge imprescindível atuação conjunta dos três Poderes, tirando os compromissos constitucionais do papel. No caso, cabe ao Supremo, presentes o acesso ao Judiciário, a aplicabilidade imediata dos direitos fundamentais e a omissão dos réus, impor a adoção de providências a viabilizarem a pesquisa demográfica”.

O decano incluiu o processo na lista de julgamentos do plenário virtual. Nessa modalidade, os ministros apenas depositam seus votos em uma plataforma eletrônica, sem debate público sobre o tema.

Nomeado na terça-feira, o novo presidente do IBGE, Eduardo Rios Neto, reconheceu que o Censo não teria como ocorrer em 2021 e que, mesmo para o ano que vem, a realização da pesquisa estava sujeita “a condições sanitárias e de orçamento”. As falas constam em entrevista concedida por ele ao site da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG).

“Meu maior desafio é realizar o Censo Demográfico com qualidade e boa cobertura, agora sabendo que será, provavelmente, em 2022, a depender das circunstâncias sanitárias e orçamentárias. Vamos lutar pela integralidade do orçamento para o Censo 2022 e para mitigar as perdas operacionais em 2021.”

Em entrevista veiculada pela GloboNews, o ministro da Economia, Paulo Guedes, disse que o corte nos recursos para realização do Censo não foi feito pelo governo, e sim pelo Congresso. “Não fomos nós que cortamos o Censo”, afirmou. Ele frisou que a redução de recursos ocorreu no Congresso e que a explicação dada à época foi que a pesquisa não poderia ser realizada em meio à pandemia, com os pesquisadores indo “de casa em casa, transmitindo o vírus”.

Já o sindicato dos servidores da instituição comemorou a decisão, mas defende que a situação da pandemia e o atraso no Orçamento de 2021 inviabilizam a realização da pesquisa este ano.

“A decisão do STF fortalece a necessidade do Censo e é muito importante para jogar luz sobre a importância do censo e do IBGE. Esperamos inclusive que a ação favoreça o resgate completo do orçamento. Mas a situação da pandemia e o atraso do Orçamento não permitem a realização em 2021”, afirmou Dione de Oliveira, diretora da Executiva Nacional da Sindicato Nacional dos Trabalhadores do IBGE (ASSIBGE).

Ela ponderou ainda que as atividades preparatórias para o Censo estão comprometidas, como o treinamento das equipes que já estão trabalhando e a seleção para mais de 200 mil vagas temporárias de recenseadores e agentes censitários. (Colaboraram Lu Aiko Otta, de Brasília, e Lucianne Carneiro, do Rio)