Correio Braziliense, n. 21208, 18/06/2021. Economia, p. 6

Senado da aval para a venda da Eletrobrás
Rosana Hessel
Fernanda Fernandes
18/06/2021



No plenário dividido, parlamentares ratificam MP que permite capitalização da estatal com recursos privados. Criticado pela inclusão de emendas que criam reservas de mercado e devem encarecer conta de luz, texto volta à Câmara

Em uma votação apertada, o Senado aprovou, por 42 votos contra 37, a Medida Provisória nº 1.031/2021, que trata da privatização da Eletrobras. Agora, a matéria volta para a Câmara dos Deputados e fica sob a responsabilidade do antigo relator, Elmar Nacimento (DEM-BA). A MP precisa ser votada até a próxima terça-feira (22) para não caducar.

O texto do relator, senador Marcos Rogério (DEM-RO), teve três versões nas últimas 24 horas e acabou com mais penduricalhos do que chegou da Câmara. Não à toa, foi criticado por ampliar a reserva de mercado no setor elétrico e os custos com subsídios, que devem encarecer a conta de luz para o consumidor.

A senadora Soraya Thronicke (PSL-MS), líder da legenda na Casa, defendeu a aprovação, "considerando o compromisso de que o governo vete todos os jabutis embutidos na MP", algo que analistas duvidam que ocorra.

As ações da estatal fecharam com queda de 3,05%, refletindo a falta de empolgação com os problemas apontados por especialistas e parlamentares, como a inclusão de indenização para o Piauí pela venda de uma subsidiária no estado em 2018. O Ministério da Economia não fez comentários.

"A MP é totalmente inconstitucional e corre o risco de haver judicialização. Inventaram até uma indenização que não existe. O texto é totalmente cheio de jabutis e ninguém do governo apresentou uma conta sobre o impacto das mudanças, o que é grave", avaliou a economista e advogada Elena Landau, ex-diretora do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) e responsável pelo processo de privatização do governo Fernando Henrique Cardoso.

Pior privatização
Para a especialista, a tramitação da MP, enviada ao Legislativo em fevereiro, mostrou um governo fraco e refém do Congresso. "O governo não foi capaz de barrar uma MP que desmonta o setor elétrico, e vai fazer a pior privatização da história", alertou. Segundo Elena Landau, o texto vai afugentar investidores em projetos de energia renovável, porque mantém subsídios e reservas de mercado que não criam um ambiente competitivo. "Foi mais uma oportunidade perdida", lamentou.

Apesar de o Ministério de Minas e Energia alegar que a conta de energia poderá ficar até 7,36% mais barata para o consumidor residencial com a privatização da Eletrobras, a União pela Energia, movimento que reúne associações do setor, prevê que a MP trará um custo extra de R$ 84 bilhões para consumidores residenciais e industriais. Segundo a entidade, a proposta inicial do Executivo era boa, mas foi desvirtuada nos debates. "Infelizmente, os chamados jabutis vão onerar os consumidores por décadas", disse, em nota.

O texto aprovado pelo Senado recebeu 632 emendas, das quais 61 propostas pelos senadores. Entre as mudanças no texto da Câmara, está a emenda que limita em 1% o número de ações que podem ser adquiridas pelos funcionários da estatal. Outra emenda amplia a reserva de mercado para usinas a gás, de 6.000 MW para 8.000 MW, sendo 6.000 MW para as regiões Norte, Nordeste e Centro Oeste, que não possuem gasoduto, e 2.000 MW na região Sudeste, que foi incluída durante a votação no plenário virtual.

Uma das principais críticas a essa emenda é que os custos para a construção da infraestrutura para o acesso a essas usinas a gás podem chegar a R$ 20 bilhões por ano.

Outra emenda polêmica foi inserida por Dário Berger (MDB/SC), prorrogando até 2035 o subsídio para usinas termelétricas comprarem carvão mineral. Após as críticas, Marcos Rogério informou ter retirado a proposta do texto final. "Nós estamos avançando para uma matriz de energia mais limpa e mais barata. Esse tema acabou sendo incluído por mim, mas, em face dos apelos que recebi, estou aqui fazendo a retirada", afirmou.

A senadora Simone Tebet (MDB-MS), líder da bancada feminina, foi uma das mais críticas ao texto do relator. "Essa MP é imoral no conteúdo", disse a senadora. Ela afirmou ser favorável à privatização da Eletrobras, mas que o relatório virou "uma colcha de retalhos de jabutis". "A proposta inicial era capitalizar e diminuir o preço da energia, mas acabou criando uma enorme insegurança jurídica", afirmou.

632 Número de emendas incluídas na MP da Eletrobras. A maior parte das propostas veio da Câmara dos Deputados.