O Estado de São Paulo, n. 46531, 11/03/2021. Política, p.A4

 

 

 

Lula diz estar livre da Lava Jato e faz aceno ao centro

 

 

 

PT. Ao se manifestar pela 1ª vez após anulação de processos, ex-presidente elogia Fachin, ataca Bolsonaro e adota tom conciliador com empresários: 'Não tenham medo de mim'

 

Adriana Ferraz

Bruno Ribeiro

Matheus Lara

 

Apto a disputar a eleição de 2022 após ter suas condenações na Lava Jato anuladas pelo ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) Edson Fachin, o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva usou seu primeiro pronunciamento após a decisão do magistrado para enviar recados ao "mercado" e à classe política, além de críticas ao ex-juiz Sérgio Moro e ao presidente Jair Bolsonaro. Em discurso de duas horas, ontem, no Sindicato dos Metalúrgicos do ABC, em São Bernardo do Campo, o petista afirmou que está "livre da Lava Jato" e vai procurar políticos não só da esquerda, mas do centro, em busca de uma "solução" para a atual crise. Em tom de candidato, se disse "conciliador" e declarou que deve conversar com empresários: "Não tenham medo de mim".

Alternando declarações mais calmas com duros ataques ao presidente, Lula fez um contraponto à conduta do governo no combate à pandemia. "Não siga nenhuma decisão imbecil do presidente da República ou do ministro da Saúde. Tome vacina."

Questionado sobre a decisão de Fachin, o ex-presidente agradeceu ao ministro, mas questionou o "timing". "O meu tempo não era o tempo deles (Poder Judiciário)." Fora da Lava Jato, Lula ainda é réu em seis ações penais que tiveram origem em outras investigações.

 

ELEIÇÃO DE 2022. Lula disse não aceitar se colocar como candidato agora nem dizer se o PT vai encabeçar uma chapa, mas não descartou aliança com partidos de centro. "Temos de esperar chegar o momento, é aí que se vai decidir se será possível uma candidatura única e se podem ser feitas alianças só na esquerda. A gente não pode ficar respondendo à insistência sobre candidatura agora. O que precisamos é andar. O (Fernando) Haddad pode fazer isso nas universidades. E depois a gente discute o resultado do que fomos capazes de produzir."

 

POLARIZAÇÃO. Segundo Lula, "não se pode ter medo de polarizar". "Tem que ter medo é de ficar esquecido. Gosto de eleição em dois turnos justamente para construir as alianças e reunir o País. Se o adversário vai ser Bolsonaro, não sei. Ele tem 20% de milicianistas, vamos ver."

 

FRENTE AMPLA. O ex-presidente questionou a criação de uma frente ampla, com partidos do centro e da esquerda contra Bolsonaro. "Uma frente de esquerda é mais fácil construir para produzir um programa contra o que está acontecendo com a direita, mas esse programa pode envolver setores conservadores. Se colocar na frente a questão eleitoral, se trunca qualquer negociação. Vejo muita gente falar sobre 'frente ampla', mas o que se fala agora é frente de esquerda. Ela será ampla se conseguirmos conversar com outras forças políticas."

 

CIRO E HUCK. Lula ainda criticou o ex-ministro Ciro Gomes (PDT). "Quando chegar a época da eleição, as coisas vão acontecer, não estou preocupado. Só o Ciro está preocupado. Se ele continuar com essas grosserias, o fim dele vai ser sem apoio da esquerda e sem confiança da direita." Sobre o apresentador Luciano Huck, apontado como potencial candidato ao Planalto, o petista respondeu à declaração do empresário de que "figurinha repetida não completa álbum". "Figurinha repetida carimbada vale pelo álbum inteiro", disse Lula.

 

LAVA JATO. O ex-presidente afirmou que a Lava Jato "desapareceu" de sua vida, embora a decisão de Fachin possa ser objeto de recurso por parte da Procuradoria e analisada pelo plenário do STF. "Estou satisfeito que tenha sido reconhecido aquilo que meus advogados vem dizendo. Agora quero dedicar o resto de vida para voltar a andar por esse País para conversar com esse povo." Sobre Moro, disse que vai continuar "brigando" para que o ex-juiz seja considerado suspeito.

 

PETROBRÁS. Para Lula, a Lava Jato causou prejuízos à Petrobrás. "Por conta da Lava Jato, o Brasil deixou de ter investimentos de R$ 172 bilhões." Para o ex-presidente petista, a operação poderia ter atuado sem atingir as "empresas geradoras de empregos".

 

BOLSONARO E PANDEMIA. Lula criticou Bolsonaro ao dizer que ele "passou 32 anos como deputado e conseguiu passar para a sociedade que não era político". Vocês imaginam o poder do fanatismo? Através de fake news, o mundo elegeu um Bolsonaro." O ex-presidente afirmou ainda que vai se vacinar contra a covid-19 e que fará "propaganda". "Não siga nenhuma decisão imbecil do presidente da República ou do ministro da Saúde. Tome vacina", disse. Ele ressaltou ainda o papel dos governadores no enfrentamento do coronavírus e prestou solidariedade às vítimas e aos "heróis e heroínas do SUS".

 

PRIVATIZAÇÕES. O petista citou o ministro da Fazenda, Paulo Guedes, para falar sobre privatizações e crescimento econômico. "Você já viu o Guedes falar uma palavra de desenvolvimento econômico e distribuição de renda? O que vai fazer nossa dívida diminuir em relação ao PIB é o investimento público. Se o Estado não confia na sua política e não investe, por que o empresário vai investir?"

 

CONGRESSO. Lula disse que gostaria de ter um Congresso composto por pessoas "de esquerda, gente progressista", mas que, uma vez que "o povo elegeu quem quis", afirmou que iria "dialogar com todos". "Não tenham medo de mim. Eu sou radical porque quero ir até as raízes dos problemas do País."

 

MERCADO. O ex-presidente buscou fazer uma separação entre "mercado produtivo" e "mercado financeiro", acentuando críticas ao segundo. "Por que o mercado tem medo de mim? Quer ver o povo consumir, tem que gostar de mim."

 

PRISÃO. "Fui vítima da maior mentira jurídica contada em 500 anos de história. Se tem brasileiro que tem razão de ter mágoas, sou eu. Mas não estou."

 

• Haddad

Em fevereiro, o ex-prefeito de São Paulo Fernando Haddad disse que aceitou a orientação de Lula para “rodar o País” e “colocar o bloco na rua”.

 

•  Frente

 Ciro Gomes e Luciano Huck aparecem nas conversas sobre a construção de uma “frente ampla” contra Jair Bolsonaro. Lula criticou.

 

• Justiça

 Edson Fachin anulou as condenações de Lula na Lava Jato. O petista, porém, ainda é réu em ações de outras operações, como Zelotes e Janus.

 

• Covid

Apesar do discurso em defesa da vacina, Lula reuniu apoiadores ontem em evento presencial. E, na hora do pronunciamento. Tirou a máscara.

 

2018

Nas eleições, a onda conservadora que elegeu Bolsonaro levou a uma renovação do Legislativo, com a criação da “bancada bolsonarista”.

 

 Pena

Lula foi preso em 2018 para cumprir pena pela condenação naação do triplex. A sentença da 1ªi nstância foi confirmada pelo TRF-4 e pelo STJ.