O Estado de São Paulo, n. 46529, 09/03/2021. Política, p.A14

 

 

 

Bolsonaro busca partido para ser 'dono'

 


Presidente estaria 'namorando' o Partido da Mulher; na lista estão ainda Progressistas, Republicanos, PTB e PL, representantes do Centrão


O presidente Jair Bolsonaro disse ontem a apoiadores no Palácio do Alvorada que está "namorando" uma legenda da qual seria "o dono". "Estou namorando outro partido, tá? Onde eu seria o dono dele como alternativa, se não sair o Aliança", afirmou – referindo-se ao Aliança pelo Brasil, que naufragou ao não conseguir as 491 mil assinaturas necessárias para registro na Justiça Eleitoral.

Segundo o portal R7, um acordo já estaria fechado com o Partido da Mulher Brasileira, PMB, que mudaria de nome ao abrigálo. A atual presidente do PMB, Suêd Haidar, já teria concordado com a ideia de Bolsonaro ficar como presidente de fato ou de honra. Seria a 10.ª legenda a tê-lo entre seus filiados.

Esses seriam os primeiros passos na preparação do presidente para a campanha eleitoral de 2022 – a meta é dispor de uma legenda na qual ele teria o controle sobre quem se filia e sobre as chapas de candidatos que entrariam na disputa eleitoral do ano que vem. Procurada pelo Estadão, Suêd Haidar não retornou até a conclusão desta edição. "Ele quer entrar com capital de liderança para não ter de abrir mão de suas agendas. Ele não quer negociar", observou, sobre o gesto presidencial, a pesquisadora Carolina Botelho, doutora em Ciência Política e integrante do Scnklab/mackenzie e do Doxa/iesp/uerj.

 

Previsão. Sem partido desde novembro de 2019, quando rompeu com o PSL, Bolsonaro já havia anunciado, em janeiro passado, que decidiria sua filiação até este mês. "Em março eu decido. Ou decola (o Aliança) ou vou ter de arranjar outro", adiantou ele na ocasião. Desde então, partidos nanicos de centro se ofereceram para recebêlo. Bolsonaro já afirmou, em entrevista à Band TV, que estava "namorando o tal do Patriota" – mas o assunto não prosperou.

Além do presidente, o novo partido escolhido por Bolsonaro também deve abrigar seus aliados, entre eles, seus filhos políticos. Dois deles, o senador Flávio Bolsonaro (Republicanos-rj) e o vereador Carlos Bolsonaro (Republicanos-rj) migraram recentemente, mas o presidente da legenda, Marcos Pereira (SP), afirmou em entrevista ao Estadão que eles estão de passagem. Na ocasião, o dirigente deu a entender que não iria abrir mão do comando da sigla para Bolsonaro.

A lista de opções de novos partidos citada por interlocutores do presidente é formada ainda por Progressistas, Republicanos, PTB e PL, como representantes do Centrão, e pelo PSL, sigla pela qual Bolsonaro se elegeu em 2018.

Na avaliação da pesquisadora Carolina Botelho, os caminhos mais "racionais" que Bolsonaro poderia seguir mirando a reeleição passam pelo Republicanos, que já abriga seus filhos Flávio e Carlos. "É difícil medir quais são os passos do Bolsonaro. Se ele quiser seguir uma lógica mais política, em busca de convergir, ter apoio e verba, poderia até voltar para o PSL, onde ainda estão o filho Eduardo e outros apoiadores. Há ainda uma lógica financeira que faria sentido", disse Carolina.

"Outro tipo de apoio que seria bom", prossegue a pesquisadora, "seria se ele fosse para o Progressistas. Essa é uma escolha mais política e racional, para manter apoio no Congresso e se aproveitar do saldo que o partido teve nas eleições municipais de 2020. Republicanos também, onde eu acho que ele seria bem recebido pelos pastores, mas demanda negociação".

 

Ônus. O fato de Bolsonaro querer um partido do qual possa ser "dono" pode reduzir suas opções de filiação, segundo analistas. O Progressistas, comandado pelo senador Ciro Nogueira (PI), por exemplo, possui uma estrutura bem definida, o que poderia restringir a influência do presidente.

No Republicanos, Bolsonaro estaria ao lado dos filhos e fortaleceria o vínculo com a Igreja Universal do Reino de Deus. Mas o presidente da sigla, deputado Marcos Pereira (SP), já disse que não abre mão do controle da sigla

.No PTB, o presidente, Roberto Jefferson, seria "o ônus e o bônus", na avaliação de Carolina, uma vez que Bolsonaro veria sua imagem associada ao pivô do mensalão e à corrupção. "Ficaria muito marcado", afirmou a cientista política.

Com uma das maiores bancadas da Câmara, o PL exerce forte influência no Centrão. Comandado por Valdemar Costa Neto, o partido também é um dos mais implicados na Operação Lava Jato.

Quanto ao PSL, partido pelo qual foi eleito em 2018 e no ano seguinte rompeu, o presidente já sinalizou a possibilidade de retornar, mas a ala fiel ao presidente do partido, deputado Luciano Bivar (PE), resiste à nova filiação.

Em 2018, após receber Bolsonaro, o PSL deixou de ser "nanico" e se tornou uma potência partidária, elegendo 54 deputados – o que o credenciou a receber a segunda maior fatia de verbas públicas destinadas aos partidos políticos.

O presidente do Patriota, Adilson Barroso, disse até "orar" pela retomada das conversas pela filiação de Bolsonaro, interrompidas há três anos. "O nome Patriota foi ele (Bolsonaro) quem deu, antes o partido chamava Partido Ecológico Nacional (PEN)." Segundo o dirigente, se a união se concretizar, Bolsonaro terá o controle de filiações e das candidaturas de 2022.

 

Assinaturas. Em paralelo, a luta pela formalização do Aliança pelo Brasil não parou, mas deixar a legenda apta para concorrer em 2022 é uma possibilidade distante. O partido validou menos de 15% do total das assinaturas necessárias – 76.915 mil fichas. "Se ele conseguisse criar o partido, seria um bom cenário para imprimir o selo dele. Tem um grupo de eleitores que quer o Bolsonaro, independentemente de qualquer coisa, então os outros partidos ficariam na órbita dele e políticos poderiam inflar o Aliança automaticamente", afirmou Carolina.

Segundo o vice-presidente do Aliança, o empresário Luís Felipe Belmonte, a sigla em formação já conseguiu coletar pelo menos a metade dos apoiamentos necessários para sair do papel, mas o número "não se reflete" na Justiça Eleitoral por causa da demora no processamento das fichas.

"A minha previsão é a de que até abril, no máximo maio, devemos estar com todas as fichas necessárias. Aí, em mais uns três ou quatro meses, a Justiça Eleitoral concluiria o registro do partido."  / MATHEUS DE SOUZA, CÁSSIA MIRANDA E PEDRO CARAMURU

 

Em trânsito

"Estou namorando outro partido, tá? Onde eu seria o dono, se não sair o Aliança".

Jair Bolsonaro

PRESIDENTE DA REPÚBLICA

 

"Ele não quer negociar"

Carolina Botelho

PESQUISADORA/MACKENZIE