O Estado de São Paulo, n. 46518, 26/02/2021. Economia & Negócios, p. B1

‘Ninguém fica sentado em casa aumentando preços’, afirma presidente da Petrobrás
Fernanda Nunes
Denise Luna
Vinicius Neder
26/02/2021



Mind the gap”. Em sua primeira aparição após ser atacado pelo presidente Jair Bolsonaro, Roberto Castello Branco usa camiseta com inscrição do metrô de Londres para alertar para o risco de vender combustíveis a preços descolados do mercado internacional

Em casa. De camiseta em teleconferência, Roberto Castello Branco rebateu ainda as críticas por estar em home office

Em sua primeira aparição pública após ser demitido pelo presidente Jair Bolsonaro pelas redes sociais, o presidente da Petrobrás, Roberto Castello Branco, usou até mensagens subliminares para se defender. O executivo rebateu cada uma das críticas disparadas contra ele e apareceu na teleconferência com analistas do mercado financeiro com uma camisa de malha com a inscrição "mind the gap", um alerta do metrô de Londres para que os passageiros fiquem atentos ao vão que separa o trem da plataforma.

A expressão batizou o plano estratégico da companhia, elaborado durante a gestão do executivo, e que tinha como objetivo reduzir as diferenças entre a Petrobrás e suas concorrentes internacionais. Ao utilizá-la, Castello Branco enviou um recado a Bolsonaro sobre os riscos de se vender combustíveis a preços descolados do mercado internacional. A adoção pela empresa de uma política de reajustes em linha com as oscilações do petróleo negociado na Bolsa de Londres – Política de Paridade Internacional (PPI) – motivou a demissão do executivo na semana passada. "Queremos nos comparar aos melhores", afirmou o executivo.

Castello Branco disse ter sido acusado injustamente de falta de transparência e que "o preço dos combustíveis ainda é alvo de palpites de jogo de futebol". Segundo ele, as decisões sobre o assunto são reflexos do mercado de petróleo e levam em conta princípios de governança. "Ninguém fica sentado em casa aumentando preços, é um trabalho de equipe", afirmou.

Enquanto Castello Branco prestava contas da sua gestão, o presidente Jair Bolsonaro retomava os ataques, em evento em Foz do Iguaçu (PR), ao lado do seu indicado ao comando da petrolífera, general da reserva Joaquim Silva e Luna.

Bolsonaro não gostou do aumento de 15,2% do óleo diesel anunciado pela Petrobrás na quinta-feira da semana passada. Ao encarecer o combustível, Castello Branco contrariou reivindicações dos caminhoneiros, que, por conta do diesel, ameaçam repetir a greve histórica de maio de 2018. A categoria é uma das mais importantes bases eleitorais do presidente da República.

O principal argumento do executivo é de que não há como a empresa se inserir numa economia de mercado sem se balizar na cotação do petróleo em dólar, como seus competidores. Ele alegou ainda que uma relevante parcela da dívida da empresa é cobrada na moeda americana.

"Não se atende aos melhores interesses da sociedade subsidiando os preços dos combustíveis. Nós optamos, por ter uma visão social, por projetos que tenham alta taxa de retorno social, seja em educação, meio ambiente ou no combate à covid", disse o presidente da Petrobrás.

Home office. Em sucessivas mensagens contra a atual administração da estatal, Bolsonaro também criticou o executivo por trabalhar de casa durante a pandemia, em regime de home office. Todas as críticas foram rebatidas por Castello Branco, em duas horas e meia de teleconferência para apresentar o resultado financeiro de 2020, quando a Petrobrás teve lucro de R$ 7,1 bilhões. Em nenhum momento, foi citado o nome de Bolsonaro.

Castello Branco alegou que a adoção do trabalho remoto na Petrobrás gerou ganhos de produtividade e redução de custos, além de ter contribuído para diminuir a transmissão do coronavírus. "O vencedor não é quem é maior, mas quem sabe mudar rapidamente de forma inteligente", acrescentou, em resposta à fala de Bolsonaro, que chamou de "inadmissível" a adoção do home office pelo presidente da Petrobrás.

Apesar do tom de ressentimento na teleconferência com analistas, Castello Branco se mostrou disposto a ajudar na transição do comando da estatal para o general Silva e Luna. O executivo acredita que o processo deverá ser "suave", mas evitou comentar o futuro da companhia.

Disse apenas que não há indicação de mudanças na política de preços dos combustíveis e que, até agora, os últimos acontecimentos não interferiram no programa de venda de refinarias da estatal.

Retorno social

"Não se atende aos melhores interesses da sociedade subsidiando os preços dos combustíveis Nós optamos, para ter uma visão social, por projetos que tenham alta taxa de retorno social, seja em educação, meio ambiente ou no combate à covid."

Roberto Castello Branco

PRESIDENTE DA PETROBRÁS