O Estado de São Paulo, n. 46845, 19/01/2022. Economia, p.B2

 

 

Categorias que ganham mais puxam pressão por reajuste

 

 

Com salário médio entre R$ 26,2 mil e R$ 29,3 mil, elite está mobilizada desde que Bolsonaro prometeu aumento a policiais

 


ADRIANA FERNANDES
 

As carreiras de servidores federais que fazem maior pressão por reajuste salarial são as que custam mais para os cofres públicos e têm salários maiores.

Auditores fiscais da Receita Federal e do Trabalho, peritos criminais federais, delegados da Polícia Federal (PF), advogados da União e analistas do Banco Central (BC) estão no topo da lista das 22 carreiras mais bem remuneradas do Executivo, segundo levantamento do Estadão a partir de dados do Ministério da Economia.

Com remuneração anual entre R$ 380,38 mil (auditores da Receita) e R$ 341,1 mil (analista do BC) e salário médio entre R$ 26,2 mil e R$ 29,3 mil, essa elite do funcionalismo puxou a fila da articulação política de mobilização depois que o presidente Jair Bolsonaro acenou com aumento só para categorias policiais (confira ao lado).

A remuneração final da elite, porém, na maioria das vezes é mais elevada porque os dados não consideram bonificações, como os honorários advocatícios, benefícios e indenizações. A lista não contempla servidores do Judiciário e do Legislativo porque as informações para esses dois Poderes são menos transparentes.

No topo da lista, estão os 7.860 auditores da Receita, seguidos por 2.014 auditores fiscais do Trabalho, com remuneração anual de R$ 372,24 mil.

As 22 categorias do levantamento, com 119 mil servidores ativos e inativos, incluindo pensionistas, custaram, em 2021, R$ 33,3 bilhões. Desses servidores, 55,1 mil estão na ativa, com custo superior a R$ 15 bilhões. A folha dos demais 44,03 mil aposentados e 20,57 mil pensionistas teve peso maior (R$ 18,3 bilhões).

Entre os servidores que ganham menos, estão os do Plano Geral do Poder Executivo Federal (PGPE), de nível médio e superior. Os PGPES e carreiras correlatas somam 396.771 servidores – um terço do Executivo. Os servidores da educação (professores e técnicos) são em número ainda maior (419.477), o correspondente a 36% do funcionalismo.

Os que têm salário mais baixo são maioria entre 1,3 milhão de servidores e mais de 100 carreiras com perfis de promoção diferentes, que geram distorções, ainda mais se comparadas às carreiras do Judiciário e do Legislativo. A última negociação foi de 2016 a 2019. Os contemplados até 2017 tiveram em média 10,8% e os contemplados até 2019, 27,9%.

Base

Entre 1,3 milhão de servidores, os que têm salário mais baixo são maioria

COMPARAÇÕES.

O presidente da Associação Nacional dos Auditores Fiscais da Receita Federal (Unafisco), Mauro Silva, disse que os auditores fiscais têm menor remuneração entre os pares dos Estados e municípios. Desde 1998, segundo ele, a carreira já perdeu 32% da remuneração em quantidade de salários mínimos (R$ 1.212). Ele ponderou que a carreira de advogado da União tem no Executivo, na prática, os salários mais altos, por receber bônus de eficiência. Pelos seus cálculos, os advogados ganham 30% a mais devido aos honorários de sucumbência. Para ele, a discrepância é maior ainda com o Judiciário, que recebe verbas indenizatórias que não pagam Imposto de Renda. "A comparação com a iniciativa privada é viciada também porque mais de 70% dos trabalhadores com salários superiores a R$ 10 mil são PJS, e não CLT", disse. •

Com a dissidência dos servidores da Receita, entidades que representam o funcionalismo público federal levaram ontem cerca de 500 servidores públicos aos atos em frente ao Banco Central e ao Ministério da Economia, pedindo reajustes salariais e reestruturação de carreiras.

A ausência foi sentida. Foram justamente os auditores da Receita que puxaram a mobilização no fim do ano passado com a estratégia de entrega de cargos e operação-tartaruga. Para não participar do dia de mobilização, eles alegaram que a pauta de reivindicação da categoria é específica e tem como prioridade a regulamentação de um bônus de eficiência – modelo muito semelhante ao que já recebem os advogados da União.

O movimento foi considerado fraco pelo Ministério da Economia e por lideranças governistas, que ainda aguardam decisão do presidente Jair Bolsonaro sobre o que fazer com a dotação de R$ 1,7 bilhão reservada no Orçamento de 2022 para a recomposição salarial, depois que várias categorias se juntaram para brigar também pelo reajuste prometido pelo Palácio do Planalto apenas aos policiais. A previsão orçamentária não especifica a carreira que teria o reajuste, o que abriu uma crise.

O líder do governo na Câmara, Ricardo Barros (Progressistas-pr), minimizou a manifestação de servidores em Brasília e ponderou que Bolsonaro ainda não bateu o martelo sobre o reajuste salarial em 2022.

"Foi fraquinho", afirmou Barros. "O presidente vai tomar uma decisão. No final do ano, não tinha dinheiro no Orçamento, e eu falei que era melhor não dar para ninguém. Se o governo decidir fazer, vamos tomar as providências para resolver, não tenho problema."

Apesar da baixa adesão aos protestos de ontem, os líderes sindicais prometeram aumentar a mobilização caso o Executivo não conceda reajustes às demais categorias e falaram em greve a partir de fevereiro. Houve faixas nos protestos com críticas a Bolsonaro e ao ministro da Economia, Paulo Guedes, e contra a Proposta de Emenda Constitucional (PEC) da reforma administrativa – que prevê uma reformulação na forma como os servidores são contratados, promovidos e demitidos.

Nos bastidores, líderes de algumas categorias sinalizaram ao governo que, caso Bolsonaro recue e não conceda o prometido reajuste às polícias, a mobilização tende a arrefecer. A informação foi confirmada pela reportagem também junto a lideranças sindicais. Mas, por outro lado, destacam que, nesse caso, as entidades que representam as polícias vinculadas à União também devem procurar o funcionalismo para ampliar as mobilizações. •

"O presidente vai tomar uma decisão."

Ricardo Barros (Progressistas-pr)

Líder do governo na Câmara, sobre a manifestação dos servidores federais