Correio Braziliense, n. 21169, 10/05/2021. Política, p. 4

 

CPI sobe a rampa do Planalto

Renato Souza

Bruna Lima

10/05/2021

 

 

Senadores estudam os próximos passos, pois colocam Bolsonaro no foco e podem levar à convocação do vereador Carlos para explicar o suposto aconselhamento paralelo. E um dos principais ex-assessores presidenciais, Fabio Wajngarten, pode ter sigilos quebrados

A CPI da Covid estuda com cuidado os próximos passos a seguir, pois trazem o Palácio do Planalto e Jair Bolsonaro para o centro das investigações, e seus integrantes — sobretudo os de oposição — não querem antecipar juízos que possam contaminar os trabalhos e criar uma onda contrária ao colegiado antecipadamente. Isso porque, no mapa traçado pelos senadores para esta semana, estão: coleta de dados sobre os passeios do presidente Jair Bolsonaro pelo Distrito Federal — algo que se repetiu ontem, ao lado de milhares de motociclistas; pedido de quebra de sigilo do ex-secretário de Comunicação do governo, Fábio Wajngarten, que, até poucos meses, era um dos mais ilustres integrantes dos bastidores palacianos; e a possibilidade de votar a convocação do vereador Carlos Bolsonaro, filho do presidente e apontado como o chefe do chamado "gabinete do ódio" e da administração paralela revelada pelo ex-ministro Luiz Henrique Mandetta — cujo aconselhamento o teria distanciado das medidas propostas pelo Ministério da Saúde contra a covid-19.

Na avaliação do vice-presidente da CPI, senador Randolfe Rodrigues (Rede-AP), esse assessoramento extra-oficial foi exposto não apenas por Mandetta, mas, também, pelo depoimento do ministro da Saúde, Marcelo Queiroga. "Comparem o que falou aqui o ministro com o que falou ontem o presidente da República. Vemos fortes divergências. Então, o comando paralelo continua", observou, enumerando os ataques ao distanciamento social, à China e ao uso de máscaras como sinais da existência desse gabinete informal.

Além disso, a CPI quer apurar a quantidade de hidroxicloroquina estocada no ministério e se o governo federal usou como estratégia contra a pandemia a chamada "imunização de rebanho", a partir da situação da doença em Manaus. "As falas só contribuem com o raciocínio que estamos tendo. Qual era a estratégia do enfrentamento da pandemia? A imunização natural, a chamada imunização coletiva. E essa estratégia tem um preço alto que estamos pagando", criticou Randolfe. Para verificar a hipótese, é estudada a convocação do governador Wilson Lima, do Amazonas, para depor — ele, supostamente, teria fechado com Bolsonaro um acordo para que a pandemia avançasse a fim de que "imunização coletiva" se concretizasse.

Mudança na bula
O presidente da Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa), Antonio Barra Torres, será ouvido amanhã e deve detalhar as vezes em que a autarquia foi procurada para tratar de vacinas e que esforços foram feitos para adotar o uso de imunizantes. Ele também será questionado sobre tentativas de intervenção pelo Palácio do Planalto, sobretudo a denunciada por Mandetta à CPI — a proposta de mudar a bula da cloroquina para que fosse recomendada, também, contra a covid-19, contra a qual Barra Torres teria se insurgido.

Na quarta-feira, os parlamentares sabatinam Wajngarten e, na quinta, será a vez de dois representantes da Pfizer para avaliarem como foram as tratativas e atrasos do governo em relação à vacina. O ex-ministro das Relações Exteriores, Ernesto Araújo, ficou para a semana que vem, a mesma em que deve ocorrer a oitiva do ex-ministro Eduardo Pazuello, cuja ida à CPI pode ser antecipada caso não consiga explicar as razões de ter se encontrado com o ministro Onyx Lorenzoni (Secretaria-Geral da Presidência) e com o senador Ciro Nogueira (Progressistas-PI).

Testemunhas que representam o Instituto Butantan, a Fundação Oswaldo Cruz e a União Química, fabricante brasileira que reproduz a vacina Sputnik V, vêm em seguida. "Vamos avançar no foco da CPI e não faremos investigação para saciar nossas vicissitudes pessoais. Faremos a apuração para responder aos milhões de brasileiros o porque temos mais de 400 mil mortes", garantiu Randolfe.

Ele disse ao Correio que, até a última reunião da CPI, apenas um dos documentos solicitados pela comissão havia chegado às mãos dos senadores. "Creio que, até semana que vem, nós vamos ter vários chegando. Aí, nós vamos nos organizar para deliberar na direção da CPI, tomar uma decisão administrativa sobre a dinâmica para acesso aos documentos e como operacionalizá-los". (Colaborou Fabio Grecchi)