O Estado de São Paulo, n. 46503, 11/02/2021. Política, p. A10

Aras faz nova ofensiva contra a Lava Jato
Paulo Roberto Netto
11/02/2021



Procurador-geral envia ao Conselho Nacional do Ministério Público pedido de investigação contra Deltan e ex-integrante da força-tarefa
PGR. Aras foi acionado pelo presidente do STJ; pedido para que conduta de procuradores seja apurada está com o corregedor do CNMP

O procurador-geral da República, Augusto Aras, encaminhou à Corregedoria do Conselho Nacional do Ministério Público (CNMP) um pedido de investigação contra integrantes da força-tarefa da Operação Lava Jato em Curitiba. A solicitação partiu do presidente do Superior Tribunal de Justiça (STJ), Humberto Martins. Para Martins, mensagens apreendidas na Operação Spoofing indicariam que procuradores pretendiam vasculhar, sem autorização judicial, a movimentação patrimonial de ministros da Corte.

Em ofício enviado a Aras na sexta-feira passada, o presidente do STJ pedia a Aras que o Conselho do Ministério Público investigasse a conduta do ex-coordenador da Lava Jato no Paraná Deltan Dallagnol, e do procurador Diogo Castor de Mattos. Conversas entre os dois foram divulgadas pela CNN Brasil.

As mensagens fazem parte da investigação da Operação Spoofing, que mirou um grupo hacker acusado de invadir aparelhos celulares de dezenas de autoridades do País, entre elas o ex-juiz da Lava Jato e ex-ministro da Justiça e Segurança Pública Sérgio Moro e procuradores da República.

Em uma das conversas, Deltan escreve: "A RF (Receita Federal) pode, com base na lista, fazer uma análise patrimonial, que tal? Basta estar em Eproc (processo judicial eletrônico) público. Combinamos com a RF." O então coordenador da forçatarefa no Paraná continua: "Furacão 2". Diogo Castor de Mattos, que integrava a força-tarefa na ocasião, afirma então não acreditar no envolvimento do ministro do STJ Felix Fischer em eventuais irregularidades. "Felix Fischer eu duvido. É um cara sério", responde o procurador a Deltan.

"Furacão 2" seria uma referência à Operação Furacão. Deflagrada em abril de 2007, a investigação atingiu o então ministro do STJ Paulo Medina, depois denunciado sob acusação de integrar um esquema de venda de sentenças judiciais.

'Gravidade'. "Considerando a gravidade das informações trazidas na reportagem, solicito que tome as necessárias providências para a apuração de condutas penais, bem como administrativas ou desvio ético, dos procuradores nominados e de outros procuradores da República eventualmente envolvidos na questão", escreveu Martins a Aras.

O procurador-geral enviou o pedido de investigação para o corregedor do Conselho do Ministério Público, Rinaldo Reis, a quem caberá avaliar se há ou não elementos suficientes que justifiquem a abertura de um procedimento interno contra Deltan e Castor de Mattos.

Por meio de nota, a Corregedoria Nacional do Ministério Público afirmou que está analisando a representação movida pelo presidente do Superior Tribunal de Justiça e que, portanto, ainda não há uma manifestação oficial sobre o caso.

'Factoides'. Na segunda-feira passada, procuradores da Lava Jato enviaram ofício ao STJ no qual afirmam que as mensagens divulgadas não são autênticas e que a divulgação delas busca "criar factóides" e "criar artificialmente um ambiente de irregularidades e ilegalidades" com fim "sensacionalista".

Uma cópia do documento também foi enviada à Procuradoria-geral da República e à Corregedoria Nacional do Conselho Nacional do Ministério Público. "Se fossem verdadeiras as alegações de supostas ilegalidades, seriam facilmente constatáveis nos respectivos autos", argumentam.

Ainda segundo os procuradores, não houve perícia oficial das mensagens divulgadas pela reportagem e tal procedimento não seria possível porque os hackers poderiam editar o conteúdo das conversas. "Basta retirar ou acrescentar uma vírgula no texto, uma simples palavra como 'sim' ou 'não', alterar a ordem dos diálogos para comprometer o seu conteúdo e entendimento."

'Providências'

"Considerando a gravidade das informações, solicito que tome as necessárias providências para a apuração de condutas penais, bem como administrativas ou desvio ético, dos procuradores."

Humberto Martins

PRESIDENTE DO STJ