Valor Econômico, n. 5235, 26/04/2021. Política, p. A13

 

Realização do censo é obrigação legal, diz procuradora

Fabio Graner

26/04/2021

 

 

A lei que estabeleceu o Censo Demográfico no Brasil completará 30 anos no dia 10 de maio, poucos dias depois de o governo ter anunciado que não tem previsão de fazer a pesquisa neste ano. Mas a realização da pesquisa a cada dez anos é uma obrigação prevista em lei e não poderia ser descumprida neste ano, diz a procuradora do Ministério Público de Contas de São Paulo e especialista em finanças públicas, Élida Graziane.

O tema ganhou destaque porque na sexta-feira, o secretário especial de Fazenda do Ministério da Economia, Waldery Rodrigues, afirmou que não há dotação orçamentária para sua realização em 2021. A última edição foi feita em 2010. Ele disse que o tema será discutido futuramente pelo governo.

Na área econômica, além do fato de o Congresso ter deixado de fora os quase R$ 3 bilhões necessários para sua execução, a leitura é que a situação de pandemia não favoreceria a realização da pesquisa, embora se saiba que ela está prevista em lei. Segundo uma fonte, os pesquisadores indo de casa em casa para fazer os levantamentos de informações elevariam os riscos de transmissão do vírus.

O mesmo interlocutor lembra ainda que é preciso no mínimo dividir a responsabilidade pela falta de recursos para o censo com o Congresso, que, apesar do montante elevado de emendas, não separou dinheiro para essa pesquisa.

Élida, porém, considera que a justificativa da pandemia poderia até ser válida em 2020, quando o prazo legal já determinava o levantamento. Agora, argumenta, há vacina disponível para a covid-19 e os recenseadores poderiam ser incluídos entre as prioridades. “O governo vai pagar e fazer a vacinação prioritária de atletas que vão para a Olimpíada, por que não fazer isso para os recenseadores?”, questionou, apontando que, como está em lei, o censo deveria ser tratado como despesa obrigatória.

Para ela, há incoerência do governo, que colocou na PEC emergencial um dispositivo determinando a avaliação de políticas públicas, mas agora nega recursos para o censo, que traria informações preciosas e necessárias para que elas sejam bem feitas. Além disso, a pesquisa é necessária para atualizar a repartição de recursos federais com Estados e municípios.

A procuradora aponta que a falta de dotação orçamentária não é empecilho. “Pode se fazer um crédito especial para autorizá-la”, lembrou. Isso, contudo, encontraria um outro problema: o teto de gastos. Mas há propostas para retirar essa despesa do limite constitucional, como a feita pelo economista Bráulio Borges, em 2019.

Além da falta de previsão para o censo, o Orçamento de 2021 teve outras polêmicas. A peça sancionada na quinta-feira teve cortes significativos na área de educação, com quase R$ 4 bilhões a menos (R$ 2,7 bilhões em bloqueio, que pode se revertido, e mais R$ 1,2 bilhão em vetos, cortes definitivos). O Ministério do Desenvolvimento Regional (MDR) teve o maior volume perdido, R$ 9,5 bilhões. A pasta é comandada por Rogério Marinho, desafeto de Paulo Guedes (Economia).

O corte atingiu até o Ministério do Meio Ambiente, mesmo com a cúpula do clima e as promessas de aumento de verbas. Perto de outras pastas, o corte foi pequeno: R$ 239 milhões em vetos, sendo a maior parte das emendas de relator.

Outro ponto controverso foi o corte de R$ 200 milhões em verbas para o desenvolvimento de vacina nacional para a covid-19, no âmbito do Ministério da Ciência e Tecnologia. O senador Wellington Fagundes (PL-MT), relator da comissão temporária da covid no Senado, classificou o corte de “inadmissível” e disse que vai convidar o ministro Marcos Pontes para tratar do assunto na Casa.