Valor Econômico, n. 5232, 20/04/2021. Política, p. A10

 

“Exército estará sempre dentro das quatro linhas da Constituição”

Matheus Schuch

Fabio Murakawa

20/04/2021

 

 

Após provocar uma crise militar com a demissão do ministro da Defesa e dos comandantes das Forças Armadas, o presidente Jair Bolsonaro disse ontem que continuará a jogar “dentro das quatro linhas da Constituição”. Em cerimônia alusiva ao Dia do Exército, o presidente também afirmou considerar a instituição como responsável por dar “sustentação para que ninguém no país tente ir além do que a lei permite”. “Hoje é uma data que orgulha a todos nós porque aniversaria aquele que nos dará a sustentação para que ninguém ouse ir além da nossa Constituição”, afirmou o presidente.

Nos discursos que faz sobre as Forças Armadas, Bolsonaro costuma frisar seu entendimento de que os militares precisam estar alinhados aos interesses do povo, e usa esta suposta conexão com os anseios da sociedade para justificar o golpe militar de 1964. Ontem, entretanto, citou um ministro militar de um governo democrático e voltou a garantir, ontem, que não irá ferir a Constituição. “Não existe quem não se identifique com o meu, o seu, o nosso Exército brasileiro. Como dizia o general Leônidas Pires Gonçalves [ministro do Exército no governo Sarney, 1921-2015], o povo nos dá o norte”.

“A nossa democracia e a nossa liberdade não têm preço. Os deveres são constitucionais, mas nós jogamos e sempre jogaremos dentro das quatro linhas da nossa Constituição. Essa é a certeza e tranquilidade que nosso povo pode ter com nosso Exército brasileiro: nós estaremos dentro dessas quatro linhas”, acrescentou.

Hoje, Bolsonaro acompanhará a transmissão de cargo do atual comandante do Exército, general Edson Leal Pujol, ao seu substituto, o general Paulo Sérgio Nogueira de Oliveira. O descontentamento do presidente com a atuação do então ministro da Defesa, general Fernando Azevedo e Silva, passou diretamente por sua insistência em manter Pujol no posto. Bolsonaro defendia a substituição sob o argumento de que o comandante precisa dar demonstrações de apoio e alinhamento político ao governo.

Pujol antecedeu o presidente, ontem, nos discursos e defendeu que a corporação deve permanecer devota aos preceitos constitucionais. “Na fiel observância dos preceitos constitucionais, regidos pelos princípios da ética, da probidade, da legalidade, da transparência e da imparcialidade, conectado no tempo e no espaço, e aos genuínos anseios do povo brasileiro, o Exército sempre se fará presente, moderno, dotado de meios adequados e profissionais altamente preparados, forjando capacidades militares que superem os desafios do século 21 e possam respaldar as decisões soberanas do nosso Brasil”, sustentou.

Na contramão do presidente, que desde o início da pandemia diminui a gravidade do vírus, Pujol repetiu que a crise sanitária é “o maior desafio” da atual geração. A postura rigorosa do general no tema também incomodava o presidente.

A cerimônia de posse no Exército será a última a oficializar as mudanças impostas por Bolsonaro. Já assumiram o posto o ministro da Defesa, general Braga Netto; e os comandantes da Marinha, almirante Almir Garnier Santos; e da Aeronáutica, tenente-brigadeiro Baptista Júnior.