Título: Aborto: OAB critica ministério
Autor: Luiz Orlando Carneiro
Fonte: Jornal do Brasil, 14/03/2005, País, p. A6

O Conselho Federal da Ordem dos Advogados do Brasil define, na reunião mensal marcada para hoje, a posição da instituição sobre a ''norma técnica'' do Ministério da Saúde que vai autorizar os médicos do Sistema Único de Saúde (SUS) a realizar aborto em mulheres cuja gravidez seja resultante de estupro, sem a exigência do boletim de ocorrência policial (BO). O criminalista e conselheiro da OAB pernambucana, Adhemar Rigueira, foi designado relator do caso pelo presidente da entidade, Roberto Busato, e já adiantou a sua opinião: ''A medida é uma porta aberta para a indústria do aborto''.

Ainda segundo Rigueira, o médico responsável pela ''interrupção da gravidez'' vai ficar ''exposto e poderá ser processado criminalmente, com base no artigo 126 do Código Penal'', que prevê pena de reclusão de um a quatro anos para quem ''provocar aborto com o consentimento da gestante''.

- Sem o BO - explica o conselheiro da OAB - o médico não vai ter em mãos qualquer instrumento garantindo que a solicitante do aborto foi realmente vítima de estupro. Ele fica sem um documento para se defender em eventual ação judicial.

O artigo 128 do CP dispõe que ''não se pune o aborto praticado por médico se não há outro meio de salvar a vida da gestante; se a gravidez resulta de estupro e o aborto é precedido de consentimento da gestante ou, quando incapaz, de seu representante legal''.

O diretor-adjunto do Departamento de Ações Programáticas do Ministério da Saúde, Adson França, defende a norma a ser publicada na próxima semana porque o CP, ao definir as situações em que o aborto é permitido, não exige a apresentação de nenhum documento. E argumenta que há casos em que a mulher grávida em conseqüência de estupro, muitas vezes, é ameaçada até de morte se der queixa na polícia.

O presidente da seccional da OAB da Bahia, Dinailton Oliveira, que chegou a Brasília para a reunião de hoje, também adiantou o seu voto. Para ele, o Ministério da Saúde só pode ''alterar as regras do jogo'' obtendo do Legislativo uma modificação da norma vigente.

- Faz parte da democracia o Executivo dirigir-se ao Legislativo para tentar mudar as leis do país - acrescentou o conselheiro baiano. Ao contrário do que o presidente Luiz Inácio Lula da Silva pregou na campanha eleitoral, seu governo tem preferido usar o expediente de ''medidas provisórias'', sem submetê-las ao Congresso.

Na semana passada, o presidente do Supremo Tribunal federal, ministro Nelson Jobim, chamara a atenção para o fato de que decisões do Conselho Nacional de Saúde não têm validade de normas jurídicas e que - mesmo no caso do aborto não criminalizado pelo Código Penal - tais resoluções não garantem impunidade a quem provoca ou pratica o aborto.