O Estado de São Paulo, n. 46494, 02/02/2021. Política, p. A8

Em 1º ato, Lira revoga decisão de Maia
Gabriela Bilo
02/02/2021



Logo após ser eleito presidente da Câmara, deputado dissolve bloco de Baleia Rossi e adia definição de cargos para a Mesa Diretora

O primeiro ato de Arthur Lira (Progressistas-AL) como presidente eleito da Câmara desagradou a dez partidos, todos de oposição à sua candidatura. Ele anulou uma decisão tomada horas antes por seu antecessor, Rodrigo Maia (DEM-RJ), e, com isso, tenta esvaziar ainda mais poder desse grupo na Casa. Além de eleger o presidente, os deputados iriam definir a composição da chamada Mesa Diretora, grupo formado por outros seis parlamentares – sem contar os suplentes – que participam das decisões de comando do Legislativo.

Na prática, Lira desfez o bloco de apoio a Baleia Rossi (MDBSP), formado por dez siglas que somam 211 deputados. O ato de Lira ocorre após Maia aceitar a inclusão do PT no grupo mesmo após o fim do prazo, que se encerrou às 12h desta segunda-feira. O partido alegou problemas técnicos do sistema de registro. A decisão do agora ex-presidente da Câmara gerou protestos do deputado do Progressistas, que chegou a bater boca com Maia durante reunião mais cedo e ameaçou judicializar a questão, mas depois recuou.

A formação dos blocos é importante porque é com base no tamanho de cada um que é definida a distribuição dos demais cargos na Mesa Diretora. Pelos blocos autorizados por Maia, o PL, aliado de Lira, ficaria com a primeira vice-presidência, que deveria ficar com o deputado Marcelo Ramos (AM).

Caberia ao PT, dono da maior bancada na Casa, com 54 deputados, a Primeira-secretaria, responsável por gerir contratos e autorizar obras. O partido já havia indicado a deputada Marília Arraes (PE) para a função.

Agora, um novo cálculo será feito levando em conta apenas a composição dos blocos registrados até as 12h de hoje. Assim, PT e Solidariedade, por exemplo, não serão considerados e, consequentemente, haverá uma redistribuição dos cargos.

O PCDOB, que está no bloco de Baleia, já anunciou que pretende recorrer da decisão de Lira. "A ditadura começou. É o retorno de Eduardo Cunha (ex-líder do Centrão que presidiu a Câmara até 2016). Lira encerrou a sessão sem apurar os cargos e não há previsão regimental para isso. Sequer abriu os microfones para líderes contestarem", disse a líder da sigla, Perpétua Almeida (PCDOB-AC).

Discursos. Os novos presidentes da Câmara e do Senado pautaram os discursos após a vitória nas votações na defesa de reformas e medidas emergenciais para o enfrentamento da pandemia de covid-19. Apoiados pelo Palácio do Planalto, que atuou fortemente para a eleição de Lira e Rodrigo Pacheco (DEM-MG), os dois trataram também da autonomia ou fortalecimento do Congresso. Numa disputa que acirrou o ambiente do Parlamento, houve acenos à conciliação.

Pacheco, que vai comandar o Senado nos próximos dois anos, prometeu agir com independência em relação ao governo federal. "Comprometo-me a ouvir todas as forças políticas", disse após o anúncio do resultado. "Ao Poder Executivo, dedicaremos parte significativa de nossos vigores, fiscalizando, deliberando suas proposições, dialogando para construir o futuro da Nação. Porém, dele exigiremos respeito aos compromissos assumidos e à independência deste Poder Legislativo."

Minutos depois de declarado eleito para a presidência da Câmara, Lira disse que vai buscar "pontos mínimos" de convergência com os demais poderes para ajudar o povo a superar os traumas da pandemia. De pé ao lado da cadeira de presidente da Casa, o deputado de Alagoas disse que não há trono no plenário. "Não me confundo com essa cadeira e jamais irei me confundir", afirmou. "A cadeira é giratória para que seu ocupante seja capaz de olhar para o centro, para a direita e para a esquerda."

Líder do Centrão e com apoio explícito do presidente Jair Bolsonaro, Lira foi eleito com 302 votos, após uma disputa marcada por traições, recuos e denúncias de compra de votos. A escolha de Lira representa a vitória do grupo de partidos conhecido pela prática do "toma lá, dá cá", e um novo capítulo para a gestão Bolsonaro, que aposta em uma agenda mais conservadora para conquistar novo mandato.

Lira usou seu discurso inaugural para defender ampla vacinação contra a covid-19. O presidente Jair Bolsonaro já levantou dúvidas quanto à vacinação e faz questão de frisar que ela não é obrigatória. A conduta do Ministério da Saúde é alvo de investigação pelo Ministério Público Federal.

"Temos que fortalecer a rede de proteção social. Temos que vacinar, vacinar e vacinar o nosso povo. Temos buscar equilíbrio de contas publicas e dialogara com mercado e sociedade de forma transparente", disse Lira.