Valor Econômico, n. 5229, 15/04/2021. Política, p. A9

 

STF decidirá em plenário se mantém elegibilidade de Lula
Isadora Peron
Luísa Martins
Bárbara Pombo
15/04/2021

 

 

 

Por maioria, o Supremo Tribunal Federal (STF) definiu que a decisão do ministro Edson Fachin, que anulou as condenações impostas ao ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva pela 13ª Vara Federal de Curitiba, será analisada pelo plenário. O julgamento vai ser retomado hoje.

Ontem, parte dos ministros afirmou que o caso deveria ser julgado pela Segunda Turma, colegiado que reúne apenas cinco dos 11 ministros. O debate deu-se em torno de um recurso apresentado pela defesa do petista.

Fachin defendeu a sua prerrogativa de enviar o caso para o plenário. Ele apontou que há precedentes na Corte, que já afirmou ser atribuição discricionária do relator a afetação de feitos para julgamento pelo colegiado maior.

A posição de Fachin foi seguida pelos ministros Kassio Nunes Marques, Alexandre de Moraes, Luís Roberto Barroso, Rosa Weber, Dias Toffoli, Cármen Lúcia, Gilmar Mendes e Luiz Fux. Ficaram vencidos Ricardo Lewandowski e Marco Aurélio Mello.

Coube a Lewandowski fazer a defesa mais enfática de que o caso deveria ser analisado pela Segunda Turma. Para ele, a decisão só foi afetada ao plenário porque envolve o petista. “Por que justamente no caso do ex-presidente? Será que o processo tem nome e não capa? A última vez em que se fez, isso custou ao ex-presidente 580 dias de prisão, e causou a impossibilidade de se candidatar a presidente da República”, disse sobre o julgamento do habeas corpus que levou Lula à cadeia em 2018.

Lewandowski disse ainda que a Segunda Turma julga “milhares” de habeas corpus todos os anos, mas que “toda vez que se trata do ex-presidente, o caso muda de questão”. “Manifesto minha perplexidade de se pinçar um determinado paciente, tirá-lo da Segunda Turma e trazê-lo ao plenário.”

Para o ministro, se em 2018 o STF tivesse julgado primeiro as ações que questionavam a prisão após a condenação em segunda instância e não o habeas corpus de Lula, “a história do Brasil poderia ter sido diferente”. O ex-presidente foi preso em abril daquele ano e foi impedido de disputar as eleições presidenciais. “Foi uma opção que esse Supremo fez e que teve consequências muito sérias”, disse.

Barroso rebateu o colega. Para ele, o regimento interno é “claríssimo” ao afirmar que essa é uma decisão discricionária do relator. “Há uma informação factualmente equivocada, de que a afetação desse caso constitua um ponto fora da curva.”

Cármen Lúcia, por sua vez, defendeu a prerrogativa do relator de decidir onde o caso será julgado, mas disse entender que o plenário não pode rever uma decisão já tomada pelas turmas, aspecto que também foi levantado por Gilmar Mendes. Um dos pontos que o plenário terá que enfrentar é se o habeas corpus em que os advogados de Lula alegavam a parcialidade do ex-juiz Sergio Moro perdeu o objeto, como determinou Fachin em sua decisão.

Hoje, o julgamento deve começar com os ministros se manifestando sobre o recurso da Procuradoria-Geral da República (PGR). O órgão argumentou que os processos do ex-presidente devem continuar tramitando na 13ª Vara Federal de Curitiba.

Na decisão, tomada em 8 de março, Fachin afirmou que a Justiça Federal paranaense não tinha competência para julgar quatro processos abertos contra o petista - o do tríplex do Guarujá, o do sítio de Atibaia, e duas ações sobre o Instituto Lula.

O ministro determinou, então, que os casos fossem enviados à Justiça Federal de Brasília. Em entrevista ao Valor, publicada ontem, Fachin disse que, caso o plenário não chancele o seu entendimento sobre Lula, isso poderá ter impacto em outros processos da Lava-Jato. Com a decisão de março, Lula voltou a ser elegível, não estando mais enquadrado na Lei da Ficha Limpa.

A decisão de permitir que o plenário do STF bata o martelo sobre o foro adequado para o julgamento das acusações contra Lula é questionada por advogados. Para Davi Tangerino, o entendimento da Corte dá grande poder ao relator, que pode escolher se um caso deve ser julgado no plenário - com 11 ministros - ou na turma - que conta com 5 ministros.

“O regimento interno do STF autoriza a remessa ao plenário de casos que não foram julgados. Se já houve decisão na turma o recurso deve ser analisado pela turma”, diz o professor da Universidade do Estado do Rio de Janeiro (UERJ). De acordo com Tangerino, a competência da 2ª Turma prevaleceria porque o caso Lula estava submetido ao órgão fracionário quando o ministro Fachin, individualmente, anulou as condenações contra Lula.

O criminalista Marcelo Feller considera improvável que a Corte detalhe o alcance do reconhecimento da incompetência da 13ª Vara Federal de Curitiba, ou seja, que discrimine quais provas podem ou não ser aproveitadas. É mais provável, diz, que essa análise fique por conta do juízo que for indicado pelo STF como o correto para julgar os casos de Lula.