Valor Econômico, n. 5224, 08/04/2021, Brasil

 

FMI recomenda que Brasil preserve teto de gastos
Lucas de Vitta
Sergio Lamucci 
08/04/2021

 

 

 

O Brasil deve manter uma política fiscal ágil e flexível para apoiar aqueles que precisam de ajuda, mas é fundamental respeitar o teto de gastos, disse ontem o diretor de Assuntos Fiscais do Fundo Monetário Internacional (FMI), Vitor Gaspar.

Em entrevista para comentar o relatório Monitor Fiscal, Gaspar foi questionado sobre o avanço da pandemia no Brasil e sobre as medidas que o governo federal pode adotar para proteger a economia dos efeitos econômicos causados pela covid-19. Gaspar afirmou que os programas implementados em 2020 foram bem-sucedidos em apoiar os mais vulneráveis e a atividade econômica. Ele observou que a dinâmica da covid-19 no passado recente no Brasil foi desfavorável, com forte aumento do número de casos e de mortes. Nesse cenário, é importante uma política fiscal ágil e transparente para dar apoio a que necessita, apontou Gaspar.

O diretor do FMI também apontou os avanços macroeconômicos que o país obteve nos últimos 20 anos, como a adoção de metas de inflação e a independência do Banco Central. No caso das instituições ficais, porém, há um trabalho ainda em curso, segundo ele. “ É extremamente importante que o Brasil continue perseverando nessa direção”, afirmou Gaspar. “Neste momento, um dos pilares importantes da estrutura fiscal do Brasil é o teto de gastos. Ele deve ser considerado uma âncora a ser valorizada e preservada, mesmo em circunstâncias extremamente exigentes”, disse.

No Monitor Fiscal, o FMI elevou a estimativa para a dívida pública brasileira em 2021. Em janeiro, a previsão era que o endividamento bruto atingiria 92,1% do PIB neste ano; agora, a previsão é de que o indicador ficará em 98,4% do PIB. Pela projeção do FMI, o Brasil vai terminar 2021 com o terceiro maior nível de endividamento de um grupo de 38 países emergentes e de renda média, atrás apenas dos 110,7% do PIB de Angola e dos 105,4% do Sri Lanka. A média da dívida dos emergentes deve ficar em 65,1% do PIB em 2021.

Nas estimativas do FMI, o endividamento bruto do Brasil neste ano ficará um pouco abaixo dos 98,9% do PIB registrados em 2020, mas voltará a subir em 2022, para 98,8% do PIB. Para os próximos anos, o FMI espera uma alta moderada, atingindo 101,7% do PIB em 2026 - a previsão mais distante que aparece no Monitor Fiscal. A dívida bruta é um dos principais indicadores de solvência das contas públicas acompanhados por analistas.

O FMI utiliza um critério diferente do das autoridades brasileiras para calcular a dívida bruta. Enquanto o Fundo considera na estimativa os títulos do Tesouro na carteira do Banco Central (BC), a autoridade monetária do país os exclui. Pelo critério brasileiro, o endividamento bruto do país encerrou 2020 em 89,3% do PIB.

O relatório não explica os motivos para o aumento das estimativas para a dívida bruta brasileira em 2021. O crescimento não tem influência no aumento da projeção do endividamento como proporção do PIB deste ano, uma vez que o FMI promoveu inclusive uma pequena alta na sua previsão para a expansão da economia em 2021, de 3,6% para 3,7% Já a estimativa para o déficit nominal (que inclui gastos com juros) subiu de 5,9% do PIB em janeiro para 8,3% do PIB agora.

Quanto ao resultado primário, que exclui despesas com juros, o FMI espera que ele volte ao azul apenas em 2026, quando haveria um superávit de 0,3% do PIB. O Fundo projeta um déficit primário de 3,7% do PIB neste ano. Desde 2014, esse indicador está no vermelho.