O Globo, n. 32038, 25/04/2021, País, p. 17

 

Investigações derrubam secretários de Saúde
João Paulo Saconi
25/04/2021

 

 

 

A exemplo do Ministério da Saúde, por onde já passaram quatro titulares desde o início da pandemia, as secretarias estaduais responsáveis pela área também têm lidado coma instabilidade no curso da crise sanitária. Levantamento do GLOBO com base em diários oficiais mostra que em dez das 27 unidades da federação já houve pelo menos uma troca desde março de 2020. Ao todo, foram 16 mudanças ao longo de 13 meses — cinco secretários tiveram a prisão pedida pelo Ministério Público (MP) por motivos relacionados à pandemia, e quatro deles foram presos, deixando seus cargos.

No Rio, houve quatro trocas. No início da crise, o secretário era o anestesista Edmar Santos, que ficou um mês preso, investigado por suspeita de fraudes em contratos emergenciais para comprar, sem licitação, respiradores, oxímetros eleitos privados. Os desvios, confirmados por Edmar em delação premiada, motivaram o afastamento do governador Wilson Witzel (PSC). Substituto de Edmar, o médico Fernando Ferry ficou pouco mais de um mês no cargo. Já fora da pasta, ele foi alvo de uma operação de busca e apreensão da Polícia Federal, que apura suspeita de fraudes na compra de Equipamentos de Proteção Individual para o hospital universitário no qual ele é superintendente. Depois dele, esteve na pasta o coronel médico do Corpo de Bombeiros Alex Bousquet.

Após a saída de Witzel, o governador em exercício Cláudio Castro (PSC) nomeou, em outubro, o atual secretário, o pneumologista Carlos Alberto Chaves. Há duas semanas, Castro criou um comitê científico para informá-lo sobre a pandemia. Chaves disse não ter sido informado sobre o grupo, que inclui profissionais favoráveis a remédios sem eficácia comprovada contra aC ov id -19 e contrários ao isolamento social. Castro desmentiu o secretário. Com uma reforma do secretariado no horizonte, a permanência de Chaves se tornou incerta. Caso um quinto nome seja nomeado, o Ri ovai ultrapassar o número do governo federal —Luiz Henrique Mandetta, Nelson Teich e Eduardo Pazuello, um dos alvos da CPI da Covid, já foram ministros da Saúde, cargo agora ocupado por Marcelo Queiroga. Presidente do Conselho Nacional de Secretários de Saúde (Conass), Carlos Eduardo Lula, secretário do Maranhão, avalia que o tempo da Saúde e o da política são diferentes:

— Muitas vezes, governadores querem resultados a curto prazo, o que os secretários não podem entregar dada a natureza do trabalho. Além disso, a falta de autonomia e a pressão política são fatores de instabilidade, que aumentou com apressão que recaiu sobre os governadores. No Amazonas, onde hospitais colapsaram por falta de vagas e de oxigênio, as duas trocas na Secretaria de Saúde estiveram relacionadas a gestores que acabaram presos. O doutor em Saúde Pública pela Fiocruz Rodrigo Tobias comandou a pasta até abril do ano passado, quando foi substituído pela biomédica Simone Papaiz. Ambos foram presos na Operação Sangria, deflagrada pela PF para investigar desvios de recursos na compra de respiradores. Oche feda pasta no Amazonashojeé Marcel lus Cam pêlo, denunciado no início do mês, junto a Pazuello, por improbidade administrativa. O Ministério Público Federal os acusa de omissão durante a falta de fornecimento de oxigênio ao estado e no aumento do número de mortes por Covid-19. Na avaliação da professora Ana Maria Malik, coordenadora da FGV Saúde, o impacto das trocas depende da continuidade das políticas públicas para a Saúde:

— No governo federal, por exemplo, os trabalhos ficaram entrecortados. É uma forma de gestão muito fulanizada, ao sabor de quem está no cargo.

FURA FILA DA VACINA

Assim como no Amazonas, Distrito Federal, Roraima e Santa Catarina trocaram de secretários de Saúde duas vezes na pandemia. Em Santa Catarina, o governador Carlos Moisés (PSL) está afastado pela segunda vez por supostas irregularidades na compra de respiradores, caso que custou também o cargo de secretário de Saúde Helton Zeferino. No início do mês, Carmen Zanotto assumiu o cargo, em substituição a André Motta Ribeiro. Já os governos de São Paulo, Minas Gerais, Pará, Amapá e Sergipe fizeram uma troca cada — em Minas, Carlos Eduardo Amaral foi exonerado após a denúncia de que ele e outros servidores da secretaria furaram a fila de vacinação contra a Covid-19. O caso está sendo apurado em uma CPI na Assembleia Legislativa.