O Globo, n. 32037, 24/04/2021, País, p. 4

 

Fogo amigo
Adriana Mendes
Daniel Gullino
Julia Lindner
Jussara Soares
24/04/2021

 

 

 

Declarações de Fabio Wajngarten, ex-secretário de Comunicação da Presidência, de que o Brasil foi incompetente e ineficiente por não comprar antes as vacinas da P fizer deixamo ex ministro da Saúde Eduardo Pazuello sob mais pressão na CPI da Covid. Membros da comissão sugerem acareação entre os dois.

As declarações de Fabio Wajngarten, ex-secretário de Comunicação da Presidência, de que o Brasil não comprou antes vacinas da Pfizer por "incompetência" e "ineficiência", reforçaram nos integrantes da CPI da Covid a intenção de chamálo a depor. Parlamentares já sugerem até uma acareação dele com o ex-ministro da Saúde Eduardo Pazuello, que foi elogiado ontem pelo presidente Jair Bolsonaro em Manaus (AM) e deve ser nomeado em breve para um cargo no Palácio do Planalto. Senadores ouvidos pelo GLOBO consideraram "graves" as informações trazidas por Wanjgarten em entrevista à revista "Veja". O ex-secretário revelou reuniões que teve sobre a aquisição de imunizantes da Pfizer durante o ano passado, fez críticas à equipe comandada por Pazuello, mas poupou o presidente Jair Bolsonaro. Autor do requerimento de criação da CPI da Covid, o senador Randolfe Rodrigues (Rede-AP) pedirá a convocação de Wanjgarten. Ele destaca que o ex-secretário diz ter e-mails, registros telefônicos, cópias de minutas do contrato, dentre outras provas para confirmar sua afirmação. Randolfe disse que "ele (Wajngarten) tirou o pino da granada e tem que ver onde vai lançá-la".

— O ministro Pazuello vai ter que resolver se contará toda a verdade ou se essa granada vai estourar só nele. Por isso é importante os depoimentos de Pazuello, de Fábio Wajngarten e, se necessário, uma acareação de ambos —disse Randolfe. O futuro presidente da CPI, senador Omar Aziz (PSD-AM), afirmou que as acusações feitas pelo ex-secretário são "muito sérias". Segundo ele, as razões de o governo não ter comprado antecipadamente as vacinas da Pfizer no ano passado é um dos pontos a serem abordados na CPI.

— Ele (Wajngarten) agora faz acusações muito sérias. Mas não vou fazer nenhuma observação de prejulgar alguém antes que a gente comece a CPI. Até porque é a palavra dele, e se ele fala isso deve ter provas. Vamos ouvir muita gente, e se ele tiver que ser ouvido será ouvido também, não tenho dúvida.

TÉCNICA DE BLINDAGEM

Para o senador Humberto Costa (PT-PE), a entrevista de Wajngarten tem objetivo de "blindar" o presidente Jair Bolsonaro quanto à responsabilidade dele em uma série de "decisões trágicas" tomadas pelo governo. De acordo com a minuta do plano de trabalho da CPI da Covid, antecipada pelo GLOBO no início desta semana, estão previstos depoimentos de pelo menos 15 integrantes do governo Bolsonaro que ocuparam postos de comando na pandemia de Covid-19, entre eles Wajngarten. A CPI será instalada na próxima terça-feira. Em paralelo, Bolsonaro deu ontem novas provas de que não pretende repassar culpa a Pazuello. Em evento em Manaus para a inauguração de um centro de convenções, o presidente elogiou o ex-ministro e o recebeu com um abraço no palco. Uma das investigações em andamento contra Pazuello é justamente sobre o caos sanitário registrado no Amazonas em janeiro, quando dezenas de pessoas chegaram a morrer por falta de oxigênio hospitalar. Bolsonaro afirmou que "ninguém esperava que fosse acontecer" uma situação como aquela, elogiou o ex-ministro, e disse que o sucessor, Marcelo Queiroga, "dá prosseguimento ao seu trabalho". — Conseguimos, com a equipe que nós temos em Brasília, colaborar em muito para que os danos dessa pandemia fossem diminuídos. Em especial, pelo ministro da Saúde que tive até há pouco tempo, o senhor Pazuello. Aqui presente, o ministro (Marcelo) Queiroga, da Saúde, que dá prosseguimento ao seu trabalho.

CARGO NO PALÁCIO

General da ativa, Pazuello foi transferido ontem da 12ª Região Militar, sediada em Manaus, para a SecretariaGeral do Exército, em Brasília. Mas em breve o ex-ministro deve ser nomeado para um cargo no Palácio do Planalto. A tendência é que ele receba um posto na Secretaria-Geral da Presidência, chefiada pelo ministro Onyx Lorenzoni. O mais provável é que ele comande a Secretaria Especial de Modernização de Estado, como O GLOBO mostrou na semana passada.

A nomeação de Pazuello enfrenta resistência de parte dos auxiliares de Bolsonaro. Inicialmente, foi cogitado dar ao ex-ministro um cargo de assessor do presidente. Mas Bolsonaro foi desaconselhado a fazer isso, porque estaria colocando um dos principais alvos CPI da Covid dentro do próprio gabinete. Bolsonaro, no entanto, tem dito que gosta de Pazuello e que não gostaria de deixá-lo sem função, por considerar que ele cumpriu uma "missão" no Ministério da Saúde. Além disso, o presidente considera essencial que Pazuello fique por perto durante o desenrolar da CPI, na qual ele será chamado para prestar esclarecimentos. A solução, então, foi costurada com Onyx Lorenzoni, que deve abrir espaço para abrigá-lo em sua pasta. Pazuello despachará do Planalto, onde vem circulando diariamente mesmo sem novo cargo.