O Estado de São Paulo, n. 46483, 22/01/2021. Metrópole, p. A8

 

Após impasse, Índia libera envio de 2 milhões de doses de vacina de Oxford

Felipe Frazão

22/01/2021

 

 

"Sim, as vacinas estão chegando', disse ao 'Estadão' o embaixador da Índia em Brasília. Suresh Reddy; após uma semana de atraso, embarque de remessas para o Brasil está previsto para hoje. Produção local de imunizante pela Fiocruz será possível só no 2º semestre    

O governo da Índia liberou a exportação comercial de vacinas contra a covid-19. As primeiras remessas de doses serão enviadas ao Brasil e ao Marrocos hoje, segundo disse o secretário de Relações Exteriores do país asiático à agência Reuters. O embaixador da Índia em Brasília, Suresh Reddy, confirmou que serão enviadas duas milhões de doses do imunizante da Universidade de Oxford e da farmacêutica AstraZeneca. "Sim, as vacinas estão chegando como prometido", disse Suresh Reddy ao Estadão.

As doses foram fabricadas no Instituto Serum da Índia, o maior produtor de vacinas do mundo e que recebe pedidos de diversos continentes. A remessa era esperada para o último dia 17, e atrasou uma semana.

O governo indiano tem usado o fornecimento de vacinas de forma diplomática, para reforçar sua presença na Ásia, e a relação com países vizinhos que foram priorizados e já começaram a receber as remessas. Além das doses, a Índia dá ao Brasil um treinamento em administração da vacina.

Segundo o embaixador indiano, o cronograma de entrega foi combinado com o Itamaraty e as doses devem chegar em breve ao País. "Valorizamos nossa parceria com o Brasil e naturalmente esse pedido foi priorizado", disse. O Brasil foi um dos primeiros países a receberem o aval de exportação, atrás apenas de países asiáticos, africanos e do Oriente Médio, sobre os quais a Índia deseja ampliar sua influência. Por isso, diplomatas do primeiro escalão da Índia têm viajado para fazer a entrega dos lotes pessoalmente.

Outros beneficiados são Bangladesh, Butão, Maldivas, Mongólia, Mianmar, Nepal, Bahrein, Ilhas Maurício, Marrocos, Omã, Ilhas Seychelles e Sri Lanka. Parte desses países em desenvolvimento recebeu as doses como doação, em uma ofensiva diplomática do primeiro-ministro indiano, Narendra Modi.

Ontem, um incêndio matou cinco trabalhadores no Serum. A direção do instituto disse que não houve perda de doses. A unidade atingida pelo fogo faz parte de um projeto de expansão das instalações.

Em nota, o Ministério da Saúde confirmou que as doses devem chegar hoje, no fim da tarde. "A carga vinda da Índia será transportada em voo comercial da companhia Emirates ao Aeroporto de Guarulhos e, após os trâmites alfandegários, seguirá em aeronave da Azul para o Aeroporto Internacional Tom Jobim, no Rio." Não disse, porém, como e quando será a distribuição de doses pelo País.

O presidente Jair Bolsonaro, nas redes sociais, agradeceu ao chanceler Ernesto Araújo e ao Itamaraty pelo feito. Bolsonaro disse ontem também que agora há "sede pela vacina" e que o governo "está fazendo o possível". Pelo Twitter, Filipe Martins, assessor especial para assuntos internacionais do governo, culpou a divulgação feita pela imprensa pela demora do envio das doses da Índia ao Brasil.

A Fiocruz será a responsável pela produção da vacina de Oxford no País, mas depende de insumos vindos da China. A fundação adiou para março a entrega das primeiras doses de produção loca. A Argentina também tem uma fábrica capaz de produzir doses do imunizante de Oxford e já enviou insumos para o México. Mas o contrato com a AstraZeneca prevê que a fábrica argentina abasteça só os outros países da América Latina, com exceção do Brasil.

Por causa da alta demanda de IFA (Insumo Farmacêutico Ativo) necessário para abastecer o Brasil (100 milhões de doses inicialmente), ficou acertado que os principais ingredientes seriam produzidos na fábrica da China, cuja capacidade é bem maior do que a da Argentina. O contrato prevê também a transferência de tecnologia para que a Fiocruz passe a produzir em solo nacional todos os insumos a partir do 2.º semestre.

China. A Coronavac também depende de articulação diplomática – a liberação do envio de insumos pela China. Como o Estadão mostrou, o governo tem isolado Araújo nas negociações com Pequim. O Butantan já afirmou ter praticamente esgotado a quantidade de insumos para fabricar a Coronavac. O órgão distribuiu o 1.º lote, com 6 milhões de doses, para começar a imunização no País. Além disso, tem condições de entregar mais 4,8 milhões de unidades. Depois, depende da matéria-prima chinesa para garantir novas remessas. / COLABORARAM ROBERTA JANSEN e EMILLY BEHNKE, COM REUTERS