O Globo, n. 32034, 21/04/2021, Mundo, p. 23

 

Câmara sob pressão para votar acordo ambiental
Eliane Oliveira
21/04/2021

 

 

 

Representantes do setor de refrigeração e entidades de defesa do consumidor e do meio ambiente entregam amanhã, Dia da Terra, um manifesto com mais de 1.200 assinaturas ao presidente da Câmara, Arthur Lira (Progressistas-AL), para que seja posta em votação a ratificação da Emenda de Kigali. Adendo ao Protocolo de Montreal, a ratificação permitirá que os fabricantes nacionais de arcondicionado, ventiladores e geladeiras tenham acesso a cerca de US$ 100 milhões de um fundo multilateral para produzir equipamentos mais eficientes e menos poluentes. A informação foi antecipada pelo colunista do GLOBO Merval Pereira.

O Protocolo de Montreal é um tratado internacional de 1987 para a redução da emissão de substâncias que provocam a erosão da camada de ozônio, que protege os seres vi-vos dos raios ultravioleta emitidos pelo Sol. A Emenda de Kigali, assinada por 119 países, incluindo o Brasil, foi aprovada em 2016, na capital de Ruanda. A emenda prevê a redução gradual do uso dos gases conhecidos como hidrofluorocarbonetos (HFC) nos aparelhos de refrigeração. Os HFC foram usados para substituir as substâncias que afetavam a camada de ozônio, mas depois se verificou que eles são causadores do efeito estufa, que provoca o aquecimento climático. Na Câmara, o texto já passou por todas as comissões e está parado na presidência da Casa há um ano e meio.

PERDA DE COMPETITIVIDADE

Os signatários do manifesto argumentam que investimentos são fundamentais às mudanças necessárias para a produção mais limpa. Eles dizem que, se o Congresso não ratificar a emenda, o Brasil perde competitividade, e o mercado consumidor brasileiro corre o risco de se consolidar como destino de produtos obsoletos e de alto consumo de energia.

“Essa modernização permitiria que a indústria brasileira ficasse alinhada às inovações já presentes em mercados como o americano, o europeu, o chinês e o indiano”, diz o manifesto a ser entregue a Lira. Na sexta-feira, o presidente Xi Jinping anunciou que a China vai ratificar a Emenda, e o americano Joe Biden já pediu ao Senado que a ratifique.

O presidente da Comissão de Relações Exteriores da Câmara, Aécio Neves (PSDBMG), defendeu ontem a celeridade na tramitação.

— O Brasil estará dando uma sinalização importante a mundo de que estamos comprometidos com a preservação do meio ambiente.

Segundo o coordenador da Frente Parlamentar Ambientalista, deputado Rodrigo Agostinho (PSB-SP), a aprovação da emenda deve melhorar a relação com os EUA.

— A ratificação da Emenda de Kigali vai alinhar a indústria brasileira às tendências do mercado internacional e pode aumentar a competitividade do Brasil no cenário internacional. O país dará uma sinalização aos investidores estrangeiros do seu compromisso com uma economia de baixo carbono e inovação tecnológica —destacou o parlamentar.

Apesar da pressão sobre Lira, o projeto de decreto legislativo com a Emenda de Kigali não está na agenda da presidência da Câmara.

—Nossa expectativa é que a Câmara vote “sim” para marcar o Dia Mundial da Terra, que propõe uma reflexão sobre a importância do planeta, sinalizando o compromisso do Brasil com a agenda mundial de sustentabilidade —disse Clauber Leite, coordenador de Energia e Sustentabilidade do Instituto Brasileiro de Defesa do Consumidor (Idec).

ECONOMIA DE R$ 57 BI

O manifesto também é assinado, além do Idec, por entidades como a Associação Brasileira de Refrigeração, Ar-Condicionado, Ventilação e Aquecimento (Abrava), Associação Nacional de Fabricantes de Produtos Eletroeletrônicos (Eletros), Centro Brasil no Clima, Climate Policy Initiative, Instituto Ethos, entre outras.

Segundo o presidente da Abrava, Arnaldo Basile, nos úl-timos 20 anos a entidade tem tomado medidas para mitigar os efeitos danosos dos gases de refrigeração. Isso inclui a eliminação progressiva do uso dos HFCs. A estimativa é que aparelhos eficientes resultariam em economia de R$ 57 bilhões até 2035: R$ 30 bilhões deixariam de ser gastos na geração de energia elétrica e outros R$ 27 bilhões, pelos consumidores na conta de luz.