O Globo, n. 32019, 06/04/2021, Sociedade, p. 9

 

Na Câmara, ministros defendem a educação domiciliar
Paula Ferreira
06/04/2021

 

 

 

Em sessão na Câmara dos Deputados, ontem, o ministro da Educação, Milton Ribeiro, e a ministra da Mulher, Família e Direitos Humanos, Damares Alves, defenderam a regulamentação do ensino domiciliar no país. Para eles, é uma questão de “liberdade” das famílias optar pela educação em casa.

No começo de fevereiro, o presidente Jair Bolsonaro enviou ao Congresso a lista de suas prioridades para 2021; entre elas, a única pauta da área da educação citada foi a regulamentação do homeschooling.

A prática, segundo estimativa da Associação Nacional de Ensino Domiciliar (Aned), tem cerca 18 mil alunos no país, o que corresponde a apenas 0,04% do total de estudantes brasileiros no ensino regular.

— Estamos dando à família uma opção, uma liberdade de escolha daquilo que ela julga ser melhor para seu filho. (...) O fato de ser minoria, que é 0,000%, que seja, mas para essas pessoas que têm essa possibilidade de aderir a essa modalidade de educação, para elas é 100% — disse Ribeiro, dizendo que o Brasil é um país que “se preocupa com minorias”.

Em 2018, o Supremo Tribunal Federal (STF) determinou que familiares só poderiam retirar estudantes da escola em locais onde houvesse regulamentação do tema. O projeto de regulamentação da educação domiciliar estava parado no Congresso desde 2019. No mês passado, voltou à pauta coma nomeação da deputada Luísa Canziani (PTB/PR) para relatora do tema na Câmara.

Damares Alves afirmou que há famílias que “sofrem” pela falta de regulamentação e que o momento é “especial” para discutir o tema, com crianças em casa devido à pandemia.

A ministra negou que a regulamentação possa oferecer risco aos estudantes, uma vez que a escola é um dos principais instrumentos da sociedade para identificar crianças vítimas de abuso e violência.

—As famílias estarão inscritas no processo do ensino domiciliar e saberemos quem são as crianças e poderemos acompanhá-las. (...) Fui abusada dos 6 aos 8 anos e estava no âmbito da escola — disse.

Os argumentos dos ministros foram rebatidos por educadores e gestores da área. O presidente do Conselho Nacional de Secretários de Educação (Consed), Vitor de Angelo, duvida da capacidade do sistema educacional de acompanhar as famílias.

A vice-presidente da União Nacional dos Dirigentes Municipais de Educação (Undime), Márcia Baldini, questiona as condições do Ministério da Educação para estruturar uma rede de monitoramento.

— O MEC tem condições de dar suporte técnico e financeiro para todas as escolas das diversas redes de ensino que compõem nosso país? Temos que ter muito claro qual o papel da educação, da escola —diz Baldini.