O Estado de São Paulo, n. 46476, 15/01/2021. Política, p. A6

Bolsonaro cruza Cabo das Tormentas em queda nas redes sociais
Vera Rosa
15/01/2021



Na virada do ano, o presidente Jair Bolsonaro cruzou o Cabo das Tormentas e iniciou a segunda metade de seu mandato com a aprovação em queda nas redes sociais. A popularidade de Bolsonaro nas mídias digitais já vinha caindo e é atribuída por analistas dessas plataformas a uma tempestade perfeita que vai da economia à política, mas, principalmente, ao imbróglio relacionado à demora para a vacinação contra o novo coronavírus. Com todo o mundo se imunizando e o Brasil no fim da fila, Bolsonaro paga o preço de seus desacertos e tenta vencer a crise no gogó.

"Estou há quatro meses apanhando por causa da vacina", disse o presidente a apoiadores. "Entre eu e ava cina tema Anvisa. Eu não sou irresponsável. Não estou afim de agradara quem quer que seja ", emendou ele. Bolsonaro ironizou a taxa de eficácia da Coronavac, de 50,38%, comprada pelo governo de São Paulo, sob o comando de João D ori a(PSDB).Av aci naé produzida pelo Instituto Butantã em parceria como laboratório chinês Sinovac ."Essa de50%é um aboa? Agora estão vendo a verdade", provocou o presidente. Doria aproveitou para dar uma estocada no adversário. "Enquanto brasileiros perdem vidas e empregos, Bolsonaro brinca de ser presidente", reagiu o tucano.

Bem longe do palanque montado para a disputa presidencial de 2022, porém, está a triste realidade. O estoque de oxigênio acabou em hospitais de Manaus, levando pacientes à asfixia, mais de 200 mil brasileiros já morreram de covid-19 e o País não consegues aird acrise. O ministro da Saúde, Eduardo Pazuello, disse a prefeitos que"o dia De a hora H" para o início da vacinação será dia 20 – por coincidência, a mesma data da posse do novo presidente dos EUA, Joe Biden.

O revés sofrido por Bolsonaro nas redes sociais, no entanto, não se resume ao impasse sobre a vacina. Monitoramento em tempo real feito pela empresa AP Exata indica que a queda da popularidade do presidente no mundo virtual ocorre de forma consistente desde 6 de dezembro e já ultrapassa 20 pontos. Na noite de ontem, por exemplo, o número de menções positivas sobre Bolsonaro estava em 30% e o de negativas chegava a 70%.

A contestação cresce entre liberais e perfis ligados ao mercado. A pesquisa da AP Exata revela que existe, ainda, um ambiente de "falta de paciência" para o vaivém do governo na condução da economia e pressão por privatizações que não saem do papel. Há uma percepção de que o presidente está mais preocupado em tomar medidas populistas para se reeleger e não dá ouvidos ao ministro da Economia, Paulo Guedes.

Enquanto isso, Bolsonaro continua sua queda de braço com o presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ), e pede votos para Arthur Lira (PP-AL), chefe do Centrão. A eleição que vai escolher os novos presidentes da Câmara e do Senado está marcada para fevereiro. O resultado do confronto é o embrião da correlação de forças que pode se formar para a disputa de 2022.

Em outra frente, bolsonaristas incentivam seguidores a migrar para mídias alternativas. Desde que Donald Trump foi banido do Twitter, Bolsonaro e ministros aderiram ao Telegram. A ala ideológica também faz apelos para que aliados entrem em mídias como DuckDuckGo, no lugar do Google, e MeWe, em substituição ao Facebook, que suspendeu Trump. Nada disso, porém, resolverá a crise da comunicação enquanto o presidente não começar a governar, deixando para trás o Cabo das Tormentas.