O Globo, n. 32028, 15/04/2021, País, p. 4

 

Governo pressionado

André de Souza

Julia Lindner

Renata Mariz

15/04/2021

 

 

Por dez votos a um, o Supremo Tribunal Federal (STF) referendou ontem a liminar do ministro Luís Roberto Barroso que determinou a criação da CPI da Pandemia, deixando para o Senado a decisão sobre o formato e o início dos trabalhos da comissão. A maioria dos parlamentares que serão indicados pelos partidos para compor o colegiado pressiona para que os trabalhos comecem imediatamente, de forma semipresencial ou remota, devido à pandemia. Senadores governistas têm defendido que se aguarde uma redução dos casos de Covid-19 e mortes, ou até mesmo a vacinação de todos os envolvidos, para a comissão ter início, com trabalhos presenciais.

Em minoria na CPI, o governo tenta evitar nomes hostis na presidência e na relatoria do colegiado. A intenção é viabilizar parlamentares independentes nessas funções. Um dos cotados para presidir é Omar Aziz (PSD-AM), visto como independente, mas que integra um partido aliado do Palácio do Planalto. De acordo com relatos de parlamentares, o líder do governo no Senado, Fernando Bezerra (MDB-PE), trabalha pela escolha de Aziz.

O Podemos sugeriu o nome de Eduardo Girão (CE), da ala governista, mas suas chances são consideradas pequenas. Também são cotados para ocupar uma dessas funções Tasso Jereissati (PSDB-CE), Eduardo Braga (MDB-AM) e Renan Calheiros (MDB-AL), que seria dentre todos o que enfrenta mais resistência do Planalto pelas críticas frequentes ao governo. Outro nome que o Planalto quer evitar é Randolfe Rodrigues (Rede-AP), autor do pedido da CPI.

Ontem, ao decidir sobre a CPI, os ministros do STF destacaram que cabe ao Senado definir como serão os trabalhos da comissão. Em seu voto, Barroso ressaltou, porém, não se pode radiar o funcionamento em razão da pandemia:

— Não cabe ao Senado Federal se vai instalar ou quando vai funcionar, mas como vai proceder. Caberá ao Senado se por videoconferência, se por modo presencial, ou por modo semipresencial.

O presidente do Senado, Rodrigo Pacheco (DEMMG), defende que CPIs só podem funcionar de forma presencial. Ele, inclusive, deve convocar dessa forma a primeira reunião, para a eleição do presidente e indicação do relator. Isso deve ocorrer após a indicação formal dos representantes pelos partidos, o que deve ocorrer em até dez dias. Apesar de defender o funcionamento presencial, Pacheco pretende deixar que a própria comissão defina seu sistema de trabalho.

—O presidente da CPI junto com o relator e demais membros definirão, dentro da regra do funcionamento presencial, quais atos podem ser praticados pelo sistema remoto, sistema virtual, e, com isso, garantir que a CPI funcione normalmente. Essa é a lógica que tem que se implementar nesse momento e, por parte da presidência [do Senado], nós daremos todos os instrumentos necessários para o funcionamento pleno da comissão parlamentar de inquérito —afirmou Pacheco, em entrevista à Agência Senado.

A maioria dos senadores que devem integrar a CPI defende que os trabalhos comecem em formato remoto, com possibilidade de migrar para o semipresencial em determinados casos, como depoimentos e acareações. Assim, seria possível dar início já aos trabalhos.

DISCUSSÃO SOBRE O RITO

Indicado pelo PSD para fazer parte da comissão, o oposicionista Otto Alencar (BA) afirmou que a CPI deve ser instalada e, depois, começar algumas ações pelo sistema remoto, como requerimentos de convocação e de informação sobre processos licitatório, por exemplo:

— Quando tiver necessidade de se fazer alguma presencial, como acareação, com a presença de advogados, aí não tem como não ser semipresencial ou até presencial. Esse é o meu juízo, o presidente tem autonomia para essa decisão, mas acho que esse rito é viável.

O senador Humberto Costa (PT-CE), outro indicado da ala oposicionista, concorda que o formato do colegiado deve ser misto:

— Algumas sessões podem ser remotas, especialmente quando for audiência pública, que vai ouvir técnicos, especialistas. E reservar audiências presenciais ou semipresenciais um pouco mais para frente, onde você vai ouvir investigados, testemunhas.

Governista, o senador Ciro Nogueira (PP-PI), avalia que a CPI só pode começar quando houver viabilidade para o formato presencial. Na visão dele, o trabalho à distância prejudicaria os resultados do colegiado. Outro aliado do presidente Jair Bolsonaro, o senador Jorginho Mello (PLSC) disse que, no momento, a CPI não tem como atuar remotamente.

“O presidente da CPI junto com o relator e demais membros definirão, dentro da regra do funcionamento presencial, quais atos podem ser praticados pelo sistema remoto, e, com isso, garantir que a CPI funcione” 

Rodrigo Pacheco, presidente do Senado