O Globo, n. 32022, 09/04/2021, País, p. 9

 

Vacinas e crise ‘viram a chave’ de Doria nas redes

João Paulo Saconi

09/04/2021

 

 

Bem humorado, o personagem “João Vacinador”, usado nas redes sociais desde a semana passada por João Doria (PSDB), marcou uma “virada de chave” na atuação online do governador de São Paulo, após meses de desgaste com ataques virtuais por parte de aliados e apoiadores do presidente Jair Bolsonaro. Criada pelo próprio tucano, a estratégia consiste em responder aos críticos, diariamente, com variações de uma única mensagem: “Vou te vacinar também”.

O texto enxuto é uma referência aos maiores trunfos políticos de Doria sobre Bolsonaro: as vacinas CoronaVac e Butanvac, responsáveis pela dianteira do paulista em relação ao governo federal no combate à pandemia da Covid-19.

Ontem, o próprio Bolsonaro foi alvo da piada. Ao comentar a notícia de que teria sido chamado de “vagabundo” pelo presidente, durante um jantar com empresários, o governador não titubeou e escreveu : “Calma, Jair Bolsonaro. Além da CoronaVac, o Butantan é especialista na antirrábica (vacina para a raiva). Fique tranquilo, vou te vacinar”.

O êxito desse bordão, no qual Doria promete vacinar qualquer interlocutor que o provoque no Twitter, no Facebook ou no Instagram, nasceu de uma crise. No fim de março, o político anunciou a Butanvac como a primeira vacina produzida completamente pelo Brasil, sem participação internacional. A repercussão positiva esbarrou em informação obtida pela “Folha de S.Paulo”: na verdade, de acordo com o jornal, há tecnologia americana envolvida na fabricação do imunizante.

A informação foi a senha para que o grupo de Bolsonaro reafirmasse os ataques a Doria nas redes sociais, sobretudo no Twitter. O deputado estadual Frederico D’Ávila (PSL-SP), opositor do tucano na Assembleia Legislativa de São Paulo (Alesp), declarou que ele seria “o maior mentiroso da República”.

Durante uma brecha na agenda, Doria rebateu em público: “Vou te vacinar também”. Depois, fez o mesmo com o deputado federal Eduardo Bolsonaro (PSL-SP), que o chamou de “Ditadória”. Por fim, passou a contar com o auxílio de dois membros de sua equipe para continuar respondendo os internautas e propagandeando as vacinas.

ALTA APÓS DESÂNIMO

Levantamento da consultoria de dados Arquimedes obtido pelo GLOBO indica que o pontapé para as respostas rápidas sobre as vacinas, no dia 29 de março, garantiu a Doria cerca de 90,5 mil interações no Twitter —o terceiro maior pico na conta do governador este ano, atrás apenas de datas em que os temas predominantes eram a primeira aplicação da CoronaVac (17 de janeiro, com 143,9 mil interações) e a produção da Butanvac (26 de março, com 99,1 mil interações).

A alta sucede um período de desânimo de Doria e da equipe diante da relação dele com o mundo digital nos últimos meses: junto ao bolsonarismo, o governador é visado por todos os questionadores das restrições contra a Covid-19.

—Com o rompimento da aliança “BolsoDoria”, em 2019, o tucano passou a ser alvo de ataques, o que piorou durante a pandemia e chegou ao ápice com o presidente discursando na contramão da CoronaVac, ano passado —avalia Pedro Bruzzi, sócio da Arquimedes:

—Apesar do êxito recente com a nova estratégia, ataques bolsonaristas contra Doria ainda estão longe de terem sido superados.