O Globo, n. 32020, 07/04/2021, Sociedade, p. 12

 

Câmara aprova texto de PL que facilita compra privada de  vacinas

Bruno Goés

07/04/2021

 

 

A Câmara dos Deputados aprovou ontem, por 317 votos a favor e 120 contrários, o texto principal de projeto que flexibiliza a compra de vacinas contra a Covid-19 por empresários. A proposta altera norma sancionada no mês passado que obrigava a doação de 100% das doses ao Sistema Único de Saúde (SUS) enquanto os grupos prioritários não fossem imunizados. Caso seja aprovado também pelo Senado, o texto dará acesso à vacinação a empresários e funcionários antes do grupo mais vulnerável. Além disso, a obrigação do repasse ao SUS será reduzida para 50% das doses compradas.

A proposta, relatada pela deputada Celina Leão (PPDF), foi apoiada por partidos do Centrão e pelo presidente da Casa, Arthur Lira (PP-AL). Partidos de oposição, porém, ainda tentam obstruir a continuidade da votação. Até o fechamento da edição, parlamentares ainda analisavam destaques do projeto, que podem modificar o mérito do texto.

No início do mês passado, o presidente Jair Bolsonaro sancionou lei aprovada pelo Congresso que liberou a compra de doses pelo setor privado. Alei, porém, impossibilita o acesso ao imunizante por qualquer pessoa antes da vacinação de idosos, pessoas com comorbidades e outros grupos listados no Plano Nacional de Imunização (PNI).

Em versões preliminares do texto, a relatora desobrigava a doação de qualquer dose ao SUS, mas a redação gerou resistência. Em plenário, depois de suavizar o texto, Celina Leão defendeu a proposta para acelerar o processo de vacinação da população.

— O atual contexto de combate a essa catástrofe sanitária se apresenta sombrio, pois há dificuldade de aquisição de vacinas, e a velocidade de vacinação da população está muito aquém do necessário — argumentou a deputada.

No relatório da proposta, ela detalha o público que será beneficiado coma alteração da legislação: “empregados, associados, assim como estagiários, profissionais autônomos ou empregados de empresas que prestem serviços a elas”.

A oposição tentou argumentar que o projeto atrapalharia o plano de imunização, além de criara categoria “vacinação de camarote”.

— O que está se votando aqui não é a convocação de empresas para comprar vacinas, o que está se querendo aqui é autorizar as empresas a vacinarem antes das pessoas prioritárias, é autorizar a fila ser furada, é dizer não para a vacinação do povo, é vacina para os empresários que compram — discursou o ex-ministro da Saúde e deputado do PT, Alexandre Padilha (SP).

O projeto impõe um obstáculo para a disponibilidade de doses no curto prazo. A compra feita pela iniciativa privada com os laboratórios que já têm contratos com o governo só poderá ser fechada “após a entrega já pactuada” com o SUS.

O projeto de lei também prevê a compra de imunizantes que ainda não foram aprovados pela Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa). A aquisição será autorizada se o imunizante for aprovado por “qualquer autoridade sanitária estrangeira reconhecida e certificada pela Organização Mundial da Saúde” ou por “estabelecimentos de saúde que tenham autorização para importar e dispensar vacinas”.

NEGOCIAÇÃO DA SPUTNIK

Ontem, o presidente Jair Bolsonaro conversou com o presidente da Rússia, Vladimir

Putin. Um dos assuntos tratados foi a aquisição e fabricação no Brasil da vacina Sputnik V, desenvolvida na Rússia.

Bolsonaro estava acompanhado do diretor-presidente da Anvisa, Antonio Barra Torres. O imunizante enfrenta dificuldades para receber aprovação da agência.

Também ontem, em uma reunião que durou cerca de quatro horas, governadores pressionaram a Anvisa para a liberação da importação de 37 milhões de doses da Sputnik V.