O Estado de São Paulo, n. 46446, 16/12/2020. Política, p. A8

 

Para Aras, ajuda da Abin é 'grave', mas faltam provas

Rafael Moraes Moura

Ricardo Galhardo

16/12/2020

 

 

Órgão auxiliou Flávio no caso das rachadinhas Bolsonaro criticou investigações contra o filho

O procurador-geral da República, Augusto Aras, disse ontem que são "graves" as afirmações de que a Agência Brasileira de Inteligência (Abin) elaborou orientações para auxiliar a defesa do senador Flávio Bolsonaro (Republicanos-rj), mas ressaltou que ainda faltam provas. Aras cobrou informações do Gabinete de Segurança Institucional (GSI) e da Abin sobre o caso. Em São Paulo, o presidente Jair Bolsonaro criticou as investigações do Ministério Público contra o filho mais velho e afirmou que há uma "pressão" em cima de Flávio e de outros parentes para atingi-lo politicamente.

Segundo informação revelada pela revista Época e confirmada pelo Estadão, a Abin encaminhou orientações por escrito a advogados de Flávio sobre como agir para tentar inocentá-lo no caso das rachadinhas.

"O fato em si narrado é grave, o que não temos são provas desses fatos, nós não trabalhamos com narrativas. Trabalhamos com fatos e provas", disse Aras, durante conversa com jornalistas na sede da Procuradoria-geral da República (PGR), em Brasília, para fazer um balanço de fim de ano. "Por enquanto temos fatos transmitidos pela imprensa, que levamos a sério. Mas precisamos ter elementos", completou o procurador-geral.

Indicado ao cargo por Bolsonaro, mesmo sem configurar na lista tríplice eleita pela categoria, Aras disse ainda que esperava que os parlamentares que acionaram a PGR fornecessem elementos para comprovar as suspeitas de ajuda da Abin, mas, segundo ele, as provas não foram encaminhadas.

"O MP vai ter de fazer a investigação. Vamos fazer perguntas aos órgãos competentes, ficamos à mercê dessas resposta", disse Aras. "Sem os elementos ao menos indicados pela imprensa estaremos com dificuldade para fazer essas investigações."

Na segunda-feira, a ministra Cármen Lúcia, do Supremo Tribunal Federal, cobrou informações do ministro-chefe do GSI, general Augusto Heleno, e do diretor-geral da Abin, Alexandre Ramagem, sobre as orientações à defesa de Flávio. Em resposta enviada ao STF ontem, Heleno disse que a acusação de que a Abin auxiliou Flávio é uma "narrativa fantasiosa", sem "lastro de veracidade". A Abin afirmou ao Supremo que não emitiu relatórios de inteligência em favor de Flávio Bolsonaro e pediu para ter acesso aos documentos mencionados.

Segundo a reportagem, a Abin produziu dois documentos sobre uma "organização" na Receita Federal que, segundo afirma a defesa de Flávio, teria feito uma devassa nos dados fiscais do senador. Em um dos documentos, a finalidade descrita é "Defender FB no caso Alerj". Entre as sugestões listadas pela agência estão a demissão de servidores do Fisco e da Controladoria-geral da União (CGU), órgão responsável pela fiscalização da administração pública.

O Ministério Público do Rio denunciou no mês passado Flávio por peculato, lavagem de dinheiro e organização criminosa. Além do senador, foram acusados também seu ex-assessor Fabrício Queiroz, apontado como operador de um esquema de "rachadinhas" na Assembleia Legislativa fluminense, e outros 15 ex-funcionários do gabinete.

Contas. Ao participar do programa de José Luiz Datena, na Band, Bolsonaro afirmou que sempre torceu por um "processo justo" envolvendo Flávio. "A pressão em cima do meu filho é pra me atingir. Não só em cima do meu filho. É em cima de esposa, é de ex-mulher, outros filhos, parentes meus, amigos que tão do meu lado", disse. "Parece que o maior bandido da face da Terra é o Flávio Bolsonaro. Se tem a sua culpa, que se apure, mas não dessa forma, tentando me atingir politicamente em todo o momento."

Ele afirmou que Queiroz era "de confiança" e fez pagamentos pessoais para ele no passado. "O Queiroz pagava conta para mim também. Era de confiança. Está com esse processo agora. Desde que instaurou o processo, eu não tenho conversado com ele. Agora, ele está sendo injustiçado também, porque tem que ser investigado e dar a devida pena se for culpado, e não prender a esposa."

O presidente participou ontem de um evento na Companhia de Entrepostos e Armazéns Gerais de São Paulo (Ceagesp), onde discursou para uma plateia que se aglomerou no local (mais informações nesta página).

Ele fez elogios à Polícia Militar de São Paulo e disse que espera, após a eleição dos novos presidentes da Câmara e do Senado, aprovar o projeto que cria o excludente de ilicitude nos casos em que policiais em serviços participarem de ações que resultem em morte. "Entre a vida de um policial e de mil vagabundos, ou 111 vagabundos, que é um número bastante emblemático, eu fico com aquele policial", disse ele, em referência ao massacre do Carandiru.