Valor Econômico, n.5212, 22/03/2021. Política, p.A12

 

Cresce a pressão por CPI da pandemia

Renan Truffi

Vandson Lima

22/03/2021

 

 

Partidos independentes começam a discutir forma de retaliar o que chamam de inoperância

A morte precoce do senador Major Olimpio (PSL-SP) por complicações relacionadas à covid-19 e a postura beligerante do presidente Jair Bolsonaro diante do “lockdown” nos Estados elevou o clima de insatisfação no Congresso Nacional. Setores do Parlamento discutem, nos bastidores, um movimento de pressão contra o Palácio do Planalto. Uma das possibilidades cogitadas é travar as pautas governistas que não tiverem relação direta com a crise. O descontentamento também trouxe à tona, mais uma vez, os pedidos pela abertura de uma Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI).

A possibilidade de retaliação começou a ser ventilada entre partidos mais independentes ou que fazem oposição ao governo no Senado, mas atrai também alguns congressistas de centro. Esses senadores argumentam que, como o Legislativo não deixou de analisar pautas prioritárias e reformas estruturantes patrocinadas pelo Executivo, o governo está numa situação “confortável”. O objetivo dessa ala é mostrar que, para fazer as matérias econômicas andarem, o Palácio do Planalto vai ter de se empenhar mais no combate à pandemia.

Segundo um dos líderes favoráveis à ofensiva, o Congresso não pode ficar esperando que um possível sentimento de revolta da sociedade brasileira seja direcionado ao Parlamento. “Está todo mundo consternado [no Congresso] e com um sentimento de que não dá para ficar como está. Isso [insatisfação dos brasileiros] vai recair sobre nós [congressistas]. A comissão de acompanhamento do covid era uma coisa para 2020. Se não tem CPI, tem que ter alguma medida do Congresso Nacional”, defendeu uma fonte.

Caso o movimento ganhe força entre as bancadas, projetos como o que cria a BR do Mar e o marco legal das ferrovias podem ser afetados. Ambas as matérias vêm passando por um processo de amadurecimento nas últimas semanas e a expectativa é que fossem levadas ao plenário ainda no mês de março ou no início de abril. Na prática, as propostas seriam sacrificadas para que o governo deixe de ser “omisso”.

Outra avaliação feita entre os parlamentares é que o cenário de calamidade nos hospitais vai piorar ainda mais nos próximos 15 ou 20 dias, em razão do alto número de infectados. Por conta disso, a pressão para que Executivo acione um “freio de arrumação” e corrija sua forma de atuar vai ser ainda maior. “Talvez seja a hora de dizer ao governo: quer aprovar projetos estruturantes? Então aja sobre a pandemia”, explicou um parlamentar.

Nesse sentido, poucas horas após a morte de Major Olímpio, o senador Angelo Coronel (PSD-BA) divulgou um texto no qual defende maior pressão sobre o governo Bolsonaro. “Chega de politicagem ou vai nos faltar lágrimas ao enterrar a cada dia um conhecido ou membro da família. O Congresso precisa pressionar, urgentemente, o governo a ir em busca, imediatamente, da vacina da cura, onde tiver, sem burocracia”, escreveu.

Essa pressão também deve ser canalizada para que o presidente do Senado, Rodrigo Pacheco (DEM-MG), instale uma CPI dedicada a apurar a conduta das autoridades durante a crise. A líder da bancada feminina no Senado, Simone Tebet (MDB-MS), argumenta que a comissão deve ser usada como “instrumento de pressão”. Na avaliação da senadora, audiências públicas com ministros “não são suficientes” para gerar uma “mudança de rumos” no Executivo.

“Não há coordenação, não há plano, não há compaixão. Faltam leitos, falta oxigênio, falta caixão. Faltam remédios para a dor. Audiência pública não basta. Comissão de acompanhamento da covid do Senado é importante, mas não suficiente. De pouco adianta apenas acompanhar quem navega à deriva. É preciso, urgente, uma mudança de rumos”, escreveu numa carta aberta. “A ‘CPI da Pandemia’ surge no horizonte do momento como um instrumento de pressão, para que o governo.”