O Globo, n.32007 , 25/03/2021. País, p.7

 

Moro nega parcialidade e defende a Lava-Jato

Cleide Carvalho

25/03/2021

 

 

Ex—juiz afirma que tratou todos os investigados com 'respeito' e diz que país não deve retroceder no combate à corrupção

O ex-juiz Sergio Moro afirmou ontem que sempre tratou com “imparcialidade” e “respeito” todos os acusados na Lava-Jato. Em nota enviada à imprensa, o ex-magistrado defendeu o legado da operação e disse que o Brasil não deve retroceder no combate à corrupção. A nota foi uma resposta à decisão da Segunda Turma do Supremo Tribunal Federal (STF) que, anteontem, declarou que Moro atuou de forma parcial ao julgar o ex presidente Luiz Inácio Lula da Silva no caso do tríplex do Guarujá.

Apesar do resultado do julgamento, Moro afirmou que tem “absoluta tranquilidade” em relação às decisões que tomou enquanto foi o responsável pela 13ª Vara da Justiça Federal de Curitiba. Na nota, disse que todas as suas sentenças foram bem fundamentadas e que “todos os acusados foram tratados nos processos e julgamentos com o devido respeito”. “Com imparcialidade e sem qualquer animosidade da minha parte, como juiz do caso”, disse.

O ex-juiz defendeu a Lava-Jato como marco no combate à corrupção e à lavagem de dinheiro no Brasil. Na opinião dele, as investigações deram fim à impunidade nestes tipos de crimes. “Mais de quatro bilhões de reais pagos em subornos foram recuperados aos cofres públicos e quase duas centenas de pessoas foram condenadas por corrupção e lavagem de dinheiro”, diz a nota.

COMBATE À CORRUPÇÃO

Moro lembrou ainda que a sentença que condenou Lula no caso do tríplex do Guarujá foi confirmada pelo Tribunal Regional Federal da 4ª Região e pelo Superior Tribunal de Justiça (STJ), que haviam rejeitado as alegações da defesa de falta de imparcialidade. “O ex-presidente só teve a prisão ordenada pelo Tribunal Regional Federal da 4ª Região, em 2018, após ter habeas corpus denegado pelo plenário do Supremo Tribunal Federal”, escreveu.

A justificava de Moro já havia sido usada no dia anterior pelo procurador Deltan Dallagnol, ex-coordenador da força-tarefa da Lava-Jato. Anteontem, o procurador escreveu, em uma rede social, que a sentença contra Lula foi confirmada por outras instâncias da Justiça.

Moro disse, ainda, que o Brasil não pode destruir o passado recente de combate à corrupção. Segundo o exjuiz, que deixou a Lava-Jato para ser ministro da Justiça do governo Jair Bolsonaro, cargo que ocupou até abril do ano passado, o país deve se preocupar em “aprimorar mecanismos de prevenção e combate à corrupção e com isto construir um país melhor e mais justo”.

O ex-magistrado foi considerado parcial por 3 a votos a 2. Ao mudar um voto dado em 2018 e concordar com a tese de que Moro agiu de forma ilegal no julgamento de Lula, a ministra Cármen Lúcia ressaltou que estava analisando apenas a conduta do juiz e que o combate à corrupção deve continuar:

—Não estou emitindo juízo no voto sobre o combate a corrupção, que não pode de jeito nenhum parar — disse Cármen.

— Todo mundo tem o direito de acreditar-se julgado por uma contingência do Estado, e não por um voluntarismo de um determinado juiz ou tribunal.

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Lula deve deixar ataques a operação em segundo plano

Sergio Roxo

25/03/2021

 

 

Após decisão da Segunda Turma, ex-presidente pretende focar discurso em críticas a Bolsonaro

Após a Segunda Turma do Supremo Tribunal Federal (STF) decidir, anteontem, que o ex-juiz Sergio Moro foi parcial ao julgar o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva no caso do tríplex do Guarujá, os ataques à Operação Lava-Jato devem ficar em segundo plano nos discursos do petista. As críticas à força-tarefa de Curitiba foram constantes nas manifestações públicas de Lula de 2016 para cá. Como sinal da nova postura, até ontem à noite, o ex-presidente ainda não havia feito qualquer comentário sobre o julgamento no STF.

No último dia 10, quando convocou uma entrevista coletiva para tratar da decisão do ministro Edson Fachin de anular as suas condenações na Justiça Federal do Paraná, Lula afirmou:

— A Lava-Jato desapareceu da minha vida.

ÊNFASE À PANDEMIA

O ex-presidente, apesar de ter atacado a operação na ocasião, deu ênfase às críticas ao governo do presidente Jair Bolsonaro e aos problemas provocados pela pandemia do coronavírus.

— No discurso (do dia 10) em São Bernardo, ele (Lula) falou sobre vacina, máscara, distanciamento social, auxílio emergencial e apoio aos empregos. Deu um roteiro importante para o Brasil. Acho que é a isso que ele vai se dedicar — afirmou o deputado Paulo Teixeira (SP), secretário-geral do PT.

Apesar do silêncio de Lula, a parcialidade de Moro foi comemorada entre os petistas. A avaliação é que a decisão da Segunda Turma consolida o discurso adotado desde que foram divulgadas as primeiras informações sobre as investigações contra o líder petista.

A decretação da parcialidade de Moro pelo Supremo deverá ser usada para responder questionamentos sobre a conduta do petista, durante o processo eleitoral de 2022. Entre dirigentes do PT, a candidatura de Lula é dada como certa.

Por enquanto, o ex-presidente deve manter o discurso de que 2022 não pode ser tratado antes de 2021, com ênfase nos problemas enfrentados pelo país. Ele também evitará se colocar explicitamente como candidato.

Quando receber a segunda dose da vacina contra o coronavírus, na metade de abril, segundo cronograma do governo de São Paulo, Lula pretende começar a viajar pelo país. O Nordeste deve ser o primeiro destino.