Valor Econômico, n. 2198, v.21, 02/03/2021. Política, p.A6

 

 

 

Pressão por desidratação ameaça votação da PEC emergencial amanhã

 

Partidos de centro pedem outras mudanças; oposição, o fatiamento da proposta

Por Renan Truffi e Vandson Lima — De Brasília

 

O recuo do governo em relação à desvinculação dos pisos de saúde e educação não deve ser suficiente para diminuir a pressão por uma desidratação da proposta de emenda à Constituição (PEC) que visa criar gatilhos para contenção de despesas - a chamada PEC emergencial.

 

O PSDB e outros partidos de centro pressionam por novas mudanças no texto. Uma delas é a que trata da destinação de 28% do PIS/Pasep para o “financiamento de programas de desenvolvimento econômico” por meio do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES). A oposição, por sua vez, pede o fatiamento da PEC, votando agora apenas a flexibilização fiscal que permitirá ao governo retomar o pagamento do auxílio emergencial e deixando as medidas de impacto para uma discussão mais longa.

 

Até a noite de ontem, o governo não havia apresentado o novo parecer, como prometido. A intensificação das medidas de restrição de circulação em Brasília, com o presidente da Câmara Arthur Lira (PP-AL) suspendendo as atividades presenciais - o presidente do Senado, Rodrigo Pacheco (DEM-MG), ainda avaliava o que fazer - tornam as negociações para a realização da votação na quarta-feira ainda mais complicadas.

 

O relator da proposta, senador Márcio Bittar (MDB-AC), disse ao Valor que decidiu “aceitar a derrota” e retirar do substitutivo final a desvinculação dos pisos constitucionais de saúde e educação, que provocou reação da oposição, partidos de centro e até mesmo de aliados do governo. Bittar admitiu estar chateado pelo fato de o Senado sequer ter aceitado debater o assunto, mas afirmou que vai fazer essa concessão para salvar os gatilhos fiscais, que visam segurar despesas com o funcionalismo público.

 

“Não posso ser mau perdedor. Claro que fiquei chateado. Muito. Mas não posso ser o guri teimoso. Agora, eu lamento. Lamento que os senadores ontem sequer aceitaram discutir um sistema que está falido. Basta fazer uma pergunta simples: será que os netos dos 81 senadores estudam nesse sistema [de educação pública]?”, questionou. Apesar disso, Bittar afirmou que a ideia é preservar no texto todo o restante das medidas de controle fiscal.

 

A destinação de parte do PIS/Pasep foi alvo de uma emenda do senador José Serra (PSDB-SP) e recebeu apoios. Na semana passada, o líder do PSDB na Casa, Izalci Lucas (DF), já havia alertado que o governo precisava conversar sobre essas medidas com os partidos e confirmou que, se a medida não for retirada, o PSDB vai destacar a emenda como forma de alterar o trecho com ajuda do plenário do Senado. “O BNDES é o maior financiador de projetos. Se você retira esse repasse, o estrago é muito grande. Não dá para brincar, fazer como eles estão fazendo”, disse Izalci.

 

Outro tema incluído na PEC emergencial e tem sido alvo de debate é o Programa Universidade Para Todos (ProUni). As mantenedoras de universidades privadas tentam preservar o programa dos cortes que serão feitos como contrapartida à PEC. Isso porque o parecer de Márcio Bittar prevê que Bolsonaro mandará, em até seis meses após a promulgação, projeto de lei para reduzir os incentivos e benefícios tributários em 10 % no primeiro ano e, proporcionalmente como fatia do PIB, de 4,7% hoje para 2% em oito anos.