O Globo, n.31991 , 09/03/2021. Sociedade, p.8

 

Atraso na entrega

Ciça Guedes

Chico Otávio

Evelin Azevedo

09/03/2021

 

 

Após falha técnica, Fiocruz começa produção em larga escala de vacinas

Depois de quase 20 dias de atraso na entrega de doses da vacina contra a Covid-19, a Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz) informou ontem que corrigiu uma falha técnica e deu início à produção em larga escala do imunizante desenvolvido pela Universidade de Oxford e pelo laboratório britânico AstraZeneca a partir de ingrediente farmacêutico ativo (IFA) importado.

A fundação ainda aguarda, no entanto, a aprovação da Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) para a validação dos lotes envasados. A Fiocruz entregará hoje o relatório dos resultados obtidos nesses lotes de validação, que foram finalizados no domingo. A expectativa é que até o final da semana a Anvisa dê o seu aval positivo.

O atraso na entrega à Anvisa das doses ocorreu em função de uma falha técnica de um equipamento da Fiocruz. A informação, que o GLOBO havia antecipado, foi confirmada na manhã de ontem pela assessoria da Fiocruz. O problema ocorreu na máquina que tampa os frascos da vacina, na parte que envolve o lacre de alumínio, e foi solucionado na emana passada.

A validação de lotes é uma etapa obrigatória para que os laboratórios sejam liberados para processar e distribuir a vacina contra a Covid-19. O processo, segundo explicou a própria Fiocruz, fixa critérios de qualidade, limites de perda, rejeição e não-conformidade de frascos, com o objetivo de garantir a eficácia e a segurança do produto.

QUARTO CRONOGRAMA

Com o cronograma atualizado, a previsão da Fiocruz é entregar, neste mês, 3,8 milhões de doses (inicialmente, a previsão para março era de 15 milhões de doses); em abril, 30 milhões; em maio, 25 milhões; em junho, mais 25 milhões; e, em julho, 16,6 mide lhões. Serão, no total, 100,4 milhões de doses, suficientes para imunizar 50,2 milhões de brasileiros com duas doses. Com a incorporação da tecnologia para produzir o IFA, prevista para o segundo semestre, a fundação deverá entregar mais 110 milhões de doses, com produção 100% nacional (veja tabela acima).

Os atrasos no cronograma inicial da Fiocruz impediram a imunização, entre fevereiro e março, de 7,5 milhões de brasileiros do grupo prioritário, composto de profissionais da saúde e idosos.

O problema técnico da Fiocruz e o novo cronograma da entrega das doses foram tratados ontem em uma reunião na sede da Fiocruz, no Rio de Janeiro, com a presença do ministro da Saúde, Eduardo Pazuello. Pela quarta vez em uma semana, Pazuello baixou o número de vacinas previstas para março. Segundo o ministro, o país terá entre “25 e 28 milhões” de doses disponíveis este mês, sem especificar qual lote de qual vacina estaria atrasada —no sábado, o Ministério da Saúde havia anunciado 30 milhões doses para março.

—No dia de hoje, nós estamos recebendo 2,5 milhões de doses do (Instituto) Butantan e que irá durante a semana para a distribuição aos estados. A nossa previsão é de que a Anvisa e a Fiocruz ajustem os processos durante esta semana para que, na semana que vem, ou no máximo na outra, nós tenhamos entregas da Fiocruz somadas semanalmente com as entregas do Butantan. Nosso objetivo é ter, em março, próximo a 25 milhões, 28 milhões de doses já realmente entregues para que a gente cumpra o PNI (Programa Nacional de Imunização)—disse o ministro.

Também participaram da visita à Fiocruz o governador do Piauí, Wellington Dias (PT), representante do Fórum Nacional dos Governadores; o secretário de saúde do Rio, Carlos Alberto Chaves; e o vicepresidente de Produção e Inovação em Saúde (VPPIS) da Fiocruz, Marco Krieger. A presidente da fundação, Nísia Trindade, participou por videoconferência. A comitiva também fez uma visita à linha de produção da vacina em Bio-Manguinhos.

A Fiocruz pressiona ainda a AstraZeneca pela entrega de oito milhões de doses prontas, que, segundo Pazuello, estão bloqueadas pela Índia.

A farmacêutica ofereceu 12 milhões de doses — dos quais 4 milhões já foram entregues via Instituto Serum em remessas em fevereiro e março — como forma de compensar o atraso na entrega do IFA que deveria ter chegado em janeiro.

FASE MAIS LETAL DA COVID

O atraso nas entregas de vacinas pelo governo federal ocorre em um momento de recrudescimento da pandemia no Brasil, que registrou ontem o décimo dia consecutivo de recorde da média móvel de mortes pela Covid-19 em toda a pandemia, chegando a 1.540. O país já tem 11.055.480 infecções e 266.614 óbitos, segundo dados do boletim do consórcio de imprensa.

Enquanto isso, a vacinação segue em ritmo lento: desde 17 de janeiro, quando começou a campanha, 8.497.929 pessoas receberam a primeira dose dos imunizantes, o equivalente a apenas 4% da população brasileira. A segunda dose da vacina, por sua vez, foi aplicada em somente 1,35% da população nacional.

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Bolsonaro pede à Pfizer antecipação de cronograma

Julia Lindner

Leandro Prazeres

Daniel Gullino

Manoel Ventura

09/03/2021

 

 

Presidente se reuniu ontem com CEO da farmacêutica. Governo anunciou 14 milhões de doses até junho, mesmo sem contrato assinado

Após encontro via teleconferência com executivos da Pfizer, que já foi alvo de suas críticas, o presidente Jair Bolsonaro afirmou ontem que conseguiu negociar novas vacina contra a Covid-19 coma farmacêutica porque os representantes do laboratório “entenderam a gravidade que o Brasil atravessa”.

— Eles (representantes da P fizer) entenderam a gravidade que o Brasil atravessa, com essa nova cepa, que é interesse deles que não saia do local, né. Isso ajudou muito nessa negociação — disse Bolsonaro no Palácio da Alvorada.

Após o encontro com CEO da Pfizer, Albert Bourla, o ministro da Economia, Paulo Guedes, e Airton Soligo, assessor especial do Ministério da Saúde, informaram que Bolsonaro pediu a antecipação de entrega de cinco milhões de doses para o primeiro semestre, o que teria sido aceito. Segundo Soligo, a previsão de entrega de imunizantes no primeiro semestre vai passar de nove milhões para 14 milhões.

O governo federal ainda não assinou contrato coma P fizer, mas já formalizou a intenção de comprar 100 milhões de doses. AP fiz e ré a única farmacêutica cuja vacina já tem registro definitivo na Anvisa.

Na semana passada, o governo federal publicou, no Diário Oficial da União, um aviso de dispensa de licitação para comprar 100 milhões de doses da Pfizer e 38 milhões de doses da vacina da Janssen — outro contrato que ainda não foi assinado.

Segundo Paulo Guedes, o acordo já está fechado com a Pfizer, eque agora só falta a assinatura.

A negociação coma P fiz erse arrasta desde o ano passado. Bolsonaro e o ministro da Saúde, Eduardo Pazuello, criticaram algumas das cláusulas exigidas pela empresa, como a não responsabilização de eventuais efeitos colaterais, e reclamaram também da previsão de entrega das primeiras doses, considerada pequena.

A Pfizer informou em janeiro que, no ano passado, ofereceu ao governo brasileiro a possibilidade de comprar 70 milhões de doses de sua vacina em agosto, com entrega prevista a partir de dezembro, mas que não obteve sucesso nas tratativas com o governo.