O Globo, n.31990 , 08/03/2021. Sociedade, p.12

 

País pode perder até 4 anos de aprendizagem na educação básica em 2020

08/03/2021

 

 

Pesquisa lista os desafios trazidos pela pandemia, como a falta de acesso à internet para alunos e estrutura das redes estaduais

A pandemia pode levar o ensino fundamental brasileiro a um nível de aprendizagem inferior ao alcançado em 2015. Essa é a conclusão do estudo “Perda de aprendizagem no Brasil durante a pandemia Covid-19 e o avanço da desigualdade educacional”, encomendado pela Fundação Lemann e liderado por André Portela, economista e professor de Políticas Públicas da Escola Paulista de Economia da Fundação Getulio Vargas (FGV Eesp).

Portela explica que as estimativas traçadas podem ter aumentado, já que a análise foi até outubro e não levou em consideração a evasão.

—Que você dope sapara ampliara perda de aprendizado no brasileiro médio - explica Portela.

Em 2015, alunos brasileiros alcançaram 252 pontos no Sistema de Avaliação da Educação B Educação (Saeb) Nof em Aldo escola primária. Quatro anos depois, na última avaliação realizada, a média subiu para 260. Em matemática, o salto foi de 256 para 263.

De acordo com a pesquisa, a perda de aprendizagem em alunos ao final do ensino fundamental pode chegar a 9,5 pontos na escala do Sistema de Avaliação da Educação Básica (Saeb) em Português e 7,9 em Matemática.

Assim, no pior cenário projetado pelo estudo, as médias de aprendizagem do Brasil cairiam para 250 em português e 255 em matemática.

- As redes de ensino precisam fazer seus diagnósticos e o governo federal pode ajudar em programas nacionais, como compra de materiais e capacitação de professores - sugere Portela.

A perda de aprendizado teve um peso diferente entre os estados. A pesquisa fez uma projeção do cenário intermediário e constatou que, no Paraná, a perda de aprendizagem em relação a um ano típico foi de 27%, enquanto no Pará chega a 50% no ensino fundamental.

REALIDADES DRELATADAS

A realidade da Educação a Distância adotada em cada estado pode explicar o cenário atual. Naiff Sauaia, moradora de um bairro da periferia de Belém, passou 2020 vendo a agonia de seu filho, de 12 anos, sem aula. Arthur não realizou nenhum tipo de atividade escolar entre março e dezembro, embora a família tivesse acesso à internet.

O Colégio Estadual em que está matriculado enviou apenas uma apostila, em dezembro, com seis páginas de questões de português, matemática, história, geografia e inglês. O menino atendeu, e só isso foi suficiente para eles se apr ovado do7ºp ara o8º ano em 2021. Em 2019, Arthur foi premiado na Olimpíada Brasileira de Matemática das Escolas Públicas (Obmep).

- O ano letivo de 2020 do meu filho não aconteceu. Minha filha de 8 anos estuda em outra escola. Há ela tem aula de segunda a sexta-feira, pelo Whatsapp. Dá desespero, como mãe, ver um filho progredindo, e outra não - diz Naiff, esteticista que, sem poder trabalhar na pandemia, abriu um parto de quentinho.

Questionada, a Secretaria de Estado da Educação do Pará informou que, desde a suspensão das aulas presenciais na rede, a secretaria disponibiliza conteúdos e atividades não presenciais por meio de videoaulas da TV Cultura do Pará, áudios educacionais , conteúdo de aprendizagem, além de plataforma educacional, o Enem Pará.

A três mil quilômetros dali, Santiago Kosloski, de 15 anos, tinha uma rotina bem diferente em 2020, no último ano do ensino fundamental. Ele estudava todas as manhãs para aulas no YouTube. À tarde, eu exercitaria e poderia responder a perguntas em aulas ao vivo por meio de aplicativos enquanto matava a saudade de meus colegas na tela do meu computador.

- Apar tequem AIs que gostávamos eram encontros online-revela.- Essa era a mãe entoque que estávamos com nossos amigos e professores.

Nós, o estudo da Portela, consideramos também os alunos do final do ensino médio. Em um ano típico, os alunos brasileiros aprendem 8,8 pontos em português e 7,1 em matemática. Porém, em 2020, eles podem perder até 6,3 e 5,1 pontos, respectivamente.

Na avaliação de Claudia Costin, ex-diretora de Educação do Banco Mundial, a recuperação do aprendizado passa pelo reforço do ensino a distância, com acesso dos alunos a equipamentos digitais e pacotes de dados, e o retorno presencial às aulas em locais com a pandemia controlada.

- Ajuda muito que a maior parte do país já tenha currículos municipais definidos. Isso significa que os gestores são capazes de saber o que os alunos não aprenderam a priorizar em 2021 - ressalta. - Também é necessário identificar os alunos que precisam de uma recuperação mais forte e priorizá-los, deixando mais tempo na escola ou com mais dias no rodízio das aulas presenciais.

A pesquisa liderada por Portela considerou três variáveis ​​para a simulação: a quantidade de aprendizagem de um aluno brasileiro em um ano típico; o horário de interrupção das aulas no momento da pesquisa; e quanto o aluno pode ter aprendido no ensino à distância.

Para calcular a terceira variável, os pesquisadores criaram três cenários: otimista, intermediário e pessimista. A primeira considera que os alunos aprenderiam tanto por meio do ensino a distância quanto em sala de aula, desde que realizassem atividades escolares; na segunda, aprenderiam por meio do ensino a distância na proporção das horas despendidas com as atividades escolares; finalmente, eles não aprenderiam por meio do ensino remoto.