O Globo, n. 31985, 03/03/2021. Mundo, p.20

 

 

 

Araújo vê início promissor em relação com Biden

 

 

Para chanceler, aproximação começou “extremamente bem', e governo do democrata enxerga a 'realidade' e não a “narrativa distorcida” sobre o Brasil; ministro condenou relatório crítico à política ambiental e evento em Harvard que discutiu riscos à democracia no país

 

DANIEL GULLINO

daniel.gullino@bsb.oglobo.com.br

 

Passada a saia-justa com o presidente dos Estados Unidos, Joe Biden, causada pelo forte apoio do governo Jair Bolsonaro à reeleição do seu antecessor, o republicano Donald Trump, o chanceler Ernesto Araújo afirmou que a relação com o novo governo democrata começou “extremamente bem”.

De acordo com Araújo, o governo Biden vê a “realidade”, e não oque chamou de “narrativa distorcida ”. Bolsonaro manteve por semanas após a apoio às acusações infundadas de Trumpd eque a vitória de Biden foifra udu lenta, e foi um dos últimos líderes de expressão mundial a cumprimentar o novo presidente, 38 dias após a vitória do democrata ser projetada pela imprensa.

—Nossodi álogo coma adm in istração Biden começou extremamente bem — disse o ministro, em entrevista coletiva em Brasília. — Fico feliz quando vejo que o novo governo americano está olhando a realidade, e não a narrativa distorcida daqueles que têm interesses concretos de que não haja uma aproximação BrasilEstados Unidos, que são aqueles partidários do atraso.

Araújo criticou especificamente um relatório entregue ao governo americano por acadêmicos e ativistas com críticas à política ambiental brasileira, e também a Brazil Conference, evento realizado anualmente na Universidade  Harvard, onde, segundo o ministro, foram discutidos riscos à democracia no Brasil. O relatório com mais de cem assinaturas pede para que o governo Biden suspenda a importação de madeira, soja e carne que estejam ligadas ao desmatamento no país.

— O que nós temos é, infelizmente, uma espécie de um esforço de algumas correntes políticas no Brasil de criar uma má imagem do Brasil no exterior —disse o ministro.

O governo Biden tem dado indicações de que, ao menos por ora, não aplicará sanções ao Brasil por questões ambientai sou de direitos humanos, e de que buscará uma relação pragmática com o governo Bolsonaro. Por outro lado, o presidente brasileiro é um dos raros líderes do G-20, o grupo das 20 maiores economias do mundo, com quem Biden não falou até agora por telefone.

 

SEM ATRITO COM A CHINA

Araújo admitiu que o meio ambiente era visto como um possível “terreno de Biden, mas disse que o início foi positivo, com uma reunião virtual dele e do ministro do Meio Ambiente, Ricardo Salles, com o enviado especial para o clima do governo americano, John Kerry.

—Já se inaugurou um processo técnico para falar de clima —afirmou ele.

O chanceler disse que o governo brasileiro já foi convidado a participar do fórum sobre o meio ambiente convocado pelo presidente dos EUA para 22 de abril. Araújo evitou confirmar seBol sonar oirá participar do encontro, mas disseque ele pretende “fazer parte desse esforço” eque o Brasil quer dar a sua contribuição.

No mês passado, o presidente da Comissão de Relações Exteriores do Senado americano, o senador democrata Bob Menendez, enviou uma carta ao governo brasileiro dizendo que Araújo estava “desconectado” da realidade dos EUA ao sugerir, em rede social, que havia “infiltrados” na invasão do Capitólio por apoiadores de Trump, em 6 de janeiro. Menendez cobrou uma posição firme do governo brasileiro de condenação da invasão, cujo objetivo era impedir que o Congresso homologasse a vitória de Biden.

Araújo minimizou o episódioe disse acreditar que ele e o senador têm os mesmos “valores” em relação à democracia e se disponibilizou a conversar com o parlamentar.

O ministro afirmou que condenou o episódio, mas disse que ele não poderia servir como justificativa para “demonizar” manifestações populares.

Araújo também negou atritos coma China. Ele reconheceu que houve problemas com a embaixada do país no Brasil em duas oportunidades, quando o embaixador YangWanmingc ri ticou publicamente postagens contra a China feitas pelo deputado federal Eduardo Bolsonaro (PSL-SP) em redes sociais, mas disse que a reclamação “foi entendida” pelo país asiático.