O Globo, n.31987 , 05/03/2021. País p.6

 

Flávio, ao visitar mansão: "Não quero problema"

Aguirre Talento

05/03/2021

 

 

Senador buscou discrição ao comprar casa de R$ 6 milhões, em Brasília; ele disse à então proprietária que já estava muito em evidência e, por isso, queria tudo regularizado. Segundo os vendedores, ainda estão pendentes cerca de R$ 2 milhões

O senador Flávio Bolsonaro (Republicanos-RJ) estava quase irreconhecível quando chegou de camiseta e bermuda para conhecer uma mansão de R$ 6 milhões, localizada na área mais cara de Brasília, que ele estava interessado em comprar. As tratativas começaram no fim do ano passado e foram conduzidas por sua mulher, a dentista Fernanda Figueira Bolsonaro. Durante toda a negociação, o casal buscou manter discrição. Os detalhes da negociação foram relatados ao GLOBO por uma testemunha que acompanhou diretamente as tratativas.

A antiga proprietária e moradora da casa, a design de interiores Heleuza Maria da Silva, havia se divorciado de Juscelino Sarkis e por isso decidiu colocar o imóvel à venda. Ela havia ficado com a casa, mas avaliou que era grande demais para suas atuais necessidades. Ainda em 2018 Heleuza procurou imobiliárias e fez o primeiro anúncio da venda da mansão, por um valor de R$ 7,9 milhões. Não houve interessados. O preço foi baixando gradualmente, até chegar no valor de R$ 5,97 milhões, quando o casal Flávio e Fernanda Bolsonaro ficou sabendo do anúncio.

Com o preço mais baixo, começou a haver procura pelo imóvel. No fim do ano passado, Heleuza recebeu o telefonema de um corretor de imóveis e marcou a visita de uma pessoa interessada em conhecer a casa. O nome dela: Fernanda.

A mulher de Flávio foi até o local acompanhada do seu corretor de imóveis e adorou a mansão. Heleuza lhe relatou as condições de pagamento, prazos e avisou que já tinha diminuído o preço bem abaixo do valor de mercado. Fernanda concordou com todas as premissas, disse que havia gostado da casa e avisou que iria conversar com seu marido sobre o assunto e daria um retorno.

ESPANTO

No dia seguinte, Fernanda telefonou para a proprietária e perguntou se poderia levar o marido para conhecer o local. Ficou combinado que o corretor imobiliário da proprietária estaria no local, e o casal levaria seu corretor também. Pouco tempo depois, Flávio e Fernanda chegaram acompanhados do corretor, de um assessor e também de suas duas filhas.

Flávio não se identificou com o sobrenome “Bolsonaro”. Cumprimentou a proprietária com educação e discrição. Heleuza não escondeu seu espanto quando percebeu quem era o comprador. Por isso, ela deixou claro que toda a construção era regularizada e com os impostos em dia.

—Tem muitas casas aqui no Lago Sul que os proprietários constroem uma parte inicial, tiram o Habite-se, depois constroem varanda gourmet, piscina e várias outras coisas. O meu alvará de construção é total da casa, tudo pago, IPTU em dia. Não quero nenhum problema para mim —disse a proprietária, segundo uma testemunha que presenciou o diálogo.

Foi nesse momento que Flávio relatou seus receios sobre a transação.

—Nem eu quero problema pra mim. Eu já estou muito em evidência, estou sendo muito massacrado e injustiçado. Não quero problema pra mim nem pra você, nem paras minhas filhas. Quero tudo registrado, tudo legalizado —afirmou, de acordo com uma testemunha.

Na conversa, eles acertaram as condições iniciais de pagamento. Flávio disse que iria solicitar um financiamento para pagar parte da compra. O restante, segundo o acerto, seria pago por meio de transferências bancárias em parcelas a serem quitadas até junho. Os detalhes foram combinados depois por meio dos corretores: o pagamento de um sinal de R$ 200 mil para garantir o negócio, e juros de 1% ao mês nas parcelas que seriam quitadas até junho.

De acordo com nota divulgada pelos advogados da família Sarkis, Flávio pagou R$ 200 mil em 23 de novembro, depois repassou R$ 300 mil em 10 de dezembro e R$ 590 mil em 11 de dezembro. Ainda estão pendentes cerca de R$ 2 milhões, que devem ser quitados até junho. A nota contradiz a escritura de compra e venda, na qual estava registrado que “os vendedores declaram já haver recebido dos compradores o valor relativo à parcela de recursos próprios, indicada em recursos próprios do item preço da compra e venda/forma de pagamento”.